Thursday, September 30, 2021

DEPOIS DE QUALQUER MÊS

 


Quando fevereiro passar

Não pense que será diferente.

É só olhar o teu olhar

que passo a me sentir contente.

Ninguém terá o sentimento

que nós dois omitimos.

E depois do amor, ô, ô,ô,ô,

o prazer que nós dois sentimos!

O desejo que nos faz queimar

é chama que não se apaga.

É vontade que nos faz brincar

de vai e vem, mas, nunca larga.

O nosso amor só nos faz cometer

loucuras,

mas, bem sabemos

que, chorando ou rindo,

o tempo vai passar

é um presente

este querer,

que nem o tempo

pode apagar.

 

Um poema de Francisco Álvarez

 


DULCE Y TRISTE

Francisco Álvarez

 

¡Qué dulce es querer mucho, pero también qué triste!

¿Por qué esperamos tanto y obtenemos tan poco?

¿Por qué si uno se entrega el otro se resiste?

¿Por qué el amor es ciego, y sordo, y mudo, y loco?

 

Llevamos en el alma la divina tendencia

de ofrecer sin reservas nuestros cálidos brazos,

y nos quedamos solos, con nuestra propia ausencia,

y el corazón sangrante partido en mil pedazos.

 

DOCE E TRISTE

Como é doce querer muito, mas também como é triste!

Por que esperamos tanto e obtemos tão pouco?

Por que se um se entrega, o outro resiste?

Por que o amor é cego, surdo, mudo e louco?

 

Levamos em nossa alma a divina tendência

de oferecer sem reservas nossos quentes braços,

e ficamos sozinhos, com nossa própria ausência,

e o coração sangrando partido em mil pedaços.

Ilustração: Bugigangas de amor.

Uma poesia de Henri Michaux

 


Jour de naissance de l’illimitation

Henri Michaux

Un autre monde m’accepte

M’agrée

M’absorbe

M’absout

 

Armistice des passions

 

Dans les bancs de clarté

Souterrainement

Souverainement

 

L’émanation d’exister

L’agrandissement d’exister

Le promontoire, l’impétuosité d’exister

Je suis à l’arrivée de la plénitude

L’instant est plus que l’être

L’être est plus que les êtres

Et tous les êtres sont infinis

DIA DO NASCIMENTO DA ILIMITAÇÃO

Outro mundo me aceita

Me acata

Me absorve

Me absolve

 

Armistício das paixões.

 

Bancos de claridade

Soterradamente

Soberanamente.

 

A emanação do existir

O engrandecimento do existir

O promontório, a impetuosidade do existir.

 

Hei chegado à plenitude

O instante é mais que o ser

O ser é mais que os seres

E todos os seres são infinitos.

Ilustração: https://www.sementesdasestrelas.com.br/.

Tuesday, September 28, 2021

O ACASO

 


As engrenagens tendem sempre a ter problemas

E, numa hora incerta, não funcionarão.

 

Talvez quando delas dependa a vida

Ou meu pobre e sofrido coração.

 

Sei que é imperceptível o mudar. Não temas!

O acaso, mesmo sem som,

É onde Deus põe a mão.

Ilustração: Global Redutores.

Federico Garcia Lorca sim

 


REMANSILLO

Federico Garcia Lorca

Me miré en tus ojos,

pensando en tu alma.

Adelfa blanca.

Me miré en tus ojos,

pensando en tu boca.

Adelfa roja.

Me miré en tus ojos.

¡Pero estabas muerta!

Adelfa negra.

REMANSO

Me olhei nos teus olhos

pensando em tua alma.

Irmã branca.

Me olhei nos teus olhos

pensando em tua boca.

Irmã vermelha.

Me olhei em teus olhos.

Porém estavas morta!

Irmã preta.

Ilustração: https://soundcloud.com/.

 

PRETENSÃO


Eu queria gostar de você
Com o sentimento dos jardineiros
Que cultivam rosas sem pensar
No tempo que vai embora.

Eu queria gostar de você
Sem que a passagem das horas
Me desse este temor de que o amanhã
Nunca vá acontecer
Senão como tempo inexistente

Eu queria gostar de você
Tão calmamente
Que o tempo resolvesse parar
Como única forma de respeitar
A significação de um amor
Que tem tudo de vulcão
E desliza como manso rio.

Eu queria gostar de você
Como gosto:
Por puro desafio.

Ilustração: https://www.ibccoaching.com.br/.



Juan Carlos Galeano de volta


 

MÚSICA

 

Juan Carlos Galeano

 

En la selva se oye la música de la barca subiendo por el río.

 

A una orquídea le da por gritar de placer.

 

Muchos árboles están furiosos. No duermen bien sus hojas,
sacuden con rabia las raíces y le gritan a la barca de la música.

