Sunday, December 31, 2017

UMA TRAIÇÃO AMAZÔNICA A JOHN MATEER

  
After Returning From A Voyage Of Exploration

John Matter

On the pillow John Mateer’s sleepy head
is a goldfish bowl aswirl with Venetian water,
and on that galleon, that luminous toy,
he is at the helm, telescope to his eye,
swearing he can’t see Australia.

And when his caravel glides into the Tejo,
as poised and cerebral as a black swan,
he calls for a glass of port and a pastel de nata,
then takes to his bed in a quiet hotel in Alfama,

and dreams the dream:
that one day there will be a poet
named John Mateer, just as there was once,
off the edge of maps, a monster
called Australia.


Depois de retornar de uma viagem de exploração

Sobre o travesseiro Silvio Persivo com a cabeça sonolenta
é uma tigela de peixinho dourado com água paraense,
e naquele galeão, aquele brinquedo luminoso,
ele está no leme, com o telescópio no olho,
jurando que não pode ver Rondônia.

E quando sua caravela desliza no Rio Negro,
tão equilibrado e cerebral como um cisne negro,
ele pede um copo de cachaça de cabeça e uma saltenha boliviana,
E pega sua cama num quieto hotel em Manaus,

e sonha o sonho:
que um dia haverá um poeta
Silvio Persivo, exatamente como havia uma vez,
fora dos limites dos mapas, um monstro
chamado Rondônia.

Uma poesia de Kate Fagan

                                                                                         

Love of the Loveless

Kate Fagan

Cento for Tom Lee

And finding nothing
you look back over your shoulder
happy lives, a lot of time
that one image. On bad days
you don’t trust yourself.
It was –
It was as if –
But this is an old story,
the specific weight of an image.
Pretty much alone with
the eye unrecounted,
heart almost telescopic.
A glorious early summer’s day
behind glass. At home with ever
greater frequency    I hardly
I heard I lived I didn’t
I become. Old photographs
seem to have this, people walking
around you    never  always
empty
something
image
day
shine

O amor do sem amor

Cento para Tom Lee

E não encontrando nada
tu olhas para trás por sobre o ombro
vida feliz, por muito tempo
aquela única imagem. Nos dias ruins
tu não confia em ti mesmo.
Isto foi -
Isto foi como se -
Mas, esta é uma velha história,
o peso específico de uma imagem.
Quase sozinha com
o olho não reconhece,
o coração quase um telescópico.
Um glorioso dia de início de verão
atrás do vidro. Em casa como sempre
com mais frequência dificilmente
ouvi vivi não fiz
me torno. Velha fotografias
Parecem ter isso, pessoas andando
em tua volta nunca sempre
vazio
alguma coisa
imagem
dia
brilha

Saturday, December 30, 2017

E, mais uma vez, o inesquecível Pablo Neruda


Poema 14

Pablo Neruda

Juegas todos los días con la luz del universo.
Sutil visitadora, llegas en la flor y en el agua.
Eres más que esta blanca cabecita que aprieto
como un racimo entre mis manos cada día.

A nadie te pareces desde que yo te amo.
Déjame tenderte entre guirnaldas amarillas.
¿Quién escribe tu nombre con letras de humo entre las estrellas del  sur?

Ah déjame recordarte cómo eras entonces, cuando aún no existías.
De pronto el viento aúlla y golpea mi ventana cerrada.
El cielo es una red cuajada de peces sombríos.
Aquí vienen a dar todos los vientos, todos.
Se desviste la lluvia.

Pasan huyendo los pájaros.
El viento. El viento.
Yo sólo puedo luchar contra la fuerza de los hombres.
El temporal arremolina hojas oscuras
y suelta todas las barcas que anoche amarraron al cielo.

Tú estás aquí. Ah tú no huyes.
Tú me responderás hasta el último grito.
Ovíllate a mi lado como si tuvieras miedo.
Sin embargo alguna vez corrió una sombra extraña por tus ojos.

Ahora, ahora también, pequeña, me traes madreselvas,
y tienes hasta los senos perfumados.
Mientras el viento triste galopa matando mariposas
yo te amo, y mi alegría muerde tu boca de ciruela.

Cuanto te habrá dolido acostumbrarte a mí,
a mi alma sola y salvaje, a mi nombre que todos ahuyentan.
Hemos visto arder tantas veces el lucero besándonos los ojos
y sobre nuestras cabezas destorcerse los crepúsculos en abanicos girantes.

Mis palabras llovieron sobre ti acariciándote.
Amé desde hace tiempo tu cuerpo de nácar soleado.
Hasta te creo dueña del universo.
Te traeré de las montañas flores alegres, copihues,
avellanas oscuras, y cestas silvestres de besos.

