Wednesday, February 19, 2025

Eis Philip Larkin

  


TALKING IN BED

Philip Larkin

Talking in bed ought to be easiest,
Lying together there goes back so far,
An emblem of two people being honest.
Yet more and more time passes silently.
Outside, the wind's incomplete unrest
Builds and disperses clouds in the sky,
And dark towns heap up on the horizon.
None of this cares for us. Nothing shows why
At this unique distance from isolation
It becomes still more difficult to find
Words at once true and kind,
Or not untrue and not unkind.

CONVERSANDO NA CAMA

Conversar na cama deveria ser mais fácil,

Deitar juntos lá remonta a tanto tempo,

Um emblema de duas pessoas sendo honestas.

No entanto, mais e mais passa tempo mais silenciosamente.

Lá fora, a inquietação incompleta do vento

Cria e dispersa nuvens no céu,

E escuras cidades se amontoam no horizonte.

Nada disto nos importa. Nada mostra o porquê

Nesta distância única do isolamento

Torna-se ainda mais difícil encontrar

Palavras, ao mesmo tempo, verdadeiras e gentis,

Ou que não sejam falsas e não cruéis.

Ilustração: Texto do Dia.

Lembrança

 


Há mensagens que nunca chegam
ao destinatário

(Como os pensamentos meus que rodeiam

a tua imagem e voz quase esquecidas)

Qual garrafa lançada ao mar

Que afunda num banco de areia.

 

Nosso destino, talvez,

Esteja suspenso assim

Numa mensagem que não chegou ao fim

Na notícia de longe que não veio.

 

E tu, que serias o farol, a luz,

O guia do ser e do prazer

Permanece como uma estrela do passado

Que não voltou a brilhar.

 

E nesta noite

Com esta lua linda

Tua lembrança me faz chorar.

Ilustração: Filmelier.

Monday, February 17, 2025

O Vinho do Solitário de Charles Baudelaire

 


LE VIN DU SOLITAIRE
Charles Baudelaire

Le regard singulier d'une femme galante
Qui se glisse vers nous comme le rayon blanc
Que la lune onduleuse envoie au lac tremblant,
Quand elle y veut baigner sa beauté nonchalante;

Le dernier sac d'écus dans les doigts d'un joueur;
Un baiser libertin de la maigre Adeline;
Les sons d'une musique énervante et câline,
Semblable au cri lointain de l'humaine douleur,

Tout cela ne vaut pas, ô bouteille profonde,
Les baumes pénétrants que ta panse féconde
Garde au coeur altéré du poète pieux;

Tu lui verses l'espoir, la jeunesse et la vie,
- Et l'orgueil, ce trésor de toute gueuserie,
Qui nous rend triomphants et semblables aux Dieux!

O VINHO DO SOLITÁRIO

O olhar singular de uma mulher galante

Que desliza até nós como o raio branco

Que a lua ondulante envia ao trêmulo lago,

Quando ela quer banhar ali sua beleza indiferente;

 

O último saco de moedas nos dedos de um jogador;

Um beijo libertino da delgada Adeline;

Os sons de música enervante e cálida,

Semelhante ao grito de uma humana dor,

 

Tudo isso não vale a pena, ó garrafa profunda,

Os bálsamos penetrantes que teu ventre fecundo

Guarda o coração alterado do piedoso poeta;

 

Tu vertes a esperança, juventude e a vida,

- E o orgulho, este tesouro de toda mendicância,

Que nos faz triunfantes e semelhantes aos Deuses!

Ilustração: Edna Ramos.

Uma poesia de Aldrin Regina Valdez

 


ARS POETÍCA

Aldrin Regina Valdez

                                                you think I’m kind on the daily
                                                -and my healing
                                                always soft
                   you don’t see me 
                                                beat to the ground 
                                                the Forehead Man 
                                                & his Mouse-God friend-how 
                                                I bonked the lights out 
           from their faces til one 
                          had no teeth 
                     and the other-
                                                only a mouth 
                                                stuffed full of them-
           across this white field
                                                I use my own Pointy thing
                                                Stabbing-after all is always 
                                                Personal
     you see-they did not see 
                my Rage coming-
                                                said they wanted me
                                                to go Home-Go back
                                                their jaws cajoled- 
                                   Go back 
                                                to where you’re from-from
                                         & so 
                      they saw me Go
                                                & Go
                                                -with each blue 
                                                wide-eyed Stab-
                               and Stab-
                           into the bone 
                    & mush of them-
                                                Gone-Home-
                   Home to my Rage
                                                and they-such slabs 
                                                of meat-
                                                                       Stayed

