Sunday, May 12, 2024

Extratos de Fenzy

 



Estelle Fenzy

Chut

(Le monstre dort)

Buvons le galop des jours

Et la surprise de vivre

Dans le même verre

***

Bout du jardin

Eldorado

Dans ta musette

L’automne infusé

Aux flaques des terrasses

 *** 

Dans ma

Maison sur pilotis

Loin du sel

Mes veines ma langue

Parlent de toi

Tu traverses les fenêtres

À dix mètres du sol


Silêncio

(O monstro dorme)

Bebamos ao galope dos dias

E a surpresa de viver

No mesmo copo

***

Fim de jardim

Eldorado

Na sua bolsa

Outono infundido

Nas poças dos terraços

***

Na minha

Palafitas

Longe do sal

Minhas veias, minha língua

Falam sobre ti

Tu atravessas as janelas

A dez metros do solo

Ilustração: Jornal MG Turismo. 

Uma poesia de Miguel Veyrat

 


ETERNO RETORNO

Miguel Veyrat

Mientras escrutaba junto a Beatrice

las entrañas de aquel amanecer

 

Al respirar juntos su aliento

 

Un bocado de la manzana original

quedó atrapado en mi garganta

 

Cada día regreso a visitar aquel lugar

ETERNO RETORNO

Enquanto examinava com Beatrice

as entranhas daquela madrugada

 

Ao respirarmos juntos seu alento

 

Um bocado da maçã original

ficou entalado na minha garganta

 

Cada dia regresso para visitar aquele lugar

Ilustração: Estoico Viver.


Tuesday, May 07, 2024

E, de volta, Ana Blandiana

 


Ana Blandiana

Así como en no sé qué parte de África los indígenas

rezaban ante el fuego que encendían, yo te invento a ti y

luego hablo contigo.

Te pido consejos que no escucho, te enseño mis

manuscritos y no cambio nada de lo que escribí.

Lo importante es sentirte a mi lado, después de olvidar

que te he inventado.

 

Assim como não sei em que parte da África os indígenas

Rezavam diante do fogo que acendiam, eu te invento e

logo falo contigo.

Te peço conselhos que não escuto, te ensino meus

Manuscritos e não troco nada do que escrevi.

O importante é sentir-te a meu lado, depois de esquecer

que hei te inventado.

Ilustração: Biblioteca da Vida.

Dualidade

Saberás que já não te amo muito tarde

Quando o fogo tiver o gosto extinto.

De todas as coisas que ainda sinto

E do fogo que ainda em mim arde.
Eu não te amo por ainda assim amar-te,

Como se fosse apenas como o instinto

De buscar fazer verdade do que minto

Transformar em todo o que é só parte.
Te amo, e não te amo, como se tivesse

Nas mãos os sonhos frágeis da menina

Que a incerteza de frustrar me detivesse
E, é meu amor, que como um louco clamo,
Mas é loucura, justamente, por ser sina

Não te amar assim do jeito que te amo.

Ilustração: Frases. 

 


Sunday, May 05, 2024

Uma poesia de Erica Mena

 


DECOMPOSE: OF IMMATERIAL THINGIS

Erica Mena

A hope of leaves and hollows,
a breaking nest, a crest of granite
and unquarried moss.
It’s soft
wintering a shade between green
and gray. The hope of colors for
which there is no word develops and
then fades. Uncaptured and un-impressed
in a kind of precision in dissolution.
Or in silence and the desire to trespass
and hold where the roots’ incision splits. Some
inevitable gesture or quantity in monochrome
and grateful light. And still the distance
between tongue and sight contained
in each body and measured as a factor
of attempt. Approach. Carefully mantained
first to shimmer and then break at the horizon.
Where the eye seeks motion, a threshing up
or fluttering, or blurring of wings and leaves.

DECOMPOR: DE COISAS IMATERIAIS

Uma esperança de folhas e buracos,

um ninho quebrado, uma crista de granito

e um não extraído musgo. É suave

como uma sombra invernando entre o verde

e cinza. A esperança das cores para

que não há palavra desenvolvida e

então desaparece. Não capturado e não impressionado

numa espécie de precisão na dissolução.

