Friday, February 28, 2020

EXPLICAÇÃO



Por seres infantil na tua doçura                                               
Conquistada pelas graças do pecado
É que, na mulher, vejo a menina pura
Como águas de um lago indevassado.

Por seres de uma inocência tão patente
Leve, que se danças até flutuas,
Não explica porque navegas mansamente
Ainda quando brilham as carnes nuas.

E porque não há razão no sentimento,
Embora no sentimento haja razão,
Me embrulho na paixão e no momento.

Sei que explicar, às vezes, é tão vão
Como captar em palavras o movimento:
Melhor deixar falar toda a emoção.

Ilustração: Youtube.

PERDIDO, COMPLETAMENTE PERDIDO


Eu tentei me salvar de ti                                                            
Singrando mares que nunca vi
Me perdendo pelos caminhos
Como quem anda por terras estranhas
Sem saber o que é um mapa.
Eu tentei me salvar de ti
Mentindo que não senti
Vestindo máscara e capa
Com tamanhas artimanhas
Que, como um bobo da corte, ri
Do desprezo e da impotência
Que sem teu amor vivi
Perdido na inconsciência.


Ilustração: http://parapensarenti2.blogspot.com.

Julio Cortázar, ainda uma vez


BOLERO                                                      


Julio Cortázar

Qué vanidad imaginar
que puedo darte todo, el amor y la dicha,
itinerarios, música, juguetes.
Es cierto que es así:
todo lo mío te lo doy, es cierto,
pero todo lo mío no te basta
como a mí no me basta que me des
todo lo tuyo.

Por eso no seremos nunca
la pareja perfecta, la tarjeta postal,
si no somos capaces de aceptar
que sólo en la aritmética
el dos nace del uno más el uno.

Por ahí un papelito
que solamente dice:

Siempre fuiste mi espejo,
quiero decir que para verme tenía que mirarte.

BOLERO

Que vaidade imaginar
que posso te dar tudo, o amor e a felicidade,
itinerários, música, brinquedos.
É certo que é assim:
tudo meu te dou, é certo,
porém, tudo o meu não te basta
como a mim não basta o que me dá
tudo o teu.

Por isso não seremos nunca
o casal perfeito, o cartão postal,
se não somos capazes de aceitar
que somente na aritmética
o dois nasce do um mais um.
Por aí papelzinho
Que somente diz:

sempre foste o meu espelho,
quero dizer que, para me ver, tinha que te olhar.

Ilustração: Bing.

E, mais uma vez, o mestre Jaime Sabines



TU NOMBRE

Jaime Sabines

Trato de escribir en la oscuridad tu nombre.
Trato de escribir que te amo.
Trato de decir a oscuras todo esto.
No quiero que nadie se entere,
que nadie me mire a las tres de la mañana
paseando de un lado a otro de la estancia,
loco, lleno de ti, enamorado.
Iluminado, ciego, lleno de ti, derramándote.
Digo tu nombre con todo el silencio de la noche,
lo grita mi corazón amordazado.
Repito tu nombre, vuelvo a decirlo,
lo digo incansablemente,
y estoy seguro que habrá de amanecer.

TEU NOME

Trato de escrever na escuridão o teu nome.
Trato de escrever que te amo.
Trato de dizer no escuro tudo isto.
Não quero que ninguém saiba
que ninguém me olhe às três da manhã
passeando de um lado da sala,
louco, pleno de ti, apaixonado.
Iluminado, cego, cheio de ti, derramando-te.
Digo teu nome com todo o silêncio da noite,
o grita o meu coração amordaçado.
Repito teu nome, volto a dizê-lo,
o digo incansavelmente,
e estou seguro que haverá um amanhecer.

Ilustração: Gizmodo.

E, de novo, o grande Cortázar


Después de las fiestas                                             


 Julio Cortázar

Y cuando todo el mundo se iba
y nos quedábamos los dos
entre vasos vacíos y ceniceros sucios,

qué hermoso era saber que estabas
ahí como un remanso,
sola conmigo al borde de la noche,
y que durabas, eras más que el tiempo,

eras la que no se iba
porque una misma almohada
y una misma tibieza
iba a llamarnos otra vez
a despertar al nuevo día,
juntos, riendo, despeinados.

DEPOIS DAS FESTAS

E quando todo mundo ia embora
e nós dois ficávamos
entre copos vazios e cinzeiros sujos,

como era bonito saber que estavas
lá como um refúgio,
Sozinha comigo na beira da noite
e que duravas, eras mais que o tempo,

eras a que não ia embora
porque o mesmo travesseiro
e o mesmo calor
ia nos chamar outra vez
ao despertar do novo dia,
Juntos, rindo, despenteados.



