Monday, January 31, 2022

Uma poesia de Eve L. Ewing

 


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Eve L. Ewing                                                       

i stand before you to say

that today i walked home

& caught the light through

the fence & it was so golden

i wanted to cry & i lifted

my right hand to say thank

you god for the sun thank

you god for a chain link fence

& all the shoes that fit into

the chain link fence so that

we might get lifted god thank

you & i just wanted to dance

& it feels good to have food

in your belly & it feels good

to be home even when home

is the space between metal

shapes & still we are golden

& a man who wore the Walk

of hard grounds & lost days

came toward me in the street

& said ‘girl what a beautiful

day’ & i said yes, testify

& i walked on & from some

place a horn rose, an organ,

a voice, a chorus, here to tell

you that we are not dead

ot dead we are not dead

wwe are not dead we are not

dead we are not dead we are

ne are not dead we are not

dead

yet

TESTEMUNHO

eu estou diante de você para dizer

que hoje eu caminhei para casa

& peguei a luz através

da cerca e era tão dourada

eu queria chorar e eu queria levantar

minha mão direita para agradecer

você deus o sol obrigado

você deus por uma cerca de arame

& todos os sapatos que se encaixam

na cerca de arame para que

possamos levantar deus obrigado

você e eu desejava dançar

& é bom ter comida

na sua barriga e é bom

sentir-se em casa mesmo quando a casa

é o espaço entre formas

de metal e ainda somos dourados

& um homem que costumava caminhar

por duros caminhos e dias perdidos

veio em minha direção na rua

& disse 'menina que lindo

dia' e eu disse sim, testemunho

& eu andei & de algum

lugar coloquei uma rosa de chifre, um órgão,

uma voz, um coro, aqui para contar

a você que não estamos mortos

que a morte não nos matou

não estamos mortos não estamos

mortos não estamos mortos estamos

né não estamos mortos não estamos

mortos

ainda

Ilustração: MaisFé.org.

PERDIÇÃO


 ...e as lágrimas que não vem

não significam ausência de tristeza
são mais frutos da alma presa
da qual não brota coisa alguma...
Vida que percorro em tombos,
febril, veloz no meu cansaço.

Ah, sei que, aos poucos, me desfaço
e não disfarço
o mal que me corrói de saber
que me acabo vivendo um mau viver.
Limpo o corpo no prazer torpor
de explodir no gozo embriagador
sujando a alma que nunca se enganou.

...porque tardam tanto a morte e o amor?

Ilustração: https://wiki.geloefogo.com/index.php/Arquivo:Valyria_on_the_Doom.png

Saturday, January 29, 2022

Canção do Ano Novo

 


Adeus, ano velho, adeus.

Fiz o que pude

Com os dias teus;

Amei, o pouco que podia,

Ri, quando foi possível ter alegria;

Chorei, os amigos que ficaram na estrada,

E porque não te devo nada

Me despeço de ti dando risadas.

Vai...O teu tempo ficou para trás!

 

Bem-vindo, ano novo, bem-vindo!
Entra sem bater,

Entra sorrindo

Como escola de samba que vai ser campeã.

Traz como porta-estandarte

Minhas esperanças

E a melodia de novos dias,

Creio, cheios de alegria.

Confesso que pretendo ser feliz.

Não quero o céu, não!

Só amor, carinho, mel, café e pão

E os beijos de Maria,

Três vezes ao dia,

Com música, poesia, prazer, emoção

E nem me importo se a vida é uma ilusão.

Ilustração: Superinteressante.

(De "Jardim Dizpersivo", Editora Per Se, 2013).





 

Poema do Contentamento

 


  Talvez, uma noite, numa praia

   estaremos juntos, um ao lado do outro, 

   olhando  as estrelas brilharem,

   como faróis do céu.

   O rumor das ondas do mar 

   há de mostrar

   como eram infundadas nossas preocupações 

   e, no ar, canções 

   falarão que o nosso amor era inevitável.