Ou no silêncio e no desejo de trespassar

e segurar onde a incisão das raízes se divide. Alguns

gestos inevitáveis ou quantidade em monocromática

e grata luz. E ainda a distância

entre a língua e a visão contida

em cada corpo e medida como um fator

de tentativa. Abordagem. Cuidadosamente mantido

primeiro para brilhar e depois romper no horizonte.

Onde o olho procura movimento, um descascamento

ou flutuações, ou borrões de asas e folhas.

Ilustração: Agro 20.

E, mais uma vez, Ana Blandiana

 


GENEALOGÍA

Ana Blandiana

Alguien sueña con nosotros

Y es soñado a su vez

Por otro

Que es el sueño de un sueño

Preciso.

Inmersos en la somnolencia,

También nosotros soñamos con un mundo

Salvajemente atormentado en el sueño.

Soñando,

Somos el eslabón tierno

En la fila sin comienzo

Que no ha de acabar

Nunca,

Aunque

Bastaría

Un solo grito

Lo bastante fuerte para despertar

A medias

Al primer señor

Del sueño,

El que duerme

En los cimientos de los mundos

Soñados.

GENEALOGIA

Alguém sonha conosco

E é sonhado por sua vez

Por outro

Qual é o sonho de um sonho

Preciso.

Imerso na sonolência,

Nós também sonhamos com um mundo

selvagemente atormentado no sono.

Sonhando,

Nós somos o elo terno

na fila sem começo

que não deve acabar

nunca,

Embora

fosse suficiente

um único grito

forte o suficiente para acordar

às meias

ao primeiro senhor

do sonho,

Aquele que dorme

nas fundações dos mundos

sonhados.

Ilustração: Jamadrou.

VIAGEM

 


Tudo, ao fim e ao cabo,
Inútil salta
Ainda que o dizer verbalizado
Tente dar sentido
Ao resguardado
No fundo da alma,
No longínquo sentimento
Que em tristeza só se manifesta.

Hoje com o tempo livre
enrodilho-me no espaço das lembranças
como quem folheia
um manuscrito de outrora

um objeto do passado

procurando explicações,
chaves, formulas secretas,
reconstituições
do que já se perdeu....

Vago no olhar e no tocar

imóvel

pelos mistérios
de silêncio e paz

 

e, contudo,

Só me encontro
quando paro,
me deparo
com a sensação inexprimível
do nunca mais.

Ilustração: SIC Notícias.

Saturday, May 04, 2024

Outra poesia de C.D. Wright

 


LAKE ECHO, DEAR

C. D. Wright

Is the woman in the pool of light

really reading or just staring

at what is written

 

Is the man walking in the soft rain

naked or is it the rain

that makes his shirt transparent

 

The boy in the iron cot

is he asleep or still

fingering the springs underneath

 

Did you honestly believe

three lives could be complete

 

The bottle of green liquid

on the sill is it real

 

The bottle on the peeling sill

is it filled with green

 

Or is the liquid an illusion

of fullness

 

How summer’s children turn

into fish and rain softens men

 

How the elements of summer

nights bid us to get down with each other

on the unplaned floor

 

And this feels painfully beautiful

whether or not

it will change the world one drop

LAGO ECHO, QUERIDO

Está a mulher molhada de luz

realmente lendo ou olhando fixamente

aquilo que está escrito

 

Está o homem andando na chuva fina

ou é chuva que faz

sua camisa transparente

 

O rapaz na cama de ferro

está dormindo ou ainda

está tocando as molas do colchão

 

Será que você realmente acreditou

que três vidas poderiam estar completas

 

A garrafa de líquido verde

no parapeito é real

 

A garrafa sobre o parapeito descascado

está cheia de verde

 

Ou o líquido é uma ilusão

de plenitude

 

Como os filhos do verão se tornam

peixes e a chuva amolece os homens

 

Como os elementos das noites de verão

nos propõe a nos deitarmos uns com os outros

no piso rústico

 

E isto nos parece dolorosamente lindo

independente da resposta

irá mudar o mundo uma gota

Ilustração: A Dor de Crescer.

 

Ilusão



Que o meu amor
sempre será teu
meus olhos dizem
quando sorriem felizes
de te ver.

Que jamais tanto amor
há de passar
prova esta minha constância
de te levar
na mente e no coração.

