Thursday, October 31, 2019

Mais um poema de Roberto Bolaño



LOS DETECTIVES PERDIDOS



Roberto Bolaño



Los detectives perdidos en la ciudad oscura.

Oí sus gemidos.

Oí sus pasos en el Teatro de la Juventud.

Una voz que avanza como una flecha.

Sombra de cafés y parques

Frecuentados en la adolescencia.

Los detectives que observan

Sus manos abiertas,

El destino manchado con la propia sangre.

Y tú no puedes ni siquiera recordar

En dónde estuvo la herida,

Los rostros que una vez amaste,

La mujer que te salvó la vida.



OS DETETIVES PERDIDOS


Os detetives perdidos na cidade escura.

Ouvi seus gemidos.

Ouvi seus passos no Teatro da Juventude.

Uma voz que avança como uma flecha.

Sombra de cafés e parques

Frequentado na adolescência.

Os detetives que observam

Suas mãos abertas,

O destino manchado com o próprio sangue.

E tu não podes nem sequer  recordar

Onde estava a ferida?

Os rostos que uma vez já amaste,

A mulher que te salvou sua vida.



Ilustração: wordpress.com.

Uma poesia de Stefano Pini


La ripetizione guidata                                     
Stefano Pini

Esploriamo rombi di pelle
i solchi e la furia che si posa.
Il confine raccoglie una tensione fredda
come non fossimo noi
armati per colpire la ripetizione,
i fianchi in cui tutto
il mattino muore: saracinesche abbassate
appunti raccolti, imparare e imparare ancora,
chiedere una scusa.


A REPETIÇÃO DIRIGIDA

Exploraremos  os poros da pele
os sulcos e a fúria que representa.
A fronteira recolhe a fria tensão
como se não fôssemos nós mesmos
armados para insistir na repetição,
os quadris onde toda
a manhã morre: persianas abaixadas
notas coletadas, aprender e aprender de novo,
peça uma desculpa.

Wednesday, October 30, 2019

E, agora, Jacques Prévert


CHANSON                     
Jacques Prévert

Quel jour sommes-nous
Nous sommes tous les jours
Mon amie
Nous sommes toute la vie
Mon amour
Nous nous aimons et nous vivons
Nous vivons et nous nous aimons
Et nous ne savons pas ce que c'est que la vie
Et nous ne savons pas ce que c'est que le jour
Et nous ne savons pas ce que c'est que l'amour

CANÇÃO

Em que dia somos nós
Nós somos todos os dias
Meu amigo
Nós todos somos a vida
Meu amor
Nós nos amamos e vivemos
Vivemos e nos amamos
E nós não sabemos o que é a vida
E nós não sabemos o que é o dia
E nós não sabemos o que é amor.

Ilustração: Flickr.



Uma poesia de Maurice Scève





Délie. Moins je la voy...

Maurice Scève

Moins je la voy, certes plus je la hays:
Plus je la hays, et moins elle me fasche.
Plus je l'estime, et moins compte j'en fais:
Plus je la fuys, plus veulx, qu'elle me sache.
En un moment deux divers traicz me lasche
Amour et hayne, ennuy avec plaisir.
Forte est l'amour, qui lors me vient saisir
Quand hayne vient et vengeance me crie:
Ainsi me faict hayr mon vain désir
Celle, pour qui mon coeur toujours me prie.

DÉLIA. QUANTO MENOS A VEJO

Quanto menos a vejo, com certeza mais odeio:
Quanto mais a odeio, menos ela me atormenta.
Quanto mais valorizo e menos a acho em conta:
Quanto mais a levo, melhor ela me entende.
Num momento os dois diversos me fazem covarde
Amor e ódio, entediados de prazer.
Forte é o amor que vem me reter
Quando o ódio me pede vingança:
E devo odiar assim o vão desejo
Por quem meu coração sempre me implora.

Ilustração: Igreja vivo por ti.

Tuesday, October 29, 2019

E, mais uma, poesia de Carmen Matute


MAGIA ERÓTICA       
Carmen Matute

Me disuelvo
en la magia
giro
en medio del fruto
pulposo
oigo
el suave ruido
de la brasa encendida
el lenguaje húmedo
anclado en la boca.

Un tambor anuncia
tu pulso
tu obscuro río.

Cerrados los ojos
te miro
me miro
honda ceniza soy
ahora.

MAGIA ERÓTICA

Me dissolvo
na magia
giro
no meio da fruta
polpuda
ouço
o suave ruído
da brasa acesa
a linguagem úmida
ancorada na boca

Um tambor anuncia
teu pulso
teu escuro rio

Olhos fechados
te olho
me olho
profunda cinza sou
agora

Ilustração: eusemfronteiras.com.br/.