   É possível que uma chuva, 

   muito fina,

   corte, suavemente, a escuridão

   e que o frio faça com que tuas mãos,

   sem receio, encontrem as minhas,     

   e o beijo, esperado faz tanto tempo,

   será apenas o selo do contentamento.

  Em silêncio, então,

  maravilhados com o amor e com a paz,

  nos sentiremos felizes

 por existir e nada mais.

 Ilustração: https://enealumen.net/mojo-contentamento/.


A Dor de Viver

 


A minha última risada
Ainda ecoa,
Mas, você me diz
Que rio à-toa
Mesmo se a vida não é boa
Ainda é um milagre,
Pois, se muito arde
Até com pimenta,
Rosa, se goza.

Ilustração: https://www.facebook.com/remanescente.do.caos.

(De “Águas Passadas”, Editora Castanheiras)

Friday, January 28, 2022

A Incerteza do Amor

 


Eu sei que não te amei este ano

Da forma que devia ter te amado.

O tempo passado, porém, não apaga

Este amor que tenho conservado,

Sem aditivos ou estabilizantes,

Como uma preciosidade

Que me garante que a vida vale a pena

Ainda que não te veja ou não te escute

Por saber que existes e respiras

E estais em algum lugar distante.

 

Muitas vezes leio tuas palavras

E, como um crente, vejo tua imagem.

Sonho, rio, com teus sonhos viajo

Como se fosse possível sem ver te adivinhar.

Sei que um dia a mágica há de acabar,

Mas, acredito, em ti como no presente:

Algo que se vive e nem se sente,

Porém, cuja beleza de viver

Me leva muito adiante. Há de haver um instante

Em que nos veremos frente à frente

E, decerto, será diferente.

 

O amor, como a vida, é incerto,

Um quebra-cabeças que os desejos e os risos

Eleva, desce e tanto causa dores como preces.

Eu não sei de nada e nem te conheço

Embora nos sonhos que teço

Está o de te conhecer

E, até nos meus mais leves sonos,

Isto é uma imensa fonte de prazer!

Ilustração: Textos de Amor.


Sempre Garcilaso de La Vega

 


Soneto V

Garcilaso de la Vega

Escrito está en mi alma vuestro gesto,

y cuanto yo escribir de vos deseo;

vos sola lo escribisteis, yo lo leo

tan solo, que aun de vos me guardo en esto.

 

En esto estoy y estaré siempre puesto;

que aunque no cabe en mí cuanto en vos veo,

de tanto bien lo que no entiendo creo,

tomando ya la fe por presupuesto.

 

Yo no nací sino para quereros;

mi alma os ha cortado a su medida;

por hábito del alma mismo os quiero.

 

Cuanto tengo confieso yo deberos;

por vos nací, por vos tengo la vida,

por vos he de morir, y por vos muero.

 

Soneto V

 

Escrito está em minha alma o seu gesto,

e como eu escrevo de ti o que desejo;

só o que tu escrevestes, eu leio

tão só o que de ti guardo é isto.

 

E nisto estou e estarei sempre posto;

ainda que não caiba em mim o que em ti vejo,

de tanto bem que não entendo e creio,

tomando já a fé por pressuposto.

 

Eu não nasci senão para ti querer;

minha alma os há ajustado a sua medida;

hábito da alma eu te quero.

 

Quanto tenho confesso eu te dever;

Por ti nasci, por ti eu tenho a vida,

por ti hei de morrer, e por ti morro.

Ilustração: SlideShare.

 

O Valor do Amor

 

 


O amor é uma criptomoeda:


Inconsistente, irreal e valorizada.


Como todas as coisas: nada!


Ilustração: Alibaba.

PRIMEIRO POEMA DO VAZIO

 


Que sua busca incluía
tudo o que não havia
nunca, nunquinha de encontrar,
ficava no ar.
Bem dentro de si sabia,
como da grandeza do mar,
mas, não desejava pronunciar
na ilusão de que o que não é dito
não iria se consumar.
E seguia a caminhar em frente
(volta do tempo não há),
de modo que suspensa no olhar
transmitia infindável melancolia
do que vivia a procurar.
E, para ele, claro como o dia
de mais puro azul e alegria,
se certeza havia,
seria de que em algum lugar,
em algum dia,
o vazio havia de encontrar.

