Sunday, June 29, 2025

A Glória

 



Seja forte!

A vida é o desenrolar da morte.

Viver é morrer cada segundo,

sem sentir,

se iludindo com o prazer do mundo,

enquanto a existência se esvai

em cada batida do relógio.

Melhor esquecer esta parte

E buscar na arte,

em comer bem, beber melhor, amar

e viver o presente,

consciente ou não,

a ilusão

de que cada minuto que se conquista

representa uma vitória.

Viver, enquanto se pode,

é a verdadeira glória!

Um trecho de Séguidille de Paul Verlaine

 


SÉGUIDILLE

Paul Verlaine

Ah, ton corps, qu'il repose
Sur mon âme morose
Et l'étouffé s'il peut.
Si ton caprice veut,
Encore, encore, encore!

SEGUIDILHA

Ah, teu corpo, que repousa

Sobre minha alma morosa

E que a sufoca se pode,

Se teu capricho exigir,

Outra vez, outra vez, outra vez!

Ilustração: Instagram.


Uma poesia de Yehuda Amichi

 


THE BODY IS THE CAUSE OF LOVE
Yehuda Amichi

The body is the cause of love;
after that, the fortress that protects it;
after that, love's prision.
But when the body dies, love is set free
in wild abundance,
like a slot machine that breaks down
and with a furious ringing pours out all at once
all the coins of
all the generations of luck.

O CORPO É A CAUSA DO AMOR

O corpo é a causa do amor;

além de ser, a causa e a fortaleza que o protege,

além de ser, a sua prisão.

Porém, quando o corpo morre, o amor fica livre

em selvagem abundância

como se fosse uma máquina caça-níqueis que quebra

e com um toque furioso despeja de uma só vez

todas as moedas de

todas as gerações de sorte.

Ilustração: Purepeople.


Saturday, June 28, 2025

Gustava Yuste de volta

 


CREYNTE

Gustavo Yuste 

En medio de la noche,
literalmente en el vértice
que separa a la oscuridad
de la madrugada,
tu imagen se presenta
como una diosa pagana
a la que ya no puedo rezarle
ni pedirle.
Lo que se adora
nunca responde,
¿no es esa la gracia
de todo esto?

O CRENTE

No meio da noite

literalmente no vértice

que separa a escuridão

na madrugada,

tua imagem se apresenta

como uma deusa pagã

para a qual não se pode rezar

nem pedir.

O que se adora

nunca responde,

não é esta a graça

de tudo isto?

Ilustração: Bandcamp.

Louise Glück, pois

 


19.

Louise Glück

The room was quiet.
That is, the room was quiet, but the lovers were breathing.

In the same way, the night was dark.
It was dark, but the stars shone.

The man in bed was one of several men
to whom I gave my heart. The gift of the self,
that is without limit.
Without limit, though it recurs.

The room was quiet. It was an absolute,
like the black night.

19.

O quarto estava quieto.

Quer dizer, o quarto estava quieto, porém os amantes

respiravam.

Do mesmo modo, a noite estava escura.
Era escura, porém as estrelas brilhavam.

O homem no leito era um dos muitos homens

aos quais entreguei meu coração. O presente do próprio ser
que não tem limites.
Sem limites embora se repita.

O quarto estava quieto. Absoluto
como a negra noite.

Ilustração: Aminos Apps.

Friday, June 27, 2025

Os Monstros Não Me Assustam Quando Durmo

 


Ignoro os monstros que aparecem

quando durmo.

Não importa que sejam assustadores, fantásticos, 

medonhos.

Os monstros não impedem os meus sonhos. 

E por mais horripilantes que eles sejam

se desfazem nas luzes que não desejam.

Nada podem, quando durmo, contra mim. 

E não poderão fazer nada mais

quando eu dormir para sempre, enfim. 

Monday, June 23, 2025

Desencaminhado


Em certo momento 

eu estava tão desencontrado

de mim mesmo

que já era outro.

Aliás um personagem

que nada tinha de mim, 

exceto uma lembrança 

que havia sido esquecida 

em algum lugar do passado.

Neste ponto

houve uma inflexão

que me transformou no que sou:  

um terceiro, que nunca entendeu

quando era a hora,

não sabe como chegou aqui 

ou se vai embora.

Ilustração: olugar.org. 

Uma poesia de Luculle Clifton

 


ONE YEAR LATER

Lucille Clifton

what if,
then,
entering my room,
brushing against the shadows,
lapping them into rust,
her soft paw extended,
she had called me out?
what if,
then,
i had reared up baying,
and followed her off
into vixen country?
what then of the moon,
the room, the bed, the poetry
of regret?

UM ANO DEPOIS

E se,

então,

entrando no meu quarto,

roçando contra as sombras,

transformando-as em ferrugem,

com sua pata macia estendida,

ela tivesse me chamado?

E se,

então,

eu tivesse me erguido latindo,

e a tivesse seguido

para o país das raposas?

E quanto à lua,

ao quarto, à cama, à poesia

do arrependimento?

Ilustração: Semente Educação.

 

Sunday, June 15, 2025

E Não Sei Onde Você Está


Vi de novo a nossa casa: 

as ruínas que restaram dela. 

Escancarada a janela

onde tantas vezes olhavas

o azul do céu e do mar. 