ARS POÉTICA

você pensa que eu sou gentil

diariamente

                                                 - e minha cura

                                                 sempre suave

você não me vê

                                                 -batendo no chão

                                                 o Homem Testa

                                                 & seu amigo Deus-Rato-                              como                                        eu apaguei as luzes

de seus rostos até que um

não tivesse dentes

e o outro-

                                                somente uma boca

                                                cheia deles-

em redor deste campo branco

                                          eu uso minha própria pontuda coisa Pontuda

                                          Esfaqueamento- afinal é sempre

                                          Pessoal

você vê - eles não veem

minha Raiva chegando-

                                         dizem que queriam que eu

                                         fosse para Casa- Volte

                                         com suas mandíbulas bajuladoras-

Volte

para onde você é de-de

& então

eles me viram ir

                       & ir

                      -com cada azul

                      dos olhos arregalados Esfaquear-

            e Esfaquear-

         no osso

      e mingau deles-

                              Partiu- Casa-

Casa para minha Raiva

e eles-como pedaços

de carne-

Ficaram

Ilustração: Discogs. 

Desespero

 


Como um deus sem dons

num mundo de ateus

chorei impotente o meu desespero.

Mil lenços molhei,

criei oceanos, rios, tempestades, raios e trovões.

No maior silêncio

bradei por teu amor

e, no menor papel, foi o maior ator.

Quase acreditei não sentir mais dor,

porém, foi tudo em vão

porque tanto sofri que, de repente, me vi

a maldizer o tempo, os sentimentos,

o mundo e a ilusão,

mas, nada estancou

tanto amor             

sangrando lenta e cruelmente

do meu coração!

Ilustração: Devaneios Pessoais.

Saturday, February 15, 2025

Os poemas perfurados de Richard Armour

 


PUNCTURED POEMS

by Richard Armour

Summer is icumeen in;
Mix the tonic and the gin

***

Water, water, everywhere;
The plumbing badly needs repair.

***

To err is human, to forgive divine.
Some errors I forgive, though, quickly. . . . Mine..

***

Jenny kissed me when we met
Not oft such quick results I get.

***

I celebrate myself, and sing myself.
My picture’s there, my bust’s upon the shelf.

POEMAS PERFURADOS

O verão está chegando;

Misture a tônica e o gim

***

Água, água, por todo lugar;

O encanamento precisa urgentemente de reparos.

***

Errar é humano, perdoar é divino.

Alguns erros eu perdoo, porém, rapidamente. . . . Os meus..

***

Jenny me beijou quando nos conhecemos

Não costumo obter resultados tão rápidos.

***

Eu me celebro e canto para mim mesma.

Minha foto está lá, meu busto está na prateleira.

Ilustração: Myloview.

Friday, February 14, 2025

NOTIFICAÇÃO


Meu ex-marido,

Venho te notificar

 Que, apesar do bandido que sei que és,

Não sei como conseguiu me enganar.

Sou de coração mole, até me fez gostar,

E com todas as asneiras que fez,

Ainda há em mim

Um resto de carinho, sim.

Sei que andas mal das pernas

( a sorte para quem tanto apronta não é eterna),

Mas se aguente para não morrer antes de mim.

Sinceramente, 

lágrimas não combinam com rímel

E vou perder todo o dinheiro do cabelo,

pois bem sabes que não sou de chorar

sem me descabelar.

Olhe lá, seu malvado, o que faz,

garanto que se morreres não terás paz.

Diz minha guia espiritual 

que posso te fazer o maior mal

indo ao seu enterro chorar.

Chorar morto de outra-diz ela- dá o maior azar;

a alma do defunto nunca mais acha lugar!

(De "Poemas Malcomportados", Rio, Courier Brasil, 2021). 

O sempre instigante Charles Bukowski

 


CONSUMMATION OF GRIEF

Charles Bukowski

I even hear the mountains
the way they laugh
up and down their blue sides
and down in the water
the fish cry
and the water
is their tears.
I listen to the water
on nights I drink away
and the sadness becomes so great
I hear it in my clock
it becomes knobs upon my dresser
it becomes paper on the floor
it becomes a shoehorn
a laundry ticket
it becomes
cigarette smoke
climbing a chapel of dark vines. . .
it matters little
very little love is not so bad
or very little life
what counts
is waiting on walls
I was born for this
I was born to hustle roses down the avenues of the dead.

