Thursday, October 31, 2024

BOM USO PARA OS BRAÇOS


Meu amor, 

sei que teus braços são longos, 

todavia, 

não tome como ironia,

não podem alcançar o céu. 

Seja mais modesta, prática

e- como convém a uma rosa-

generosa :

Me abrace!

Ilustração: Pxfuel. 


Uma poesia de Charles Simic

 


MIRRORS AT 4 A.M.

By Charles Simic

You must come to them sideways

In rooms webbed in shadow,

Sneak a view of their emptiness

Without them catching

A glimpse of you in return.

 

The secret is,

Even the empty bed is a burden to them,

A pretense.

They are more themselves keeping

The company of a blank wall,

The company of time and eternity

 

Which, begging your pardon,

Cast no image

As they admire themselves in the mirror,

While you stand to the side

Pulling a hanky out

To wipe your brow surreptitiously.

ESPELHOS ÀS 4 DA MANHÃ

Você deve ir até lado deles

Em salas cobertas de sombras,

Dar uma olhada furtiva no seu vazio

Sem que eles percebam

Um vislumbre teu em troca.

 

O segredo é,

Até a cama vazia é um fardo para eles,

Um pretexto.

Eles são mais eles mesmos mantendo

A companhia de uma parede em branco,

A companhia do tempo e da eternidade

 

Que, pedindo seu perdão,

Não lançam imagem alguma

Eles admiram a si mesmo no espelho,

Enquanto ficas de lado

Puxando um lenço

Para enxugar sua testa sub-repticiamente.

Ilustração: Go Quadros.

Uma poesia de Ernesto Delgado

 


EL DOLOR Y EL CANTO

Ernesto Delgado

Pongo mi dolor a cantarme:
lo encierro en mi oído y me duermo doliéndome. Cuando despierto la jaula está
abierta, pero no está abierta, es un canto que duele después, por eso no tiene alas;
es solo un canto que duele después. Pero tú no tienes alas, tú solo
dueles.

Pongo mi dolor a cantarme tu dolor con ese chillido de la demencia
que te escuché soltar en el alambre de la camilla.
Así, con ese chillido, entró la muerte en tus huesos como entra el aire en diciembre por las paredes de los pobres.
Así, con ese chillido, caíste rígida y solemne, carcomida estatua.
Así cantan las hojas cuando el viento las arrastra por los patios.
Es el mismo canto que lanzabas entre las cucharas de aluminio
para que las sombras de la noche fueran cabizbajas hacia el fondo de la casa
con sus hocicos sucios por los huesos tirados en el portal de tus años.
Tú dejas mi oído abierto para que yo te escuche existir.

Por eso pongo mi dolor a cantarme tu dolor.
Yo estoy lleno de pichones,
mi dolor pone huevos en tus muertes.
Tu canto y mi canto chocan, no se reconocen y se siguen buscando:
Desde siempre mi dolor cantó en tu oído y no lo reconocías,
desde siempre cantó junto al tuyo en la jaula de la vida.
Siempre cantó en tu cama de hospital, cantó hasta tener plumas,
hasta posarse en las alambradas con que me cercan y condenan.
Canta fuerte para que yo lo reconozca y encierre. Pero tu dolor no me deja escucharlo.

A DOR E A CANÇÃO

Ponho minha dor a cantar para mim:

a encerro no meu ouvido e adormeço dolorido. Quando desperto a gaiola está

aberta, porém não está aberta, é uma canção que dói depois, por isto não tem asas;

É apenas uma música que dói depois. Porém tu não tens asas, tu só

sente dor.

 

Por isto ponho minha dor a cantar tua dor para mim com aquele grito de demência

que ouvi você soltar no fio da maca.

Assim, com aquele grito, a morte entrou em seus ossos como o ar entra em dezembro pelas paredes dos pobres.

Assim, com aquele grito, você caiu rígido e solene, uma estátua arruinada.

É assim que cantam as folhas quando o vento as sopra pelos pátios.

É a mesma música que cantavas entre as colheres de alumínio

para que as sombras da noite caíssem na parte de trás da casa

com os focinhos sujos dos ossos jogados no portal dos seus anos.

Tu deixas meu ouvido aberto para que eu te escute existir.  

 

Por isto coloquei minha dor para cantar tua dor para mim.

Estou cheio de pombos,

minha dor põe ovos em suas mortes.