Quiero hacer contigo
lo que la primavera hace con los cerezos.


POEMA 14

Jogas todos os dias com a luz do universo.
Sutil visitadora, chegas com a flor e a água.
És mais que esta branca cabecinha que aperto
como uma raiz entre minhas mãos a cada dia.

Com ninguém te pareces desde que te amo.
Deixa-me te ter entre as guirlandas amarelas.
Quem escreve teu nome com letras de fumo entre as estrelas do sul?

Ah! Deixa-me recordar-te como eras, então, quando ainda não existias.
De pronto o vento uivava e golpeava a minha janela fechada.
O céu é uma rede coalhada de peixes sombrios.
Aqui vem dar todos os ventos, todos.
Se desviaste da chuva.

Passam fugindo os pássaros.
O vento. O vento.
Eu só posso lutar contra a força dos homens.
O temporal faz redemoinho das folhas escuras
e solta todos os barcos que  de noite amarraram ao céu.

Tu estás aqui. Ah! Tu não foges.
Tu me responderás até o último grito.
Aninha-te a meu lado como se tivesses medo.
Sem embargo, alguma vez correu uma sombra estranha por teus olhos.

Agora, agora também, pequena, me trazes madressilvas,
e tens até os seios perfumados.
Enquanto o vento triste galopa matando borboletas
eu te amo, e minha alegria morde tua boca de ciriguela.

Quanto te haverá doído acostumar-te a mim,
à minha alma só e selvagem, a meu nome que a todos afugentam.
Temos visto arder tantas vezes os astros beijando-te os olhos
e sobre nossas cabeças desmanchar-se os crepúsculos em leques girando.

Minhas palavras choveram sobre ti acariciando-te.
Amei desde tanto tempo teu corpo de nácar ensolarado.
Até te creio dona do universo.
Te trarei das montanhas flores alegres, lilases,
avelãs escuras, e cestas silvestres de beijos.

Quero fazer contigo
o que a primavera faz com as cerejas.

Ilustração: Flores.culturamix.com. 

E, agora, mais uma poesia de Jaime Sabines

Te quiero porque tienes…                            
Jaime Sabines

Te quiero porque tienes
las partes de la mujer en el lugar preciso
y estás completa.

No te falta ni un pétalo,
ni un olor, ni una sombra.
Colocada en tu alma,

dispuesta a ser rocío en la yerba del mundo,
leche de luna en las oscuras hojas.
Quizás me ves,

tal vez, acaso un día,
en una lámpara apagada,
en un rincón del cuarto donde duermes,

soy la mancha, un punto en la pared,
alguna raya que tus ojos, sin ti,
se quedan viendo.

Quizás me reconoces
como una hora antigua
cuando a solas preguntas, te interrogas
con el cuerpo cerrado y sin respuesta.

Soy una cicatriz que ya no existe,
un beso ya lavado por el tiempo,
un amor y otro amor que ya enterraste.

Pero estás en mis manos y me tienes
y en tus manos estoy, brasa, ceniza,
para secar tus lágrimas que lloro.

¿En qué lugar, en dónde, a qué deshoras
me dirás que te amo? Esto es urgente
porque la eternidad se nos acaba.

Recoge mi cabeza. Guarda el brazo
con que amé tu cintura. No me dejes
en medio de tu sangre en esa toalla.

TE QUERO PORQUE TENS...

Te quero porque tens
as partes de uma mulher no lugar preciso
e estás completa.
                     
Não te falta nem uma pétala,
nem um perfume, nem uma sombra.
Colocada em tua alma,

disposta a ser orvalho na erva do mundo,
leite de lua nas escuras folhas.
Quem sabe não me vejas,

talvez, acaso um día,
numa lâmpada apagada,
num canto do quarto onde dormes,

seja a mancha, um ponto na parede,
alguma listra que teus olhos, sem ti,
se quedem vendo.

Talvez me reconheças
como uma hora antiga
quando a sós preguntes, te interrogues
com o corpo fechado e sem resposta.

Sou uma cicatriz que já não existe,
um beijo já levado pelo tempo,
um amor e outro amor que já enterraste.

Porém, estás em minhas mãos e me tens
e nas tuas mãos estou, brasa, cinza,
para secar taus lágrimas que choro.

Em que lugar, onde, em que instante
me dirás que te amo? Isto é urgente
porque a eternidade nos acaba.

Recolhe minha cabeça. Guarda o braço
com que amei tua cintura. Não me deixes
em meio de teu sangue nessa toalha.

Um poema de Ramón López Velarde



HORMIGAS

Ramón López Velarde

A la cálida vida que transcurre canora
Con garbo de mujer sin letras ni antifaces,
A la invicta belleza que salva y que enamora,
Responde, en la embriaguez de la encantada hora,
Un encono de hormigas en mis venas voraces.