 

A mi madre la Anaconda no le importa.

 

Ella vive muy ocupada dándole vueltas a la tierra,
cargando en su barriga los árboles, los animales y la gente.

 

MÚSICA

Na selva se ouve a música do barco subindo o rio.

Uma orquídea quer gritar de prazer.

 

Muitas árvores estão furiosas. Suas folhas não dormem bem,

sacodem suas raízes com raiva e gritam com o barco da música.

 

Minha mãe, a Anaconda, não se importa.

 

Ela vive muito ocupada dando voltas na terra,

Carregando em sua barriga as árvores, animais e pessoas.

Ilustração: https://pt.vecteezy.com/.

Friday, September 24, 2021

AMANTES

 


O teu olhar me dizia o tempo lá fora:

Era sempre tempo de ficar em teus braços

E, em teus braços, esquecia a hora.

 

Tarde lembrava, em breves espaços,

Que, após a noite, a manhã havia

Mas os teus braços eram fortes laços.

 

E quando o sol presente se fazia

Em raios nos lençóis desarrumados

Para ficar – beijando – eu te pedia.

 

Vinha, então, a lua lembrar dias passados

Mostrando que o tempo era ilusão

E a vida dos casais de namorados

(De “Apocalypse”, Editora Per Se, 2013)


Outra poesia de Don Paterson

 


MY LOVE

Don Paterson

It’s not the lover that we love, but love

itself, love as in nothing, as in O;

love is the lover’s coin, a coin of no country,

hence: the ring; hence: the moon—

no wonder that empty circle so often figures

in our intimate dark, our skin-trade,

that commerce so furious we often think

love’s something we share; but we’re always wrong.

 

When our lover mercifully departs

 

MEU AMOR

 

Não é a amante que nós amamos, mas amamos

em si mesmo, o amor como em nada, como em O;

o amor é a moeda do amante, uma moeda de nenhum país,

daí: o anel; daí: a lua -

não é à toa que o círculo vazio tantas vezes figura

em nossa escuridão íntima, nossa troca de pele,

aquele comércio tão furioso que muitas vezes pensamos

amor é algo que dividimos; mas nós estamos sempre errados.

 

Quando nossa amante misericordiosamente parte

Ilustração: Conti outra.

Thursday, September 23, 2021

Uma poesia de Mary Oliver

 


Instructions for living a life:

 Mary Oliver

Pay attention.

Be astonished.

Tell about it.

 

INSTRUÇÕES PARA VIVER A VIDA:

Mantenha a atenção.

Surpreenda-se

Descreva-me suas surpresas.

Ilustração: Issuu.

Uma poesia de Don Paterson

 


POETRY

Don Paterson

In the same way that the mindless diamond keeps

one spark of the planet's early fires

trapped forever in its net of ice,

it's not love's later heat that poetry holds,

but the atom of the love that drew it forth

from the silence: so if the bright coal of his love

begins to smoulder, the poet hears his voice

suddenly forced, like a bar-room singer's -- boastful

with his own huge feeling, or drowned by violins;

but if it yields a steadier light, he knows

 

POESIA

 

Da mesma forma que o diamante descuidado mantém

uma centelha dos primeiros fogos do planeta

preso para sempre em sua rede de gelo,

não é o calor posterior do amor que a poesia mantém,

mas o átomo do amor que o atraiu

do silêncio: então, se o carvão brilhante de seu amor

começa a arder, o poeta ouve sua voz

repentinamente forçada, como um cantor de bar - orgulhoso

com seu próprio sentimento enorme, ou afogado por violinos;

mas se produz uma luz mais estável, ele sabe

Ilustração: Atacadão da China.

 

O memorial de Rigoberto Paredes

 

MEMORIAL

 Rigoberto Paredes

vuelve

al lugar donde dejó su vida

cuando todo tenía la misma edad del alba

deja caer sus pasos

sobre pasos que ya no nos resisten

mira el reloj del pueblo

y están las mismas horas que urgieron nuestra infancia

alguien nos besa dulce una mejilla

y en la otra sentimos los golpes del olvido

uno vuelve

y no hay madre que diga te esperábamos siempre

ni padre que nos cobre a regaños la ausencia

en manso oleaje el tiempo nos devuelve al origen

esta-aquella la casa

la criatura llorando por bocado

y el patio con abuelos esperando la muerte a todas horas

uno vuelve y no hay perro que alegre su cola por nosotros

no hay quien diga siquiera es duro este lugar por qué volviste

sólo antiguas preguntas y lo mismo terrible

la iglesia y sus mendigos

el espanto y sus jueces

el silencio y su estirpe faltándole el respeto a las estatuas

(el mundo apenas nuestro qué jodida)

la rabia no es igual crece sin tregua

está fiera-en-acecho

y por dentro nos dice no es posible el perdón a estas alturas

 