Teu canto e o meu canto se chocam, não se reconhecem e continuam se procurando:

Minha dor sempre cantou em teu ouvido e tua não  a reconheces,

desde sempre cantou junto ao teu na jaula da vida.

Sempre cantou na sua cama de hospital, cantou até ter penas,

até pousar nas cercas de arame com que me cercam e me condenam.

Canta alto para que o reconheça e encerre. Porém tua dor não me deixa ouvir.

Ilustração: Cantos para Missa-WordPress.

Wednesday, October 30, 2024

Outra poesia de Alice Walker

 


BE NOBODY’S DARLING

Alice Walker

Be nobody's darling;
Be an outcast.
Take the contradictions
Of your life
And wrap around
You like a shawl,
To parry stones
To keep you warm.
Watch the people succumb
To madness
With ample cheer;
Let them look askance at you
And you askance reply.
Be an outcast;
Be pleased to walk alone
(Uncool)
Or line the crowded
River beds
With other impetuous
Fools.

Make a merry gathering
On the bank
Where thousands perished
For brave hurt words
They said.

But be nobody's darling;
Be an outcast.
Qualified to live
Among your dead.

NÃO SEJA O QUERIDINHO DE NINGUÉM

Não seja o queridinho de ninguém;

Seja um pária.

Pegue as contradições

da sua vida

envolva-se nelas

como um xale,

para aparar pedras

para manter seu calor.

Observe as pessoas sucumbirem

à loucura

com ampla alegria;

deixe-as olharem de soslaio para você

e você responda de soslaio.

Seja um pária;

fique feliz em andar sozinho

(não é legal)

Ou em alinhar os leitos lotados

dos rios

com outros impetuosos

tolos.

Faça uma reunião alegre

na margem

onde milhares pereceram

por corajosas e ferinas palavras.

Eles disseram.

 

Porém não seja o queridinho de ninguém;

Seja um pária.

Qualificado para viver

entre seus mortos.

INSENSÍVEL


Quando te disserem

que nunca leem poesias

canta uma música.

Quando te disserem

que não gostam de música,

não meditam

nem rezam, 

então, não perca seu tempo.

Alguém assim 

pode até se dizer teu irmão, 

todavia é um ser humano

sem salvação.  

Ilustração: Bing. 

Tuesday, October 29, 2024

Outra poesia de Gata Cattana

 


LEVIATÁN

Gata Cattana

Tú te has empeñado en buscarme
sin bombonas, a pulmón,
agua adentro una y otra,
día tras día, y ni rastro…
Primero, en el muelle,
con caña vulgar y paciencia,
mucha paciencia;
y luego, las redes, los barcos
y otros métodos sofisticados
que fuiste escogiendo
según los fracasos.
Y así, uno por uno,
todos los charcos,
las aguas pantanosas y los mares
que fueron allanados
en mi busca
te parecieron insuficientes
y seguías queriendo más,
sin importar las pérdidas
y las bajas.
Y da igual,por más velero o por más yate
que intentaras,
por más técnica avanzada,
yo nunca fui pez de orilla.
Hubieras necesitado un leviatán.

LEVIATÃ

Tu te hás empenhado em me buscar

sem cilindros, nos pulmões,

água dentro de uma outra,

dia após dia, e nem um rastro...

Primeiro, no cais,

com bengala vulgar e paciência,

muita paciência;

e logo, as redes, os barcos

e outros métodos sofisticados

que fostes escolhendo

conforme os fracassos.

E assim, um por um,

todas as poças,

as águas pantanosas e os mares

que foram invadidos

na minha busca

te pareciam insuficientes

e seguias querendo mais,

sem importar as perdas

e as baixas.

E igualmente, por mais veleiros ou iates

o que tentasses,

por mais técnica avançada,

eu nunca fui um peixe de praia.

Haverias necessitado de um leviatã.

Ilustração: Fandom.

Viva Simplesmente


Não viva a esperar nada.

Viva simplesmente.

Seja surpreendido

por uma felicidade inesperada

ou suporte, como puder, infeliz pena.

Sorria apenas

e se livre da permanência da necessidade. 


Deseje somente que a vida flua. 

Que seu coração, tão pequeno, 

tenha a resistência das estrelas

mesmo diante da desintegração,

no seu caso, de um desapontamento. 

Cubra-se com um carinho insensível, frio,

que sua alma encare com estoicismo,

talvez, mesmo com indiferença 

a hora do lamento. 

Certifique-se da razão 

de que, mesmo a maior figura humana, ser tão pequena

na largura do espaço e do tempo.