Vem..vem...
Eu te estendo a mão
como se estivesses equilibrada no ar
e, como num sonho, fosse te salvar,
porém, mesmo dormindo, sei
que é uma tentativa em vão.

Na vida e no sonho tudo é ilusão!

Ilustração: Somos Todos Um. 

 


Outra poesia de Juanjo Barral

 


AJUAR

Juanjo Barral

Guardo a buen recuerdo

una colección de pasos

en falso, de decisiones que mejor hubieran sido tomadas

por nadie.

Qué le vas a hacer.

Tengo una estantería con un par de cachivaches que alguien

me dejó

por otro.

Y un tarro de bolígrafos de los que muchos ni siquiera

fueron fieles. Hay uno en concreto que escribió temor

en vez de amor, sinrazón donde debía poner

corazón.

En fin,

supongo que lo voy conservando todo para recordarle un día

a la vida

lo que le debo,

lo que me debe.

ENXOVAL

Guardo na boa memória

uma coleção de passos

em falso, de decisões que teriam sido melhor tomadas

por ninguém.

O que vai fazer.

Tenho uma estante com algumas bugigangas que alguém

me deixou

por outro.

E um pote de canetas que muitos nem sabem

foram fiéis. Há um em concreto que escreveu medo

em vez de amor, irracionalidade onde devia por

coração.

Enfim,

Suponho que vou guardar tudo para lembrá-lo um dia

na vida

o que lhe devo,

o que me deve.

Ilustração: Campo Grande News.

Friday, May 03, 2024

ORAÇÃO DE SÃO BENTO

Ó glorioso São Bento

ser, na minha insignificância, igual a ti tento,

mas nem usando tua medalha e vela me contento,

nem me livro das aflições,

nem alcanço tua paz e tranquilidade.

Assim te peço, com humildade

intercedei por nós

para que se afastem todas as desgraças

tanto corporais como espirituais,

especialmente o mal do pecado.

Que não sejamos jamais envenenados

pela vaidade ou avareza.

Que tenhamos, como tivestes,

a eterna fortaleza

de saber perdoar e amar acima de tudo.

Que Deus nos dê muito estudo

e nos faça superar os pesos do real

livrando-nos de todo mal.

Amém!


Thursday, May 02, 2024

E aí, Seu Luiz, é melhor que Paris!

 


Já fui de Água Santa...Saudades tantas...

                             Para Luiz Carlos Marques

É verdade que,

Com esta memória vaga,

Não lembro mais nada.

Quanto mais quando

Vivi em Água Santa,

Tijuca, São Conrado, Niterói,

Vieira Souto

E estar longe do Cristo Redentor

Ainda me dói.

Dá saudades lembrar

Que comi rabicó de galinha na Penha,

tanajura em Bangu,

sardinha na Senador,

ou carpaccio de avestruz em Copacabana,

a memória,

a danada não me engana!

 

Torresmos, rabadas e carnes secas

Nunca faltaram na Zona Norte

Com cachaças, chopes, batidas.

E, para provar que sou forte

Me orgulho de já ter bebido,

Em procissão por pés sujos,

Guiado pelo Johnny Bradfort,

Quando ainda era magrinho

E bebia cachaça como se fosse água,

Tanto que queria me convencer

Que lutou no Canal de Suez!

 

Jurubebas, caipirinhas de limão cravo

Ou de pimenta rosa,

Juro, já me deixaram cheio de prosa

Me alimentando só de linguiçinha de porco,

Uns croquetes do Rebouças

ou bolinhos de aipim ou de bacalhau-

o que não é nada mau!

 

Afinal ser carioca

Não é nascer no Rio de Janeiro-

Este é um requisito maneiro.

Ser carioca

É aceitar o desafio

De buscar nesta cidade

O que ela tem de bom e de melhor...

Assim, meu companheiro,

Qualquer hora desembarco

Para aceitar seu desafio,

Com chuva ou sem,

De usufruir o melhor da vida:

Viver no Rio.

Ilustração: Revista LIDE.

Uma poesia de C.D. Wright

 


CLOCKMAKER WITH BAD EYES

C. D. Wright

I close the shop at six. Welcome wind,

weekend with two suns, night with a travel book,

the dog-eared sheets of a bed

I will not see again.

