Saturday, April 26, 2014

Noturno


E se seu beijo, peço a toda hora,
como viajante sedento no deserto,
por quê, então, amor você demora?

Se só seu beijo me mantém desperto.
Você não vê que meu coração chora
se do meu amor não se encontra perto?

E se vê, amor, porque ainda insiste
em me deixar tristonho nessa espera
quando minha vida só por você existe.

Vem! Tê-la nesta noite quem me dera,
pois, esperar mais meu peito não resiste
e o tempo perdido não se recupera. 


(Do livro "Viagem aos Sonhos de Ninguém"). 

Significado


A emoção pretendo,
com todas as forças
que um desesperado pode ter....
A emoção...
De uma maneira forte, definitiva,
qual um corpo que cai.
Uma lâmina que, de repente,
rasga  o buraco
por onde a vida se esvai...
A emoção alcanço.
E, feito o amor,
não significa senão um momento.
Que, logo, então, se desfaz
de vez que a vida é mero vento,
leve tremor,
nada mais.


Ilustração: animais.umcomo.com.br 

(Do livro "Viagem aos Sonhos de Ninguém") 

Prazer


Exponho apenas os meus sonhos
Que, minhas feridas, se guardam em mim nas cicatrizes.
E, se doem, quando faz frio,
rio da minha dor,
que dor maior é a angústia de viver;
de saber que, entre um silêncio e outro,
posso falar todas as palavras,
amar todos os amores,
sonhar todos os sonhos
e não ter medo de dizer sim
ao gosto amargo do prazer,
que é o gozo dos sentidos,
deste estranho animal chamado homem. 

(Do livro "Viagem aos Sonhos de Ninguém"). 

Friday, April 25, 2014

Recibo


Há um mundo novo de possíveis
No impossível encanto
Com que me prendes
Na malha da tua beleza.

Sei que meu corpo voa livre,
Mas, minha alma vive eternamente presa
No doce arsenal de tuas armadilhas de carinhos
E jamais um prisioneiro gostou tanto da prisão
E canto feliz como os mansos passarinhos
Que vivem a comer nas tuas mãos.

(Do livro "Águas Passadas", Editora Per Se, 2013). 

Ilustração: msgdeluz.blogspot.com

O meu amor


É melhor deixar
Que o tempo explique tudo.

De nada adiantam as palavras
Sem teus braços, sem teu corpo, sem tua língua
Que é, inexplicavelmente, doce.

A flor do bem e do mal
Pode ter o mesmo nome
E só a explosão do prazer
Justificaria o palavrão
Com que pretendo te agraciar.

Ainda que ferir seja a maior forma de amar.
(De "Àguas Passadas", Editora Per Se, 2013). 

Ápice



Quando me vi com a vida perfeita;
Tudo nos eixos, sem problema algum,
Emitiram o atestado de óbito.

(De Águas Passadas, Editora Per Se, 2013)

Ilustração: ultradownloads.com.br

Gabriel Celaya

CUÉNTAME CÓMO VIVES                                                         
    (CÓMO VAS MURIENDO)

Gabriel Celaya

Cuéntame cómo vives;
dime sencillamente cómo pasan tus días,
tus lentísimos odios, tus pólvoras alegres
y las confusas olas que te llevan perdido
en la cambiante espuma de un blancor imprevisto.

Cuéntame cómo vives.
Ven a mí, cara a cara;
dime tus mentiras (las mías son peores),
tus resentimientos (yo también los padezco),
y ese estúpido orgullo (puedo comprenderte).

Cuéntame cómo mueres.
Nada tuyo es secreto:
la náusea del vacío (o el placer, es lo mismo);
la locura imprevista de algún instante vivo;
la esperanza que ahonda tercamente el vacío.

Cuéntame cómo mueres,
cómo renuncias —sabio—,
cómo —frívolo— brillas de puro fugitivo,
cómo acabas en nada
y me enseñas, es claro, a quedarme tranquilo.


Conta-me como vives
     (Como vais morrendo)

Conta-me como vives;
Diz-me sensivelmente como passam os teus dias,
teus lentíssimos ódios, tuas explosões de alegrias
e as confusas ondas confusas que te levam perdida
na cambiante espuma de uma brancura imprevista.

