Sunday, October 03, 2021

O CARNAVAL, Ó CARNAVAL

 



Sim. Eu deveria estar no Rio de Janeiro.
Sim. Loucamente me preparando para desfilar na Vila Isabel.
E, certamente, estaria ébrio e cantando, dançando, rindo de todas as coisas
Como qualquer outro carnavalesco bobo.
Nada é como se planeja
E, agora, veja
Por causa de um mosquito, uma malária, vou ver tudo pela televisão.
Soy Loco por Ti, América,
Não passou de uma ilusão.

O carnaval serve para ver as coisas claramente.
As vidas emprestadas, as máscaras, as vozes, os sons, o estar ou não estar,
Em toda parte, serve para mostrar que a vida é uma arte
Nada fácil.
As fantasias, as baterias que arrepiam
São como os corpos e as almas que se extraviam
Apenas uma metáfora da vida.
No fim a quarta-feira, o desengano, querida.

As coisas de antes se recolocarão depois.
Sabe aquele amor de nós dois foi ilusão.
E até hoje sinto a falta de seu corpo, de suas mãos,
De seu olhar e do carinho que não há mais.
E bem que me alertava que nós íamos morrer
E que não dava pra comprar o prazer, a alegria,
O gozo, a vontade de amar que, agora, dorme em paz.
Como o carnaval que perdi o amor se foi.

E agora me dou conta de que de nada valem
Os carros alegóricos, as vistosas fantasias, as palmas da multidão.
Nada vale estar nas vitrines brilhantes
Quando logo mais, em instantes, estará desfeito o mundo de ilusão.
Mesmo sob os gritos de “é campeão”, em meio as cores, aos adereços, à música e à comemoração

Não poderemos afastar o pensamento da morte e da solidão
E que, na quarta-feira, desarmados e infelizes,
A vida volta ao normal
E como recordação as fotos de mais um carnaval.
E, como são todos iguais, e completamente diferentes,
Não me sinto mais tão revoltado intimamente
E, mesmo sem beber,
Visto o abadá do Bloco da Mucura
Pensando que a vida é bela, ó criatura.

(Porto Velho, fevereiro de 2005)

Ilustração: Mixcloud. 

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