Monday, October 28, 2019

Outra poesia de Emile Nelligan



SUR UN PORTRAIT DU DANTE

Emile Nelligan

C'est bien lui, ce visage au sourire inconnu,
Ce front noirci du hâle infernal de l'abîme,
Cet oeil où nage encor la vision sublime :
Le Dante incomparable et l'Homme méconnu.

Ton âme herculéenne, on s'en est souvenu,
Loin des fourbes jaloux du sort de leur victime,
Sur les monts éternels où tu touchas la cime
A dû trouver la paix, ô Poète ingénu.

Sublime Alighieri, gardien des cimetières !
Le blason glorieux de tes oeuvres altières,
Au mur des Temps flamboie ineffaçable et fier.

Et tu vivras, ô Dante, autant que Dieu lui-même,
Car les Cieux ont appris aussi bien que l'Enfer
À balbutier les chants de ton divin Poème.


SOBRE UM RETRATO DE DANTE

É ele, este rosto com um sorriso desconhecido,
Este rosto enegrecido do bronzeado infernal do abismo,
Este olho onde ainda nada a visão sublime:
O incomparável Dante e o homem ignorado.

Tua alma hercúlea, lembramos,
Longe dos pérfidos, zelosos do destino de sua vítima,
Sobre os eternos montes onde o cume tocaste
Para encontrar a paz, ó poeta ingênuo.

Sublime Alighieri, guardião dos cemitérios!
O glorioso brasão de suas obras orgulhosas,
No Muro do Tempo brilha indelével e orgulhoso.

E você viverá, ó Dante, tanto quanto Deus mesmo,
Pois, o céu aprendeu tanto quanto o inferno
A balbuciar as músicas do seu poema divino.

E, de volta, a notável Delmira Agustini





EXPLOSIÓN

Delmira Agustini

¡Si la vida es amor, bendita sea!
¡Quiero más vida para amar! Hoy siento
Que no valen mil años de la idea
Lo que un minuto azul de sentimiento.

Mi corazón moría triste y lento...
Hoy abre en luz como una flor febea;
¡La vida brota como un mar violento
Donde la mano del amor golpea!

Hoy partió hacia la noche, triste, fría,
rotas las alas mi melancolía;
Como una vieja mancha de dolor

En la sombra lejana se deslíe...
¡Mi vida toda canta, besa, ríe!
¡Mi vida toda es una boca en flor

EXPLOSÃO

Se a vida é amor, bendita seja!
Quero mais vida para amar! Hoje sinto
Que não valem mil anos da ideia
Do que um minuto azul de sentimento.

Meu coração morria triste e lento...
Hoje abre em luz como uma flor brilhante
A vida brota como um mar violento
Onde a mão do amor golpeia!

Hoje partiu até a noite, triste, fria
Rôtas as asas da melancolia
Como uma velha mancha de dor

Na sombra distante escorreguei...
Minha vida toda canta, beija, ri!
Minha vida toda é uma boca em flor


Friday, October 25, 2019

Mais uma vez a poesia de Philip Larkin



TO FAILURE

Philip Larkin

You do not come dramatically, with dragons
That rear up with my life between their paws
And dash me butchered down beside the wagons,
The horses panicking; nor as a clause
Clearly set out to warn what can be lost,
What out-of-pocket charges must be borne
Expenses met; nor as a draughty ghost
That's seen, some mornings, running down a lawn.

It is these sunless afternoons, I find
Install you at my elbow like a bore.
The chestnut trees are caked with silence. I'm
Aware the days pass quicker than before,
Smell staler too. And once they fall behind
They look like ruin. You have been here some time.

O FRACASSO

Você não vem de modo dramático, com os dragões
que se destacam com a minha vida entre suas patas
e me atropelam ao lado dos vagões,
com os cavalos em pânico; nem como uma cláusula
que, claramente, avisa o que pode ser perdido,
quais cobranças diretas devem ser pagas
quais despesas atendidas; nem como um fantasma desonesto
o qual é visto, algumas manhãs, correndo por um gramado.

São essas tardes sem sol, em que descubro 
que se instalastes no meu cotovelo como um furo.
Os castanheiros estão cobertos de silêncio. Eu estou
consciente de que os dias passam mais rápido do que antes,
que cheiram diferente também. E uma vez que eles ficam para trás

parecem como ruínas. Você está aqui há algum tempo.

Ilustração: https://gustavosucci.com.

E William Blake retorna


A DIVINE IMAGE               
William Blake

Cruelty has a human heart,
And Jealousy a human face;
Terror the human form divine,
And Secresy the human dress.

The human dress is forged iron,
The human form a fiery forge,
The human face a furnace sealed,
The human heart its hungry gorge.

UMA DIVINA IMAGEM

A crueldade tem um coração humano,
E o ciúme tem uma humana face;
O terror, a forma humana divina,
E o sigilo,  a humana roupa.