Conta-me como vives.
Vem a mim, face a face;
diz-me tuas mentiras (as minhas são piores)
teus ressentimentos (eu também os padeço)
e este orgulho estúpido (posso compreender).

Conta-me como morres.
Nada teu é segredo:
a náusea do vazio (ou o prazer, é o mesmo);
a loucura imprevista de algum instante vivo;
a esperança que investiga teimosamente o vazio.

Conta-me como morres,
como renúncias-sábio,
como-frívolo-brilhas como puro fugitivo
como acabas em nada
e me ensinas, é claro, a ficar tranquilo.

Ilustração: foro.latabernadelpuerto.com

Thursday, April 24, 2014

Avalanche


Troco as pernas bambas pelo céu estreito
Aperto teus seios contra o meu peito
Sem entender como estou aqui.
Vago na inconsciência de minha loucura
Amo a beleza da carne tão dura
Que se perfuma encostada em ti.
Sonho cada momento que passamos juntos
Entre desejos vou trocando assuntos
Do mundo inteiro o meu riso ri.
Apago todos os tempos que por mim passaram
Antes dos teus braços que me enlaçaram
Não havia um mundo para descobrir.
Acendo todas as luzes azuis do desejo
Meu bem, já morro no último beijo,
Não fale, agora, que já vai partir.

Ilustração: vivaascoisasdoamor.blogspot.com
(De "Apocalypse", reedição 2013, Editora Per Se)



Imagem


Imagem

Imagem –
Eis o deus da falta de substância.
Procuro o sumo da realidade
Por detrás de signos
Que escondem a fome multiplicada
de milhões.

Imagem de televisão:
Do diplomata,
Que impecavelmente garante,
Por si e por seu passado,
Que todos estão errados
(Só ele não)
Que não houve o que houve.

Quedo-me atônito diante da versão
E os fatos que explodem no meu rosto
São fragmentos de uma manchete
que não é impressa
E eu, perante tantos eus despersonalizados,
Também tenho medo de fragmentar-me
De também despertar
um dia
apenas uma imagem
.

Ilustração: Ilustração: www.prtemistocles.com.br
(Do livro "Apocalypse", reedição do original de 1982 em 2013 pela Editora Per Se). 


Sei que não podes entender...



Tu não podes me entender
(embora saibas que, em mim, existe este
                                                    grande querer )
porque te tenho
não como uma ideia do que o amor deve ser ,
mas, como o amor é no meu pensamento :
certeza, concretude e fé.
Pintastes as paredes do meu coração
com as tintas do sonho
e, caminho, mesmo sem ti,
com as cores se espalhando por meu sangue
e assim, pingando internamente,
o meu amor de ti a falta nunca sente
e só espera o momento de te ver
quando o inverno há de acabar
E a primavera florescer.


Ilustração: http://paintingandframe.com/prints/andy_warhol_human_heart_c_1979_red_with_veins-19529.html

Roque Dalton de novo


EL DESCANSO DEL GUERRERO


 Roque Dalton

Los muertos están cada día más indóciles.

Antes era fácil con ellos:
les dábamos un cuello duro una flor
loábamos sus nombres en una larga lista:
que los recintos de la patria
que las sombras notables
que el mármol monstruoso.

El cadáver firmaba en pos de la memoria:
iba de nuevo a filas
y marchaba al compás de nuestra vieja música.

Pero qué va
los muertos
son otros desde entonces.

Hoy se ponen irónicos
preguntan.

Me parece que caen en la cuenta
de ser cada vez más la mayoría.


O descanso do guerreiro

Os mortos estão cada vez mais indóceis.

Antes era fácil tratá-los:
lhes dávamos, para o pescoço duro, uma flor
elogiavámos seus nomes numa larga lista:
que os recintos do pátria
que as sombras notáveis
que o mármore monstruoso.

O cadáver se alistava pós memória:
ia de novo para a fila
e marchava ao compasso da nossa velha música.

Porém, o que fazer
se os mortos
são outros,  desde então.