Seja muito sensato. 

Não viva a esperar nada.

Viva simplesmente 

para ser surpreendido

talvez, por uma felicidade imprevista,

mas lembre-se que há dores na vida. 

 

Uma poesia de Kara van de Graaf

 


ABRACADABRA

By Kara van de Graaf

How many hours have I wasted

            trying to turn this into that, a rabbit

and a hat, a woman whose body

 

            can split into three separate pieces.

This is my idea of magic, hiding

            what exists in plain sight:

 

an overbite, a sparkle

            of gray hair at the temples, a sag

at the side of an arm. And still,

 

            what alarm when I see through

my own illusions, catch a glimpse

            of a woman transported

 

into a restaurant window who couldn’t,

            will never be me. I never had

a family, no children who would

 

            allow me to age backwards or see

my own face filtered through

            the lens of love. It’s hard

 

to adore something you never

            drug into existence yourself,

never saw fit to copy, each version

 

            brighter than the last, like a string

of knotted scarves you can pull

            forever out of a sleeve. It’s easier

 

to believe every iteration

            surpasses the past, that new flesh

refines itself, poreless and pink.

 

            But it’s only me standing

in the cabinet, hand over a lever, waiting

            to disintegrate in the dark.

ABRACADABRA

Quantas horas tenho jogado fora

 

            tentando tornar isso ou aquilo, num coelho

e um chapéu, uma mulher cujo corpo

 

pode se dividir em três peças separadas.

            Esta é minha ideia de mágica, esconder

o que existe da vista de todos:

 

uma mordida cruzada, um brilho

            de cabelos grisalhos nas têmporas, uma flacidez

na lateral de um braço. E ainda,

 

           que alarme quando vejo através

das minhas próprias ilusões, vislumbro

           uma mulher transportada

 

para a janela de um restaurante que não poderia,

          nunca ser eu. Eu nunca tive

uma família, nenhuma criança que me permitiria

 

envelhecer para trás ou ver

          meu próprio rosto filtrado

pelas lentes do amor. É duro

 

adorar algo que você nunca

          arrastou para sua existência,

nunca achou adequado copiar, cada versão

 

           brilhando mais que a última, como uma série

de lenços amarrados que você pode puxar

           para sempre de uma manga. É mais fácil

 

acreditar que cada iteração

           supera o passado, que a nova carne

refina a si mesmo, sem poros e rosa.

 

           Porém sou somente eu de pé

no armário, com a mão na alavanca, esperando

           para me desintegrar no escuro.

Ilustração: Play BPM.

Monday, October 28, 2024

Dorothy Parker prometeu e voltou

 


“I SHALL COME BACK”

Dorothy Parker

I shall come back without fanfaronade
Of wailing wind and graveyard panoply; 
But, trembling, slip from cool Eternity-
A mild and most bewildered little shade. 
I shall not make sepulchral midnight raid, 
But softly come where I had longed to be 
In April twilight’s unsung melody, 
And I, not you, shall be the one afraid. 

Strange, that from lovely dreamings of the dead 
I shall come back to you, who hurt me most. 
You may not feel my hand upon your head, 
I’ll be so new and inexpert a ghost. 
Perhaps you will not know that I am near,-
And that will break my ghostly heart, my dear. 

“EU IREI VOLTAR”

Eu voltarei sem fanfarronice

Do choroso vento e panóplia de cemitério;

Porém, tremendo, deslizarei da fria Eternidade-

Uma pequena, suave e muito confusa sombra.

Eu não farei um ataque sepulcral à meia-noite,

Porém suavemente chegarei aonde eu ansiava estar

No crepúsculo de abril na não cantada melodia,

E eu, não você, serei o único a ter medo.

 

Estranho, como os sonhos adoráveis ​​com os mortos

Eu voltarei para você, que me feriu mais.

Você pode não sentir minha mão na sua cabeça,

Eu serei tão novo e inexperiente como fantasma.

Talvez você não saiba que estou perto,-

E isto irá quebrar meu coração fantasmagórico, minha querida.

 

Uma poesia de Luis Feria

 


TIEMPO DE AMOR

Luis Feria

Este tiempo de amor nunca termine.
No lo empañe el olvido con su óxido;
debe quedar intacto hasta la muerte
lo que nació inmortal como el sonido.