CONSUMAÇÃO DA DOR

Eu até ouço as montanhas

o modo como elas riem

 acima e abaixo em seus lados azuis

para baixo sob a água

os peixes choram

e a água

são suas lágrimas.

Eu escuto a água

nas noites em que eu bebo sempre

e a tristeza se torna tão grande

Eu a ouço no meu relógio

se tornar botões na minha cômoda

se tornar papel no chão

se torna uma calçadeira

um tíquete de lavanderia

se tornar

fumaça de cigarro

escalando uma capela de trepadeiras escuras. . .

importa pouco

muito pouco amor não é tão ruim

ou muito pouca vida

o que importa

está esperando nas paredes

Eu nasci para isto

Eu nasci para transportar rosas pelas avenidas dos mortos.

Ilustração: O Globo.

Outra poesia de Richard Armour

 


TOO HAVE AND TOO OLD

Richard Armour

The bride, white of hair, is stooped over her cane
Her faltering footsteps need guiding.
While down the church aisle, with wan toothless smile,
The groom in a wheelchair comes riding.
And who is this elderly couple you ask?
You’ll find, when you’ve closely explored it,

TER MUITO E SER MUITO VELHO

A noiva, cabelos brancos, está curvada sobre sua bengala

Seus vacilantes passos necessitam de direção.

Enquanto desce o corredor da igreja, com um sorriso desdentado e pálido,

O noivo na cadeira de rodas vem cavalgando.

E quem é esta dupla de idosos, você pergunta?

Você descobrirá, quando explorá-la de perto,

Ilustração: Uol.

Outra poesia de Paula Arbona

  


MI PROBLEMA

Paula Arbona

Quizás mi problema es
que no puedo ver un árbol.
Cuando veo un árbol,
veo un bosque.
Cuando veo una persona,
veo un pueblo.
Veo sus secretos,
su pasado,
su tormento.
Quizás mi problema es
que no puedo dejar de mirar
viendo aquello que no está.

MEU PROBLEMA

Talvez seja o meu problema

que não posso ver uma árvore.

quando vejo uma árvore,

vejo uma floresta.

Quando vejo uma pessoa,

vejo um povo.

Vejo seus segredos,

seu passado,

seu tormento.

Talvez seja o meu problema

que não posso deixar de olhar

vendo aquilo não está.

Ilustração: Ótica Mori.

Tuesday, February 11, 2025

Quase um soneto de amor

 


Este meu desejo louco de realizar

Sempre o que é mais irrealizável
É que me leva a amar o improvável
E sempre mais querer, mais desejar.

Não tenho formas nas asas do querer
E ora sou um tigre majestoso
Ou o velho leão muito manhoso
E até mesmo um pavão posso ser. 

O que me importa mais é descobrir
Maneiras novas do velho sentir,
Me renovar numa nova sensação.

Sou o hábito de amar reabilitado
Que procura despertar no ser amado
O melhor de toda vida, a ilusão.

 


Uma poesia de Paula Arbona

 


LO RARO ES VIVIR

Paula Arbona

Lo normal es agrietarse
como catedrales
que no se han movido,
que sólo han visto
su reflejo en los charcos.
Lo normal es
partirse los labios
por la falta de amor,
por la falta de agua
de un amor vacío.
Lo normal es morir,
vivir en una constante
putrefacción.
Mi corazón
no puede morir,
sangra
pero no se agrieta,
asoma la cabeza
en la lluvia.
Mi corazón
es la cosa rara.

O RARO É VIVER

É normal rachar

como as catedrais

que não se moveram,

que eles só viram

seu reflexo nas poças.

O normal é

partir os lábios

por falta de amor,

por falta de água

de um amor vazio.

O normal é morrer,

viver em uma constante

putrefação.

Meu coração

não pode morrer,

sangra

porém não se racha,

põe a cabeça para fora

na chuva.

Meu coração

é uma coisa rara.

Ilustração: Eu Rio.

Monday, February 10, 2025

Um poema de Richard Armour

 


MONEY

Richard Armour

Workers earn it.
Spendthrifts burn it.
Bankers lend it.
Women spend it.
Forgers fake it.
Taxes take it.
Dying leave it.
Heirs receive it.
Thrifty save it.
Misers crave it.
Robbers seize it.
Rich increase it.
Gamblers lose it.
I could use it.

DINHEIRO

Os trabalhadores o ganham.

Os perdulários o queimam.

Os banqueiros o emprestam.

As mulheres o gastam.

Os falsificadores o falsificam.

Os impostos o levam.

Ao morrer se deixa.

Os herdeiros o recebem.

Os poupadores o poupam.

