Friday, October 30, 2020

Uma poesia de Leopoldo Maria Panero

 


XXXVIII

Leopoldo María Panero

 

Para qué escribir cuando todo está escrito

Solo quedan manierismos como el Laocoonte de los Monos

La absenta del suplicio, el río enorme y pardo

La cerveza del sacrificio de los hombres que odian a Dios

He aquí que vendrá el diablo a vengarse del frío

De los hombres que dicen amar y que me señalan

Con el dedo, como si yo existiera, como si hubiera existido

alguna vez

Porque yo soy Dios y la vida es hambre de la nada

Hambre del ser que corroe los gusanos

Que nadan sobre mi piel

¡Oh tú flor terrible a la que llaman vida

Que codicia aún mi piel!

Y me llama gusano y la poesía es una mantis religiosa

Que nunca morirá, porque está sobre el papel

Sobre el papel de hiel

Que amamanta al hombre

Como una madre a un niño.

 

XXXVIII

 

Por que escrever quando tudo está escrito

Só ficam os maneirismos como o de um Laocoonte dos Macacos

O absinto do suplício, o rio enorme e marrom

A cerveja do sacrifício de homens que odeiam a Deus

Eis aqui que virá o diabo se vingar do frio

dos homens que dizem que amam e que me assinalam

com o dedo, como se eu existisse, como se houvesse existido

alguma vez

Porque eu sou Deus e a vida não tem fome de nada

Fome do ser que corrói os vermes

Que nadam na minha pele

Oh! Tu flor terrível a que chamam vida

Que minha pele ainda cobiça!

E me chama de verme e a poesia é um louva-a-deus

que nunca morrerá, porque está sobre o papel

sobre o papel de fel

que amamenta o homem

como uma mãe a um filho.

Ilustração: https://www.flickr.com/photos/67106364@n02/6383666299.

 

EM TORNO DA BANANA-DE-MACACO

 


A planta que chamam de banana- de-macaco,

que, para nós, é um adorno, um arbusto elegante

com espécies muito variadas,

entre os índios é um fruto muito apreciado

por suas bagas globosas amareladas

que, na forma, é como se uma espiga de milho fosse.

Os índios usam como vermífugos suas sementes

e, muitos de nós, que gostam de seu doce,

rejeitam seu fruto pelo desagradável sabor adocicado.

Sem entrar no mérito da questão

os morcegos e macacos também o comem com satisfação.

Leio que também a chamam de banana-de-imbé

e que sua raiz é drástica- pode crer,

o que não tenho a mínima noção do que seja

(nem por preguiça vou querer saber).

Muito melhor beber minha cerveja 

e em olhar a planta sentir algum prazer 

em ver que a Natureza é sábia em seu fazer. 

Ilustração: https://reinometaphyta.wordpress.com. Foto original de Mariana Lorenzo. 

Hai Kai da semelhança animal

 


Não se gabe tão imensamente

De contar dinheiro aos montes, seu demente.

Não pense que isto o torna inteligente.

É bom te avisar.

Vou te dizer algo que não sabes, de repente:

Os macacos também sabem contar!

Ilustração: The Daily Telegraph.

E Carl Sandburg ainda...

 


FOG

Carl Sandburg

The fog comes

on little cat feet.

 

It sits looking

over harbor and city

on silent haunches

and then moves on.

 

NÉVOA

O nevoeiro vem

em patinhas de gato.

 

Fica observando

sobre o porto e a cidade

em silenciosas ondas

e, então, segue em frente.

Ilustração: https://alponiente.com/.

Wednesday, October 28, 2020

E, mais uma vez, Carl Sandburg

 

THEME IN YELLOW

 

Carl Sandburg

 

I spot the hillss

With yellow balls in autumn.

I light the prairie cornfields

Orange and tawny gold clusters

And I am called pumpkins.

On the last of October

When dusk is fallen

Children join hands

And circle round me

Singing ghost songs

And love to the harvest moon;

I am a jack-o’-lantern

With terrible teeth

And the children know

I am fooling.

 

TEMA EM AMARELO

 

Eu vejo os morros

com balões amarelos no outono.

Eu ilumino os campos de milho da planície

de laranjas e cachos de dourados,

E não me chamam de abóboras.

No último dia de outubro

Quando anoitece

as crianças se dão as mãos

e circulam em volta de mim

cantando canções de fantasmas

e amor à lua cheia;

Eu sou um João,-o’-lanterna

com dentes terríveis.

E as crianças sabem

que as estou enganando.

 

Ilustração: https://tr.pinterest.com/.

Uma poesia de Ana Maria Guerriere

 


CONCHIGLIE

Anna Maria Guerrieri

 

Sento di assomigliare

ad una conchiglia.

 

Il desiderio di opporsi

a dolorose intrusioni

ha fatto consolidare, nel tempo,

il guscio protettivo.

 

Colorato e brillante

è un allettante richiamo per molti,

ma pochi, o quasi nessuno

riesce a toccare

il cuore molle e fragile

che vi è racchiuso.

 

Solo il mare penetra

senza riserve

quell’intimo complesso,

elicoidale, profondo,

creando mulinelli d’acqua

e bollicine spumeggianti

che portano la vita.

 

La conchiglia che affiora dalla sabbia

è sommersa dal mare.

 

La sua vita interiore è generata

da quell’essere liquido e invadente

che tutta la permea.

 

Il guscio bagnato è bellissimo,

i suoi colori si accentuano

e diventano brillanti.

 

Al suo interno,

a contatto del mare,

palpita la vita.

 

Io sento di assomigliare

ad una conchiglia

e tu al mare.

 

CONCHAS

 

Sinto-me parecida

a uma concha.