Este tiempo de luz alguien lo salve;
lo arranque alguien de este precipicio
al que se aboca ya desde que alienta.
Que alguien corte la amarra y vaya suelto
del tiempo, a la deriva, hasta la playa donde
no lo fulmine el rayo a pesar suyo,
no lo desgaste el tiempo como a un día.

TEMPO DE AMOR

Que este tempo de amor nunca termine.

Nem o esquecimento o empane com seu óxido;

deve permanecer intacto até a morte

o que imortal como o som foi nascido.

 

Este tempo de luz, alguém o salve;

o arranque alguém deste precipício

ao qual se avoca desde que respira.

Que alguém corte a amarra e que se vá solto

do tempo, à deriva, até à praia onde

não o fulmine o raio apesar dele mesmo,

não o desgaste tempo como a um dia.

Ilustração: Tempo e Amor. 

 

Para não Desesperar


Ainda creio que há esperança

enquanto o barco não foi a pique.

Nem importa se na tempestade dança

ou se não há solução que se identifique. 

A questão toda é só de usar a bússola, 

manter a calma, aquietar a alma

e acertar o prumo e a direção,

pois com muito pouco se consola,

quem, até agora, só ouve imprecação. 

O que se espera não é o grito louco

nem a pancada feroz da voz, da mão.

O que se quer é de tanto pão, um pouco,

e, vez por outra, mais carne no feijão. 

 

Sunday, October 27, 2024

Uma poesia de Gata Cattana

 


CULPABLES

Gata Cattana

Aquella noche
no existe ya
más en el brillo
de tus ojos
cuando me miran,
cómplices…
En el cosquilleo
del secreto.
Estábamos hechos
de la plenitud
de sabernos débiles,
más de carne que nunca.
A sabiendas del pecado.
Culpables, culpables, culpables…
Temblando de miedo
y de pudor,
al descubrirnos
con la manzana
en la boca.

CULPADOS

Aquela noite

já não existe mais

mais no brilho

dos teus olhos

quando me olhavam

cúmplices…

Nas cócegas

do segredo.

Estávamos

cientes da plenitude

de nos sabermos débeis,

mais de carne do que nunca.

Conhecendo o pecado.

Culpados, culpados, culpados...

Tremendo de medo

e de pudor,

ao nos descobrirmos

com a maçã

na boca.

Ilustração: Linkedin.

Uma poesia Ella Wheller Wilcox

 


GHOSTS

Ella Wheller Wilcox

There are ghosts in the room.

As I sit here alone, from the dark corners there

They come out of the gloom,

And they stand at my side and they lean on my chair

 

There’s a ghost of a Hope

That lighted my days with a fanciful glow,

In her hand is the rope

That strangled her life out. Hope was slain long ago.

 

But her ghost comes to-night

With its skeleton face and expressionless eyes,

And it stands in the light,

And mocks me, and jeers me with sobs and with sighs.

 

There’s the ghost of a Joy,

A frail, fragile thing, and I prized it too much,

And the hands that destroy

Clasped its close, and it died at the withering touch.

 

There’s the ghost of a Love,

Born with joy, reared with hope, died in pain and unrest,

But he towers above

All the others-this ghost; yet a ghost at the best,

 

I am weary, and fain

Would forget all these dead: but the gibbering host

Make my struggle in vain-

In each shadowy corner there lurketh a ghost.

FANTASMAS

Há fantasmas na sala.

Enquanto estou aqui sentado sozinho, lá dos cantos escuros

Eles saem da escuridão,

E ficam ao meu lado e se apoiam na minha cadeira

 

Há um fantasma da esperança

Que iluminou meus dias com um brilho fantasioso,

Na mão dela está a corda

Que estrangulou sua vida. A esperança foi morta há muito tempo.

 

Porém seu fantasma vem esta noite

Com seu rosto esquelético e olhos inexpressivos,

E fica na luz,

E zomba de mim, e zomba de mim com soluços e suspiros.

 

Há o fantasma da alegria,

Uma coisa frágil, frágil, e eu a prezava tanto,

E as mãos que destroem

Apertaram seu fecho, e ele morreu murchando ao toque.

 

Há o fantasma de um amor,

Nascido com alegria, criado com esperança, morto em dor e inquietação,

porém ele se eleva acima

Todos os outros- este fantasma; ainda um fantasma na melhor das hipóteses,

 

Estou cansado e feliz

Queria esquecer todos esses mortos: porém a hoste balbuciante

Faz minha luta ser em vão-

Em cada canto escuro me vigia um fantasma.

Ilustração: Vida Boa.