E retorna Jaimes Sabines


YO NO LO SÉ DE CIERTO              


Jaimes Sabines

Yo no lo sé de cierto, pero supongo
que una mujer y un hombre
un día se quieren,
se van quedando solos poco a poco,
algo en su corazón les dice que están solos,
solos sobre la tierra se penetran,
se van matando el uno al otro.

Todo se hace en silencio. Como
se hace la luz dentro del ojo.
El amor une cuerpos.
En silencio se van llenando el uno al otro.
Cualquier día despiertan, sobre brazos;
piensan entonces que lo saben todo.
Se ven desnudos y lo saben todo.
(Yo no lo sé de cierto. Lo supongo.)

EU NÃO SEI AO CERTO

Eu não sei ao certo, porém, suponho
que uma mulher e um homem
um dia se querem
se são deixados sozinhos pouco a pouco,
algo em seu coração lhes diz que estão sozinhos,
sozinhos na terra se penetram,
se vão matando um ao outro.

Tudo se faz em silêncio. Como
se faz a luz dentro do olho.
O amor une os corpos.
Em silêncio se vão enchendo um ao outro.
Qualquer dia despertam sobre braços;
Pensam, então, que sabem tudo.
Se veem nus e sabem tudo.
(Não sei ao certo.O suponho.)

Ilustração: O Globo.

Thursday, February 27, 2020

Outra poesia de Elie Stephenson


UN MOT                                      




Elie Stephenson

Un mot
et la peur
Un geste
et la peur
Un rire
et la peur
Un oubli
un regard
un baiser
une danse
une chanson
L’infini des mouvements
des enlacements
des ballets
du corps…
du cœur
et la Peur
depuis l’enfance
creusée en Nous
et parce que nous avons Peur
nous sommes toujours
Prêts
à détruire en nous-mêmes
l’ombre du Merveilleux.

UMA PALAVRA

Uma palavra
e o medo
Um gesto
e o medo
Um riso
e o medo
Um lapso
e o olhar
um beijo
uma dança
uma canção
O infinito dos movimentos
dos abraços
dos balés
do corpo...
do coração
e do Medo
desde a infância cavado em Nós
e porque temos medo
nós estamos sempre
preparados
para destruir em nós mesmos
a sombra do Maravilhoso.

Uma poesia de Elie Stephenson


CARAIBES                                                             


Elie Stephenson

Aquarelles d’îles
colonnades de mornes bruissants
à l’appel de sa peau
soleil avant-garde
rivières
sucre de canne
à sang.
Nous bénirons
l’arbre à pain l’igname et la banane
dans les festins populaires
et la danse des terreaux
Caraïbes... je ne sais
la saveur de sa sueur
mais j’entends
la famine qui m’anime


CARIBE

Aquarelas de ilhas
colunas de tristes farfalhar
ao apelo de sua pele
sol vanguarda
rios
de cana de açúcar
de sangue.
Vamos abençoar
a fruta-pão o inhame e a banana
nas festas populares e a dança dos terreiros…
Caribe... eu não sei
o sabor de seu suor
mas eu ouço
a fome que me anima


Ilustração: Costa Cruzeiro.

POEMINHA DA FORMA DE SER FELIZ




Ó coração volúvel,                                                  
ao mesmo tempo,
generoso e lírico,
inconsciente das normas,
libertário espírito do amor,
inconformado aventureiro
das paixões adormecidas.
Todas as belas desejas
quando tua bela é única,
e só por ela, com ela, sobre ela
podes ter todas as outras.
Não sabes o que é ser feliz.
Inventas a felicidade,
todo dia, 
por necessidade de alegria.

Wednesday, February 26, 2020

E, mais uma vez, Margarito Cuéllar


Apocalipsis now                                                     


Margarito Cuéllar

1
Te vas:
los del equipo contrario
cantan en bolero
«adiós, abandonado.»
Alguien pone música al amor
y se alegra
de no estar en mis zapatos.
La belleza nada tiene que decir hoy.
2
Te vas y enloquecen mis camisas.
Mi pie derecho no sabe qué hacer
con el izquierdo.
3
Me queda un litro de yogourth
dos rastrillos
½ botella de whisky
y no sé cuántas noches sin ti.