 

MEMORIAL

 

Rigoberto Paredes

 

Voltas

ao lugar onde deixou sua vida

quando tudo tinha a mesma idade do amanhecer

deixa cair seus passos

sobre  passos que não mais resistem

olha para o relógio da cidade

e são as mesmas horas que povoaram nossa infância

alguém  nos beija doce uma bochecha

e na outra sentimos os golpes de esquecimento

um volta

e não há mãe que diga te esperamos sempre

nem pai que cobre repreendendo-nos ausência

em ondas suaves, o tempo nos leva de volta à origem,

a esta-aquela casa

a criatura chorando por um pedaço

e o pátio com avós esperando a morte a qualquer hora

um retorna e não há cachorro que balance o rabo por nós

ninguém sequer que diga este lugar é difícil porque voltaste

apenas velhas perguntas e o mesmo terrível

a igreja e seus mendigos

o espanto e seus juízes

o silêncio e sua linhagem desrespeitando as estátuas

(o mundo só nosso que merda)

a raiva não é a mesma, ela cresce implacavelmente

é a perseguição de besta fera

e por dentro nos diz que é impossível o perdão a esta altura.

Ilustração: Pinterest.

És o mundo

 


A doçura da tua boca,
O mel dos teus seios,
O açúcar de teu corpo
Me fazem pensar
Que o mundo é doce.

Breve ilusão! O mundo não é nada
Ou não passa de imensa abstração.
Na verdade, como o tempo,
É uma canção que passa.

No entanto estais aqui
E isto é o mundo:
O momento do amor e da ternura
O gozo dos sentidos!

E, quando tu desapareces,
O mundo some,
Pois, minha vida,
O mundo és tu:
Mulher, perfume e paixão!

Ilustração: ONU Mulher. 

 

Tuesday, September 21, 2021

Mario Benedetti, pois

 


LA CULPA ES DE UNO

Mario Benedetti

Quiza fue una hecatombe de esperanzas

un derrumbe de algun modo previsto

ah pero mi tristeza solo tuvo un sentido

 

todas mis intuiciones se asomaron

para verme sufrir

y por cierto me vieron

 

hasta aqui habia hecho y rehecho

mis trayectos contigo

hasta aqui habia apostado

a inventar la verdad

pero vos encontraste la manera

una manera tierna

y a la vez implacable

de desahuciar mi amor

 

con un solo pronostico lo quitaste

de los suburbios de tu vida posible

lo envolviste en nostalgias

lo cargaste por cuadras y cuadras

y despacito

sin que el aire nocturno lo advirtiera

ahi nomas lo dejaste

a solas con su suerte

que no es mucha

 

creo que tenes razon

la culpa es de uno cuando no enamora

y no de los pretextos

ni del tiempo

 

hace mucho muchisimo

que yo no me enfrentaba

como anoche al espejo

y fue implacable como vos

mas no fue tierno

 

ahora estoy solo

francamente

solo

 

siempre cuesta un poquito

empezar a sentirse desgraciado

 

antes de regresar

a mis lobregos cuarteles de invierno

 

con los ojos bien secos

por si acaso

 

miro como te vas adentrando en la niebla

y empiezo a recordarte.

 

A CULPA É DE UM

 

Talvez fosse uma hecatombe de esperanças

um derrame de alguma forma prevista

ah!, porém  minha tristeza só teve um sentido

 

todas as minhas intuições assomaram

para me ver sofrer

e por certo me viram

 

até aqui eu tinha feito e refeito

meus trajetos contigo

até aqui tinha apostado

em inventar a verdade

mas você encontrou o caminho

de maneira terna

e, ao mesmo tempo, implacável

de desalojar o meu amor

 

com um único prognóstico tu o retiraste

dos subúrbios da tua vida possível

o envolveste em nostalgia

o carregaste por quadras e quadras

e, lentamente.

sem aviso do ar noturno

o deixaste lá

sozinho com sua sorte,

que não é muita

 

Creio que tem razão

a culpa é de um quando não se apaixona

e não de pretextos

nem do tempo

 

Acho que fez muitíssimo bem

há muito, muito tempo atrás

que eu não me enfrentava

como ontem à noite no espelho

e ele foi tão implacável quanto tu

mas não foi terno

 

agora estou só

francamente

 

sempre custa um pouquinho

começar a se sentir infeliz

 

antes de voltar

para meus aposentos escuros de inverno

 

com os olhos secos

se por acaso

 

Olho como vás entrando na névoa

e começo a te recordar.

Ilustração: https://fanfiction.com.br/.