Hoje se põem irônicos
perguntam.

Me parece que eles perceberam
Que são, cada vez mais, a maioria

Ilustração: professoralucygandra.wordpress.com

Só vivemos na vida de ilusões...


Cançãozinha do amor e da ilusão

Nós já fizemos amor tantas vezes...
E cada vez que fazemos amor
É como recomeçar.

Já te convidei para dançar
E você sempre me diz não.
Aceito.            
É o jeito:
Melhor pensar que é ilusão
Que dance
Como nos sonhos em que dançamos
Embebidos, bem bebidos
De vida e de paixão.


Ilustração: www.esquinamusical.com.br

De volta Roque Dalton




    LOS LOCOS

Roque Dalton


A los locos no nos quedan bien los nombres.

    Los demás seres
llevan sus nombres como vestidos nuevos,
los balbucean al fundar amigos,
los hacen imprimir en tarjetitas blancas
que luego van de mano en mano
con la alegría de las cosas simples.

    Y qué alegría muestran los Alfredos, los Antonios,
los pobres Juanes y los taciturnos Sergios,
los Alejandros con olor a mar!

    Todos extienden, desde la misma garganta con que cantan
sus nombres envidiables como banderas bélicas,
tus nombres que se quedan en la tierra sonando
aunque ellos con sus huesos se vayan a la sombra.

    Pero los locos, ay señor, los locos
que de tanto olvidar nos asfixiamos,
los pobres locos que hasta la risa confundimos
y a quienes la alegría se nos llena de lágrimas,
cómo vamos a andar con los nombres a rastras,
cuidándolos,
puliéndolos como mínimos animales de plata,
viendo con estos ojos que ni el sueño somete
que no se pierdan entre el polvo que nos halaga y odia?

    Los locos no podemos anhelar que nos nombren
pero también lo olvidaremos…

Os loucos

Aos loucos não nos ficam bem os nomes.

    Outros seres
levam seus nomes como vestidos novos ,
os balbuciam ao adquirir amigos,
os fazem imprimir em pequenos cartões brancos
que logo vão de mãos em mãos
com a alegria das coisas simples .

    E que alegria mostram os Alfredos, os Antonios ,
os pobres  Joãos, os taciturnos Sergios,
os Alexandres  com cheiro do mar !

    Todos se estendem, desd’a mesma garganta com que cantam
Seus nomes invejáveis ​​como bandeiras militares,
teus nomes que se quedam na terra sonhando
ainda que eles com seus ossos se vão para a sombra.

    Porém, nós, os loucos, aí senhor, os loucos
que de tanto esquecer nos sufocamos,
pobres loucos que até o riso confundimos
e a quem a alegria nos enche de lágrimas
como podemos sair por aí com os nomes arrastando ,
cuidando deles ,
polindo-os como mínimos animais de prata
vendo-os com estes olhos que nem o sonho impede
que não se percam na poeira que nos ama e odeia?

   Os loucos que não podem desejar que os nomeiem,
porém, também não os esqueceremos ...


Ilustração: http://www.imagick.com.br/?p=12780

Monday, April 14, 2014

Duas poesias de Ángel Gonzalez


ÚLTIMA GRACIA
Ángel Gonzalez

Acaso
ese golpe final
—yo ya caído—
no fue otro acto de crueldad,
sino una prueba
de la piedad que decían no tenerme

Última graça
Por acaso
Este golpe final
-que me pegou caído-
Não foi outro ato de crueldade,
sim uma prova
da piedade que diziam não ter comigo.


QUÉDATE QUIETO

Ángel Gonzalez

Deja para mañana
lo que podrías haber hecho hoy
(y comenzaste ayer sin saber cómo).

Y que mañana sea mañana siempre;

que la pereza deje inacabado
lo destinado a ser perecedero;
que no intervenga el tiempo,
que no tenga materia en que ensañarse.

Evita que mañana te deshaga
todo lo que tú mismo
pudiste no haber hecho ayer.
 
Fica quieto

Deixa para amanhã
o que não poderias ter feito hoje
(e começastes ontem sem saber como).