APOCALIPSE AGORA

1
Você vai:
os da equipe adversária
cantam o bolero
"Adeus, abandonado."
Alguém coloca  música para amar
e fica feliz
de não estar nos meus sapatos.
A beleza não tem o que dizer hoje.
2
Você vai e minhas camisas ficam loucas.
Meu pé direito não sabe o que fazer
com o esquerdo
3
Me sobra um litro de iogurte
dois ancinhos
meia garrafa de uísque
E não sei quantas noites sem você

E, de volta, Margarito Cuéllar





Poética del color

Margarito Cuéllar

Soy oscuro como el alma del que gobierna,
oscura la Tierra, ciertos ríos
y lagos manchados por extrañas raíces,
pero un día fui blanco como algodón bañado por el verano.
Si la tierra es negra, ¿por qué mi corazón ha de ser blanco?
Piden demasiado en un mundo en el que hasta los cerdos juran ser buenas personas.
¿Han visto una pantera del color del día?
¿Y no es oscura la superficie marina cuando el petróleo se derrama como una flor abierta?
¿Y no es oscuro el sueño vestido de pesadilla?
Estuve en la guerra de mi país y todo en su interior era oscuro
y en el infierno no vi una sola alma que irradiara transparencia.
Si el tono de la bilis es negro, el de la sangre no tiene por qué dar otra coloración.
Tengo un caballo negro, un gato negro y un perro del mismo color.
Negras las perlas y no por ello deslucen.
El carbón no siempre tiene el mismo matiz.
¿Y qué me dicen de los pulmones, de la historia y los tumores malignos?
Soy oscuro porque el día no me ve.

POÉTICA DA COR

Sou escuro como a alma do que governa,
e a terra escura, certos rios
e lagos manchados por raízes estranhas,
porém, um dia fui branco como algodão banhado pelo verão.
Se a terra é negra, por que meu coração há de ser branco?
Pedem demasiado em um mundo onde até porcos juram ser boas pessoas.
Você já viu uma pantera da cor do dia?
E a superfície do mar não fica escura quando o óleo derrama como uma flor aberta?
E o sonho não está vestido como um pesadelo sombrio?
Estive na guerra do meu país e tudo no seu interior estava escuro
e no inferno não vi uma única alma que irradiasse transparência.
Se o tom da bílis é negro, o sangue não tem porque dar outra cor.
Tenho um cavalo negro, um gato negro e um cachorro da mesma cor.
Negras as pérolas e nem por isto não deslumbram.
O carvão nem sempre tem o mesmo matiz.
E o que dizer dos pulmões, da história e dos tumores malignos?
Sou escuro porque o dia não me vê.

Ilustração: Acha Brasília.

Poeminha do amor quase imortal





E aí, sua filha, um dia,
inesperadamente,
me avisa que  você se foi
me deixando aqui
com este mundo,
que nunca mais será o mesmo,
onde as canções de Nana Caymmi em espanhol
sempre me farão chorar
te lembrando.
Em certos dias,
como hoje,
não consigo acreditar
que não ouvirei tua voz rouca,
que não terei mais os carinhos da tuas mãos,
o prazer de olhar teus olhos
onde o amor se expressava como poesia
e o desejo como febre.
Contra a tua ausência
tão presente
vou vivendo como posso.
E faço versos para lembrar,
e lamentar, que a vida,
que parecia eterna,
desmoronou no dia
em que você se foi.
Sigo em frente
até que também a noite venha
fechar meus olhos
e, somente assim,
o teu amor será esquecido.
Triste fim:
não te espero mais
nem você espera por mim.


Ilustração: Facebook.

Outra poesia de Rolando Sanchez Mejias




PABELLONES (1)

Rolando Sanchez Mejias
              
La enfermera se pasea como un pájaro devastado. Es pequeña, voraz
y su labio superior, en un esfuerzo esquizoconvexo y final, se ha
constituido en pico sucio. Por otra parte (muestra el médico con
paciencia): "esos ojitos de rata". Tampoco el Director (de formación
brechtiana) deja de asombrarse: "Perturba la disciplina con sus si-
mulacros. De vez en cuando logra levantar vuelo. Claro que lo haría
simplemente de un pabellón a otro. Pero, como quiera, eso representa
un problema para la institución."

PAVILHÕES (1)

A enfermeira caminha como um pássaro devastado. É pequena, voraz
e seu lábio superior, em um esforço esquizoconvexo e final, se há
constituído em um pico sujo. Por outra pare (mostra o médico com
paciência): "esses olhitos de rata". Nem o diretor (de formação
brechtiana) deixa de se surpreender: "Perturba a disciplina com seus
simulacros. De vez em quando levanta voo. Claro que a faria
simplesmente ir de um pavilhão para outro. Porém, como queira, isso representa um problema para a instituição ".

Ilustração: Superinteressante-Abril.