Ilustração: Instituto Humanitas Unisinos.

E, outra vez, Manuel Altoguirre



BAJO TU SOMBRA

Manuel Altolaguirre

A la sombra de tu vida

quiero detener mi tiempo,

que tu profundo horizonte

me haga perderme en su seno;

que tu silencio recubra,

con arboleda de sueños,

este corazón que guarda

tantas soledades dentro.

 

SOB TUA SOMBRA

Na sombra de tua vida

quero deter o meu tempo

que teu profundo horizonte

me faça perder-me em teu seio;

que teu silêncio recubra

com uma floresta de sonhos,

este coração que guarda

tantas solidões lá dentro.            

Ilustração: Sabedoria Universal.


Thursday, January 27, 2022

LVI

 

Canto porque cantar é minha vocação.

Canto canções que sei

ou desconheço.

Canto em grego, latim

e francês.

Canto por qualquer coisa,

por qualquer preço.

Fazer outra coisa não farei.

 

Canto

pelas coisas que passam,

pelas coisas que ficam,

por não saber porque canto.

 

Canto

pelo momento,

pelo encanto de cantar.

Canto

porque quando canto

lembro que nasci para te amar.

Ilustração: G1-Globo. 

(De "Cem Poemas em Cem Dias", Editora Viseu, 2021). 


 

Uma poesia de Gioconda Belli

 


EN LOS BUENOS DÍAS…

  Gioconda Belli

 En los días buenos,

de lluvia,

los días en que nos quisimos

totalmente

en que nos fuimos abriendo

el uno al otro

como cuevas secretas;

en esos días, amor,

mi cuerpo como tinaja

recogió toda el agua tierna

que derramaste sobre mí

y ahora

en estos días secos

en que tu ausencia duele

y agrieta la piel,

el agua sale de mis ojos

llena de tu recuerdo

a refrescar la aridez de mi cuerpo

tan vacío y tan lleno de vos.

 

NOS BONS DIAS....

Nos bons dias

de chuva,

os dias em que nos amávamos

totalmente

em que nos fomos abrindo

um para o outro

como cavernas secretas;

naqueles dias, amor,

meu corpo como uma jarra

recolheu toda a água terna

que derramastes sobre mim

e agora

nestes dias secos

quando sua ausência dói

e racha a pele,

a água sai dos meus olhos

cheio de tua recordação

para refrescar a aridez do meu corpo

tão vazio e tão cheio de você.

Ilustração: SoundCloud.

Sunday, January 23, 2022

III

 


Que você me faz rir, eu sei.

E há outras coisas já pensei

que me encantam na sua forma de ser

que, aqui, não vou dizer.

Que seu perfume me seduz

e teus olhos brilham na luz

também não é nenhuma novidade.

Talvez,

no entanto, teu maior encanto,

de verdade,

seja que continue a sonhar

em te beijar

quando já te beijei tanto

e me sinto desamparado

se não estás a meu lado,

tanto, tanto, tanto.

(De "Cem Poemas em Cem Dias", Editora Viseu, 2021). 

Outra poesia de Raúl González Tuñón


 

LOS SUEÑOS DE LOS NIÑOS INVENTANDO PAÍSES

Cuando paso frente a un local donde
exponen pinturas de niños, sigo de largo.

BATLLE PLANAS

Raúl González Tuñón

Porque el niño conserva todos los libres bríos
de la invención, baraja sus monstruos increíbles
y sus enloquecidos ángeles.
La bárbara inocencia sin prejuicios de la primera pureza
y el espléndido caos, el delirio de la razón, la fantasía.

El niño es el primer surrealista.

Y crece, es hombre, y sigue viviendo mas no sabe
y quien lo lleva adentro así lo ignora.
A veces, de manera sutil, eso supongo,
en cada acto adulto la infancia nos vigila
—una voz, un suceso rotundo, familiar, una lámpara,
una paloma herida con mensaje—.