 

I not of time, lost in time

learned from watches-

a second is a killing thing.

 

Live your life. Your eyes go. Take your body

out for walks along the waters

of a cold and loco planet.

 

Love whatever flows. Cooking smoke, woman’s blood,

tears. Do you hear what I’m telling you?

RELOJOEIRO DE VISTA RUIM

Eu fecho a loja às seis. Bemvindo vento

de fim de semana com dois sóis, noite com livro de viagens,

os lençóis dobrados sobre a cama

eu não vou ver novamente.

 

Eu não tenho tempo, perdi o tempo

aprendido com os relógios-

o segundo é o matador das coisas.

 

Viva sua vida. Seus olhos vão. Leve seu corpo

pelos caminhos ao longo das águas

de um frio e louco planeta.

 

Ame o que flui. A fumaça da cozinha, o sangue da mulher,

lágrimas. Você escutou o que estou lhe dizendo?

Ilustração: iStock.

Wednesday, May 01, 2024

Tempos

 


Sobre quem fui
não sei dizer nem lembro
é como uma folha branca
que se sabe apagada.

Hoje sou outro

que as chuvas molham

nos dias que me compõem
uma nova história
que ante os meus passos
os caminhos traçam.

O meu futuro é uma ostra
que nunca saiu do mar,
embora já façam o leilão
da pérola que não sei se há. 

E, no presente, o destino é esperar.

Ilustração: Freekip. 

Poderia ser Maio, Joseph Jr.

 


An April Day
Joseph Seamon Cotter Jr

On such a day as this I think,
      On such as day as this,
When earth and sky and nature’s whole
      Are clad in April’s bliss;
And balmy zephyrs gently waft
      Upon your cheek a kiss;
Sufficient is it just to live
      On such a day as this.

UM DIA DE ABRIL

Em um dia como este eu penso,

       Em um dia como este,

Quando a terra e o céu e toda a natureza

       estão vestidos com a felicidade de abril;

e zéfiros amenos flutuam gentilmente

       sobre sua bochecha um beijo;

suficiente é justamente viver

       Em um dia como este.

Ilustração: SP Leitura. 

 

CÍRCULO


Só as paixões nos salvarão-

disse o duque de Saint Simon,

 um fidalgo de um reino 

que não existe.

Um filósofo, um ser triste. 

É verdade 

que desejamos ser racionais,

nos livrar da carne, pobres animais.

O problema é que a racionalidade 

anda cheia de sentimentos 

e não tem sexo, 

nem sentir. 

É como se você quisesse

ser feliz 

sem existir!

Ilustração: Palestras Motivacionais.

Tuesday, April 30, 2024

Uma poesia de David Mura

 


THE REASONS

 

David Mura

 

A father is fate
say the ancient oracles

or the modernist therapist
or the son despondent

harrowing against.
A mother 

is mystery or
memory, a makeshift

stay against the father.
And me? I see now

how easy it was to be
a son. How if the son dies

before the father 
there is no end to it

and so what eases
the father is the imminence 

of his death, which eases
too the son

if the son is not
a child. And a mother?

Her death is that hole.
In the earth or the universe.

In the heart or the hell
the family has wrought

where the father vanishes
and all is her absence.

No one solves these.
No one outlives these.

There are reasons poems live,
people die. There are reasons.

AS RAZÕES

Um pai é o destino

dizem os antigos oráculos

 

ou o terapeuta modernista

ou o filho desapontado

 

angustiante do contra.

Uma mãe

 

é mistério ou

memória, um improvisado

 

ficar contra o pai.

E eu? Eu vejo agora

 

como foi fácil ser

um filho. Como se o filho morresse

 

antes do pai

Não há fim para isto

 

e então o que facilita

o pai é a iminência

 

da sua morte, o que facilita

também o filho

 

se o filho não for

uma criança. E uma mãe?

 

A morte dela é este buraco.

Na terra ou no universo.

 

No coração ou no inferno

a família operante

 

onde o pai desaparece

e tudo é sua ausência.

 

Ninguém resolve isto.

Ninguém sobrevive a isto.

 

Há razões pelas quais os poemas vivem,

pessoas morrem. Existem razões.

Ilustração: Razão-Rafael Botelho.