Os miseráveis o anseiam.

Os ladrões o perseguem.

Os ricos o aumentam.

Os jogadores o perdem.

Eu poderia usá-lo.

Ilustração: Portal Contábeis.

A bela tenebrosa de Charles Baudelaire

 


REMORD POSTHUME

Charles Baudelaire

Lorsque tu dormiras, ma belle ténébreuse,
Au fond d’un monument construit en marbre noir,
Et lorsque tu n’auras pour alcôve et manoir
Qu’un caveau pluvieux et qu’une fosse creuse;

Quand la pierre, opprimant ta poitrine peureuse
Et tes flancs qu’assouplit un charmant nonchaloir,
Empêchera ton coeur de battre et de vouloir,
Et tes pieds de courir leur course aventureuse,

Le tombeau, confident de mon rêve infini
(Car le tombeau toujours comprendra le poète),
Durant ces grandes nuits d’où le somme est banni,

Te dira: “Que vous sert, courtisane imparfaite,
De n’avoir pas connu ce que pleurent les morts?”
- Et le ver rongera ta peau comme un remords.

REMORSO PÓSTUMO

Quando tu dormires, minha bela tenebrosa,

No fundo de um monumento construído em mármore negro,

E quando tu não terás mais alcova e mansão

Do que uma abóbada chuvosa e um poço oco;

 

Quando a pedra, oprimindo teu peito temeroso

E teus flancos suavizados por uma encantadora indiferença,

Impedir teu coração de bater e querer,

E teus pés de correrem seu curso aventuroso,

 

O túmulo, confidente do meu sonho infinito

(Pois o túmulo sempre entenderá o poeta),

Durante as grandes noites das quais o sono é banido,

 

Dir-te-á: “De que te serve, cortesã imperfeita,

“Não teres conhecido o que choram os mortos?”

-E o verme roerá sua pele como remorso.

 

Sunday, February 09, 2025

Um poema memorial de Cristina Peri Rossi

 


LA MEMORIA ES UNA FORMA DEL AMOR

Cristina Peri Rossi

La memoria es una forma del amor.
Te recuerdo
y me dueles
como el dolor del miembro ausente.
Aquel que ya no está
no puedo tocar
ni acariciar
pero insiste en vibrar en estremecer mis fibras interiores.
Entonces te vuelvo a amar
te conviertes en fantasma
y te sueño todavía
y en el sueño te beso y acaricio
y tú sonríes, completa por fin.

A MEMÓRIA É UMA FORMA DE AMOR

A memória é uma forma de amor.

Te recordo

e me dói

como a dor de um membro ausente.

Aquele que já não está

que não posso tocar

nem acariciar,

porém insiste em vibrar estremecer minhas fibras interiores.

Então volto a te amar

te convertes num fantasma

e te sonho, todavia

e no sonho te beijo e acaricio

e tu sorris, completa por fim.

Ilustração: Terra.

William Blake presente

 


THE SICK ROSE
William Blake
O rose, thou art sick!
The invisible worm
That flies in the night,
In the howling storm,

Has found out thy bed
Of crimson joy,
And his dark secret love
Does thy life destroy.

A ROSA DOENTE

A rosa está doente

de um verme invisível

que voa na noite

no rugir da tormenta,

 

Ela foi encontrada em seu leito

de alegre carmesin

e seu escuro e secreto amor

destrói sua vida.

Ilustração: Este Lugar.

Eis Paul Celan

 


PSALM
Paul Celan
Niemand knetet uns wieder aus Erde aund Lehm,
niemand bespricht unsern Staub.
Niemand.

Gelobt seist du, Niemand.
Dir zulieb wollen
wir blühn.
Dir
entgegen.


Ein Nichts
waren wir, sind wir, werden
wir bleiben, blühend:
die Nichts-, die
Niemandrose.

Mit
dem Griffel seelenhell,
dem Staubfaden himmelswüst,
der Krone rot
vom Purpurwort, das wir sangen
über, o über
dem Dorn.

SALMO

Ninguém nos moldará da terra e do barro,

ninguém sopra nosso pó.

Ninguém.

 

Louvado sejas tu, Ninguém.

Por ti nós florescemos.

Em contraste

contigo.

 

Um Nada

nós éramos, somos agora, e sempre

seremos, florescendo:

o Nada-, a

Rosa do nada.

 

Com

nosso pistilo alma-brilhante,

nosso estame céu-deserto,

nossa coroa vermelha

da palavra púrpura que cantamos

sobre ó sobre

o espinho.

Ilustração: Caeju.