Todo hombre en el final minuto de su invierno
piensa en algo lejano cuando muere.
Y la muerte es el último país que el niño inventa.

OS SONHOS DAS CRIANÇAS INVENTANDO PAÍSES

Quando passo em frente a um lugar onde

expõem pinturas de crianças, passo ao largo.

            BATLLE PLANAS

 

Porque a criança conserva todo o livre arbítrio

da invenção, embaralha seus incríveis monstros

e seus enlouquecidos anjos.

A bárbara inocência sem prejuízo da primeira pureza

e o esplêndido caos, o delírio da razão, a fantasia.

A criança é o primeiro surrealista.

 

E cresce, é um homem, e continua a viver, mas não sabe

e quem o leva dentro de si ignora-o.

Às vezes, de maneira sutil, suponho,

em cada ato adulto a infância nos vigia

-uma voz, um evento preciso, familiar, uma lâmpada,

um pombo ferido com uma mensagem.

 

Todo homem no minuto final de seu inverno

pensa em algo distante quando morre

E a morte é o último país que a criança inventa.

Ilustração: Artmaujer.

Um poema de Mina Loy

 


SONGS TO JOANNNES, VII

Mina Loy

My pair of feet

Smack the flag-stones

That are something left over from your walking

The wind stuffs the scum of the white street

Into my lungs and my nostrils

Exhilarated birds

Prolonging flight into the night

Never reaching.

CANÇÕES PARA JOANNES, VII

Batem meus pés

Nas pedras da bandeira

Isto foi alguma coisa que restou da sua caminhada

O vento estufa a escória da rua branca

Em meus pulmões e minhas narinas

Pássaros exuberantes

Prolongando o voo dentro da noite

Nunca alcançando.

Ilustração: Wordpress.

Saturday, January 22, 2022

XV

 


É esta dor que me dói

como se não fosse passar nunca.

É este não ter volta,

nem ter como fazer qualquer mágica

que possa avançar ou retroceder no tempo.

É esta lacuna impreenchível,

este vazio que enche todos os dias

e a saudade infinita

que me faz fingir que tenho paz.

É o inevitável, o incompreensível

que me habita

desde que soube, minha linda,

que sua vida estava finda.

Uma poesia de Raúl González Tuñón

 


UN JUGUETE ROTO EN EL BASURAL

Raúl González Tuñón

Un poema está en el sueño. También fuera del sueño.
A veces está allí donde el poeta mira.
Y nada más poético que ese juguete roto
—extraña flor brotada a la intemperie—
que junto a los residuos de los inquilinatos
grises y fraternales
y la hierba menuda del baldío
recatado en el bosque de cemento
piensa cuando jugaba con él un dulce niño
que después fue soldado.

Nunca vuelven.

Y un poema está allí, donde no está el poeta.

UM BRINQUEDO QUEBRADO NO LIXO

Um poema está no sonho. Também fora do sonho.

Às vezes está ali de onde o poeta olha.

E nada mais poético que esse brinquedo quebrado

-estranha flor brotada ao ar livre—

que junto aos resíduos dos inquilinos

cinzas e fraternais

e da grama pequena do deserto

recatado na floresta de cimento

pensa quando brincava com uma doce criança

que depois foi soldado.

Nunca voltam.

 

E um poema está ali, onde não está o poeta.

Ilustração: Papoinverso.

Uma poesia de Karen Head

Venus de Milo: On Being Rediscovered

Karen Head

like that moment,

hairIt’s mussed,

teeth coated

in the stale air

of the morning after

when rushing

for a taxi,

pantyhose

and shoes

in hand,

you encounter

anyone who

thinks they

know you.

VÊNUS DE MILO: SOBRE SER REDESCOBERTO                                                   

É como aquele momento,

cabelo bagunçado,

dentes cobertos

no ar rançoso

da manhã depois

de correr

para um táxi,

colante

e sapatos

na mão,

você encontra

alguém que

pensa que eles

sabem quem é você.

Ilustração: Elo7.