 

O desejo de opor-me

à intrusões dolorosas

de fato consolidou, no tempo,

o escudo protetor.

 

Colorido e brilhante

é um lembrete tentador para muitos,

mas poucos, ou quase nenhum

consegue tocar

o coração macio e frágil

que ali está recluso.

 

Só o mar penetra

sem reserva

aquele complexo íntimo,

helicoidal, profundo,

criando redemoinhos de água

e bolhas borbulhantes

que portam vida.

 

A concha que aflora da areia

está submerso pelo mar.

 

A sua vida interior é gerada

daquele ser líquido e intrusivo

que tudo o permeia.

 

A concha molhada é belissíma,

e suas cores são acentuadas

e se tornam brilhantes.

 

No interior,

ao contato do mar,

palpita a vida.

 

Sinto-me parecida

a uma concha

e tu és o mar.

 

Ilustração: https://pt.aliexpress.com/.

E, de volta, Maria Auxiliadora Álvarez

 


LO PLENO 

 

María Auxiliadora Álvarez

 

mientras se colmaba el vacío

 

el eco de la nada

era ensordecedor

 

quizá los obstáculos del sentido

 

nacían de las re-

de las re-

de las reverberaciones

de la voz

 

ahíta de sí

y sin facultad

de escuchar:

 

lo pleno

 

que tal vez

se encontraba

habitado

por el silencio

 

O PLENO

 

enquanto se preenchia o  vazio

 

o eco do nada

foi ensurdecedor

 

talvez os obstáculos do sentido

 

nasceram das

de lá-

das reverberações

da voz

 

plena de si

e sem a faculdade

de escutar:

 

o pleno

 

talvez

se encontrava

habitado

pelo silêncio

 

Ilustração: http://4.bp.blogspot.com/.

 

Monday, October 26, 2020

Outra poesia de Carl Sandburg

 


SOUP

Carl Sandburg

I saw a famous man eating soup.

I say he was lifting a fat broth

Into his mouth with a spoon.

His name was in the newspapers that day

Spelled out in tall black headlines

And thousands of people were talking about him.

When I saw him,

He sat bending his head over a plate

Putting soup in his mouth with a spoon.

 

SOPA

Eu vi o homem famoso tomando sopa.

Eu vi que levava o caldo gordo

até a sua boca com uma colher.

Seu nome estava em todos os jornais do dia

estampados em grandes manchetes pretas

e milhares de pessoas comentavam sobre ele.

Quando eu o vi,

Ele estava sentado com a cabeça enfiada no prato

pondo sopa na sua boca com a colher.

 

Ilustração: https://br.freepik.com/.

Outra poesia de David Maria Turoldo

 


David Maria Turoldo

Amici, mi sento

un tino bollente

di mosto dopo

felice vendemmia:

 

in attesa del travaso.

 

Già potata è la vite

per nuova primavera.

 

Amigos, me sinto

uma tina borbulhante

de mosto depois

de uma feliz colheita:

 

na espera da decantação.

 

Já está podada a videira

para uma nova primavera.

 

Ilustração: https://www.clubevinhosportugueses.pt/.

Sunday, October 25, 2020

Uma poesia de Juan López Maldonado

 


AL AMOR

 Juan López Maldonado

 ¡Ay amor,

perjuro, falso, traidor!

Enemigo

de todo lo que no es mal:

desleal

al que tiene ley contigo

Falso amigo

al que te das por mayor,

¡Ay amor,

perjuro, falso, traidor!

Tus daños

nos dan claro a entender

que un placer

es pesar de cien mil años,

y en mis daños

esto se prueba mejor,

¡Ay amor,

perjuro, falso, traidor!


AO AMOR


Aí amor,

perjuro, falso, traidor.

Inimigo de tudo que não é mal;

desleal

ao que é fiel contigo

Falso amigo

ao que te dás mais,

Aí amor,

perjuro, falso, traidor!

Teus danos

nos deixam claro entender

que um prazer

é o pesar de cem mil anos,

e em meus danos

esta é a prova melhor,

Aí amor,

perjuro, falso, traidor!

 

Ilustração: www.letrasdavida.com.br.

Uma poesia de Carl Sandburg



 LIMITED

Carl Sandburg

I am riding on a limited express, one of the crack trains of the nation.

Hurtling across the prairie into blue haze and dark air

go fifteen all-steel coaches holding a thousand people.

(All the coaches shall be scrap and rust and all the men

and women laughing in the diners and sleepers shall pass to ashes.)

I ask a man in the smoker where he is going and he

answers: "Omaha."

LIMITADO

Eu viajo num trem expresso, um dos melhores comboios do

país.

Voando sobre os campos pela névoa azul e o ar escuro

vão quinze vagões de aço com mil pessoas.

(Todos os vagões, um dia, serão um monte de ferros velhos e todos os homens e mulheres rindo no vagão restaurante e nas cabines dormitórios irão virar pó).

Eu pergunto ao homem que fuma para onde está indo e ele

Responde: “Omaha”.

 

Ilustração: http://www.bh1.com.br/

Uma poesia de David Maria Turoldo

 


IO NON HO MANI 

David Maria Turoldo

Io non ho mani

che mi accarezzino il volto,

(duro è l’ufficio

di queste parole

che non conoscono amori)

non so le dolcezze

dei vostri abbandoni:

ho dovuto essere

custode

della vostra solitudine:

sono

salvatore

di ore perdute.


EU NÃO TENHO MÃOS

Eu não tenho mãos

que me acariciem o rosto,

(duro é o ofício

dessas palavras

que não conhecem o amor)

Não sei as doçuras

dos teus abandonos:

Eu deveria ser

o zelador

de sua solidão:

sou

o salvador

de horas perdidas.

 

Ilustração: Youtube.