Fustigan el desmán el perenne hormigueo
el pozo del silencio y el enjambre del ruido,
la harina rebanada como doble trofeo
en los fértiles bustos, el Infierno en que creo,
el estertor final y el preludio del nido.

Mas luego mis hormigas me negarán su abrazo
y han de huir de mis pobres y trabajados dedos
cual se olvida en la arena un gélido bagazo;
y tu boca, que es cifra de eróticos denuedos,
tu boca, que es mi rúbrica, mi manjar y mi adorno,
tu boca, en que la lengua vibra asomada al mundo
como réproba llama saliéndose de un horno,
en una turbia fecha de cierzo gemebundo

en que ronde la luna porque robarte quiera,
ha de oler a sudario y a hierba machacada,
a droga y a responso, a pabilo y a cera.

Antes de que deserten mis hormigas, Amada,
déjalas caminar camino de tu boca
a que apuren los viáticos del sanguinario fruto
que desde sarracenos oasis me provoca.

Antes de que tus labios mueran, para mi luto,
dámelos en el crítico umbral del cementerio
como perfume y pan y tósigo y cauterio.

FORMIGAS

A cálida vida que passa melodiosa
Com a graça de uma mulher sem letras ou máscaras,
Para a beleza imbatível que salva e que enamora,
Parece, na embriaguez, de encantada hora,
Uma fúria de formigas nas veias vorazes.

Fustigam ou ultrajam o perene formigueiro
o poço do silêncio e o enxame do ruído,
a fatia de farinha como troféu duplo
nos férteis bustos, o inferno em que creio,
o estertor final e o prelúdio para o ninho.

Mas, logo, minhas formigas me negarão seu abraço
e hão de fugir dos meus trabalhados e pobres dedos
qual se esquece na areia um bagaço gelado;
e tua boca, que é uma figura de esforços eróticos,
tua boca, que é minha assinatura, meu manjar e meu adorno,
tua boca, em que a língua vibra, inclinada para o mundo
como uma reprovável chama  salientando-se de um forno,
numa turva data de um vento sombrio

onde a lua vagueia porque quero roubar-te,
há de cheirar a sudário e a erva machucada,
a droga, a réquiem, pavio e cera.

Antes que desertem, minhas formigas, amadas,
deixo-as caminhar até tua boca
para que apurem as necessidades do sanguinário fruto
que desde sarraceno oásis me provoca.

Antes que teus lábios morram, meu luto,
oferto-os, no limite crítico do cemitério,
como perfume e pão e veneno e cautério.


Thursday, December 28, 2017

Mais uma poesia de Michael Sharkey

WITHOUT YOU                                     
Michael Sharkey

In each photograph I see
what captured me
when I first looked at you
and saw
time stopped:
I nearly died.
            
Since when,
I'm echo to myself.
When you're away
each day's the same
as yesterday:
tomorrow is the blank page
in a diary, never touched; 

without you
all music
would be late quartets and blues:
there'd be no news
to fuel poems:
paintings would hang down
their heads in shame.

Without you
I'd live with just one heart
and without art:
elegies would speak
of nothing else,
the birds would sing
and I would not.

SEM VOCÊ

Em cada fotografia, vejo
o que me prendeu
quando te olhei pela primeira vez
e vi
o tempo parar:
eu quase morri.

Desde então,
sou o eco de mim mesmo.
Quando tu estais longe
cada dia é o mesmo
como o de ontem:
o amanhã é uma página em branco
de um diário, nunca tocado;

sem você
todas as músicas
parecem marchinhas e polcas antigas:
não há novidades
para fazer poemas:
as pinturas se penduravam
de cabeças, para baixo, com vergonha.

Sem você
Eu vivi com apenas um coração
e sem arte:
as elegias falavam
de coisa alguma,
os pássaros cantavam
e eu não sabia.                  


Ilustração: Obvious.  

INESQUECÍVEL

Sim, me lembro sim,        
de Elizabeth Taylor.
De um filme em que era rainha,
talvez tenha sido Cleópatra,
mas, ainda era uma criança, 
infantil, muito inocente, 
um boboca, certamente,
nem pensava em sexo
nem me importava com uma mulher bonita.
E, devo dizer, na época
só pensei que fosse bem gordinha,
como a minha vizinha.
Porém, os olhos, os olhos dela,
tinham um jeito especial, 
uma atração fatal, 
mesmo para crianças. 
Me entraram na memória,
Pois, eram duas jóias,
duas preciosas glórias
que pareciam dizer:
-Ninguém pode me esquecer!

Ilustração: Blog Igor + Andre.