E que amanhã seja amanhã sempre;

que a preguiça deixe inacabado
o destinado a ser perecível;
que não intervenha o tempo,
que não tenha material para ensinar.  

Evita que a manhã te desfaça  
tudo que tu mesmo
poderias não ter feito ontem.

Saturday, April 12, 2014

Desfazendo

                                                                                 
Que tudo acontece por alguma razão
Acreditei sem razão nenhuma-
Isto me pareceu lógico.

No entanto também é tão racional
Que o acaso me pareceu irreal
E toda mágica inexistente,
Por isto, mesmo tão inconsistente.

Nada pode ser tão pré-determinado
Me lembra Heisenberg
E, como tudo é relativo,
O destino é uma variável
Cheia de incógnitas.

Não há razão para coisa alguma.

(Do livro "Águas Passadas", Editora Per Se, 2013)
Ilustração: pt-br.naruto.wikia.com

Matthew Rohrer


Credo

  by Matthew Rohrer

I believe there is something else
entirely going on but no single
person can ever know it,
so we fall in love.

It could also be true that what we use
everyday to open cans was something
much nobler, that we'll never recognize.

I believe the woman sleeping beside me
doesn't care about what's going on
outside, and her body is warm
with trust
which is a great beginning.
 
Credo

Eu acredito que há algo mais
inteiramente acontecendo, porém, nenhuma
pessoa pode nunca saber,
por que nos apaixonamos.

Também poderia ser verdade que o que usamos
todos os dias para abrir latas era algo
muito mais nobre, que nunca será reconhecido.

Eu acredito que a mulher que dorme ao meu lado
não se importa com o que está acontecendo
lá fora, e seu corpo é quente
o que me dá confiança
que é um grande começo.


Ilustração: www.notasversejadas.com






Friday, April 11, 2014

Joana de Ibarbourou


    Te doy mi alma desnuda
       
      Joana de Ibarbourou
       
      Te doy mi alma desnuda,
      Como estatua a la cual ningún cendal escuda.
      Desnuda con el puro impudor
      De un fruto, de una estrella o una flor;
      De todas esas cosas que tienen la infinita
      Serenidad de Eva antes de ser maldita.
      De todas esas cosas,
      Frutos, astros y rosas,
      Que no sienten vergüenza del sexo sin celajes
      Y a quienes nadie osara fabricarles ropajes.
      Sin velos, como el cuerpo de una diosa serena
      ¡Que tuviera una intensa blancura de azucena!
      Desnuda, y toda abierta de par en par
      ¡Por el ansia del amar!
Te dou a minha alma nua

Te dou a minha alma nua,
Como uma estátua
a qual nenhum manto encobre.
Nu
a com o puro impudor De um fruto, de uma estrela ou uma flor;
De todas essas coisas que
tem a infinita
Sereni
dade de Eva antes de ser maldita.

De todas es
tas coisas,
Frutos, estrelas e rosas,
Eles não
sentem vergonha do sexo sem nuvens
E
a quem ninguém se atreve a fabricar roupas.
Sem véus, como o corpo de uma deusa serena Que tivesse uma intensa brancura de açucenas!

Nu
a, e toda aberta de par em par
Na ânsia de amar!








Thursday, April 10, 2014

Gustavo Adolfo Bécquer de volta



RIMA XXX

Gustavo Adolfo Bécquer

Asomaba a sus ojos una lágrima
y a mi labio una frase de perdón;
habló el orgullo y se enjugó su llanto,
y la frase en mis labios expiró.

Yo voy por un camino; ella, por otro;
pero, al pensar en nuestro mutuo amor,
yo digo aún: —¿Por qué callé aquel día?
Y ella dirá: —¿Por qué no lloré yo?


Rima XXX

Assomava em seus olhos uma lágrima
E nos meus lábios uma frase de perdão;
falou o orgulho e se enxugou o pranto,
e a frase em meus lábios expirou.

Eu fui por um caminho; ela, por outro;
porém, ao pensar em nosso amor mútuo,
eu digo ainda: - Por que me calei naquele dia?
E ela dirá: - Por que não chorei eu?