A roupa humana é forjada em ferro,
A forma humana é uma ardente forja,
A face humana uma fornalha fechada,
O coração humano é sua garganta faminta.

Mais uma poesia de Olga Orozco



En el final era el verbo

Olga Orozco

(...)
Yo velaba incrustada en el ardiente hielo, en la hoguera escarchada,
traduciendo relámpagos, desenhebrando dinastías de voces,
bajo un código tan indescifrable como el de las estrellas o el de las hormigas.
Miraba las palabras al trasluz.
Veía desfilar sus oscuras progenies hasta el final del verbo.
Quería descubrir a Dios por transparencia.

No final era o verbo

(...)
Eu velava incrustado no gelo ardente, na fogueira gelada,
traduzindo relâmpagos, desenterrando dinastias de vozes,
debaixo de um código tão indecifrável como o das estrelas ou o das formigas.
Olhava para as palavras transluzentes.
Via desfilar suas progênies sombrias até o final do verbo.
Queria descobrir Deus pela transparência.


Thursday, October 24, 2019

Uma poesia de Emile Nelligan



SOIR D’HIVER                                                      

Emile Nelligan

Ah! comme la neige a neigé!
Ma vitre est un jardin de givre.
Ah! comme la neige a neigé!
Qu'est-ce que le spasme de vivre
A la douleur que j'ai, que j'ai.

Tous les étangs gisent gelés,
Mon âme est noire! Où-vis-je? où vais-je?
Tous ses espoirs gisent gelés:
Je suis la nouvelle Norvège
D'où les blonds ciels s'en sont allés.
Pleurez, oiseaux de février,
Au sinistre frisson des choses,
Pleurez oiseaux de février,
Pleurez mes pleurs, pleurez mes roses,
Aux branches du genévrier.

Ah! comme la neige a neigé!
Ma vitre est un jardin de givre.
Ah! comme la neige a neigé!
Qu'est-ce que le spasme de vivre
A tout l'ennui que j'ai, que j'ai...

NOITE DE INVERNO

Ah! Como a neve nevou!
A janela é um jardim de gelo.
Ah! Como a neve nevou!
O que é o espasmo da vida, o que é
Ao lado da dor que há em mim, que há.
Todas as lagoas estão congeladas,
Negra é minha alma! Onde vou? Para onde  vou?
Todas as suas esperanças estão congeladas:
Eu sou a nova Noruega


Da qual fugiram os rubros céus.
Choram os pássaros de fevereiro,
Pela sinistra emoção das coisas,
Chore pássaros de fevereiro,
Choram minhas rosas, chora meu pranto
Entre os galhos altos do cedro.

Ah! Como a neve nevou!
A janela é um jardim de gelo.
Ah! Como a neve nevou!
O que é o espasmo da vida, o que é
Ao lado do problema que há em mim, que há.

Ilustração: Pixabay.


E mais uma poesia de Goliarda Sapienza

PERORAZIONE


Goliarda Sapienza

Non sprecare il tepore del tuo pube
non serrare il tuo passo in gonne strette
di tetra seta, ma lascia
per favore accenderti i capelli
dal sole che scantona dietro il muro.

Non vorrei che sorpresa dalla luna
ti trovassi costretta in una notte
a gridare pentita con quel viso
di donna dissecata sopra il tuo.

PERORAÇÃO

Não desperdice a quentura do teu púbis
não aperte o teu passo em saias justas
de seda turva, mas, deixe
por favor, teu cabelo aceso
pelo sol que foge por trás do muro.

Não te quero surpreendida pela lua
descobrindo-te forçada numa noite
a gritar arrependida num tal rosto
de senhora ressecada sobre o teu.


Tuesday, October 22, 2019

Outra poesia de Carmen Matute


Casi podría decirte...     
Carmen Matute

Casi podría decirte
devorada por la angustia
me asomo
a la vieja cueva prohibida
donde habitan
-libres y crueles-
mis monstruos, mis fantasmas,
los antiguos dioses
que me reservan un castigo inevitable.

Apenas un momento
los observo
y sus voces dispersas
se unen
llamándome con su canto de sirenas.

Entre lágrimas
cumplo con el rito silencioso
-madre-
y vuelvo de nuevo
a cerrar esa puerta.

Quase podia dizer-te

Quase podia dizer-te
devorada pela angústia
me posto
na velha caverna proibida
onde moram
livres e cruéis-
meus monstros, meus fantasmas
os antigos deuses
que me reservam um castigo inevitável.

Apenas um momento
os observo
e suas vozes dispersas
se unem
chamando-me com seu canto de sirene.

Entre lágrimas
cumpro  com o ritual silencioso
-mãe-
e volto de novo
a fechar essa porta.


Ilustração: Sobre o acaso.