Não tive como não chorar...

Era o retrato do abandono. 

Nada restou do pomar

invadido de chananas.

povoado de ervas daninhas.

Sem rosas e sem o aroma de jasmin. 

O golpe foi demais para mim.  

Ilustração: Plantas Medicinais. 

 

O Beijo Profundo de Miguel Hernández

 


LHEGÓ TAN HONDO EL BESO

Miguel Hernández

Llegó tan hondo el beso
Que traspasó y emocionó los muertos.
El beso trajo un brío
Que arrebató la boca de los vivos.
El hondo beso grande
Sintió breve los labios al ahondarse.
El beso aquel que quiso
Cavar los muertos y sembrar los vivos.

O BEIJO FOI TÃO PROFUNDO

O beijo foi tão profundo

Que trespassou e emocionou os mortos.

O beijo trouxe um orgulho

Que arrebatou a boca dos vivos.

O grande beijo foi tão profundo

Sentindo breve os lábios aprofundar-se.

O beijo aquele que quis

Desenterre os mortos e semear os vivos.

Ilustração: Terra Você.

Saturday, June 14, 2025

Uma poesia de Fatima Malik

 


CRITIQUE OF MY THIGHS

Fatima Malik

-after Lucille Clifton

on the platform i pray
i don’t have to wait too long
for the next train-my girth
too loud, disruptive
for this crowd,
in the elevator i make myself
small, recall Nani’s final days
how my aunt
dressed her after a shower
that memory her skin on bones
follows me everywhere
how she was only slightly there,
but for those family heirloom hips
those dominant gene thighs
i wish i was proud of this pear
that follows me everywhere
of what abundance
adorns this temple
and wrote for it an homage
and not a lament

CRÍTICA DAS MINHAS COXAS

-depois de Lucille Clifton

Na plataforma eu rezo

para não ter que esperar muito

pelo próximo trem- meu contorno

muito alto, perturbador

para essa multidão,

no elevador eu me faço

pequena, lembro dos últimos dias da Nani

como minha tia

a vestia depois do banho

aquela lembrança, sua pele sobre os ossos

me segue por toda parte

como ela estava somente ligeiramente lá,

exceto por aqueles quadris de herança de família

aquelas coxas de gene dominante

eu queria ter orgulho desta pera

que me segue por toda parte

de quanta abundância

adorna este templo

e escrever para ela uma homenagem

e não um lamento

Ilustração: Terra.

Uma poesia de Juan Antonio Pérez Bonalde

 

 


TIENEN RAZÓN

Juan Antonio Pérez Bonalde

¡Tienen razón! ¡Se equivocó mi mano
Cuando guiada por noble patriotismo,
Tu infamia título de despotismo,
Verdugo del honor venezolano!

¡Tienen razón! ¡Tú no eres Diocleciano,
Ni Sila, ni Nerón, ni Rosas mismo!
¡Tú llevas la vileza al fanatismo...
Tú eres muy bajo para ser tirano!

"Oprimir a mi patria": esa es tu gloria,
"Egoísmo y codicia": ese es tu lema
"Vergüenza y deshonor": esa es tu historia;

Por eso, aún en su infortunio recio,
Ya el pueblo no te lanza su anatema...
¡Él te escupe a la cara su desprecio!

TEM RAZÃO

Tem razão! Se equivocou minha mão

Quando guiada pelo nobre patriotismo,

Tua infâmia título de despotismo,

Carrasco da honra venezuelana!

 

Tem razão! Tu não és Diocleciano,

Nem Sila, nem Nero, nem o próprio Rosas!

Tu levas a vileza ao fanatismo...

Tu és muito baixo para ser tirano!

 

"Oprimir a minha pátria": essa é a tua glória,

“Egoísmo e ganância”: esse é o teu lema

 “Vergonha e desonra”: essa é a tua história;

 

Por isso, ainda em seu infortúnio receio

Já o povo não te lança seu anátema...

Ele cospe na sua cara seu desprezo!

Ilustração: Genius.

Wednesday, June 11, 2025

Lembrancinha

 


Nem quero pensar
Em tanto amor que tive.
Nos tempos felizes
Que vivi nos teus braços.
Hoje sinto que os espaços
E o tempo são miúdos, pequenos
E a ternura e os desejos mais amenos.
Que já não existe
A febre, a procura, a pressa, a loucura
Do tempo em que
Respirar
era viver!

Ilustração: Viva Decora. 

Uma poesia de Geoffrey Brock

 


EXERCITIA SPIRITUALIA

Geoffrey Brock

We met, like lovers in movies, on a quay
Beside the Seine. I was reading Foucault
And feeling smart. She called him an assault
On sense, and smiled. She was from Paraguay,
Was reading Saint Ignatius. Naivete
Aroused her, so she guided me to Chartres
And Sacre Coeur, to obscure theatres
For passion plays - she was my exegete.
In Rome (for Paris hadn't been enough)
We took a room, made love on the worn parquet,
Then strolled to Sant'Ignazio. Strange duet:
Pilgrim and pagan, gazing, as though through
That ceiling's flatness, toward some epitome
Of hoped-for depth.
I swore I saw a dome.
EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS
Nos encontramos, como amantes nos filmes, num cais
junto ao Sena. Eu estava lendo Foucalt
e me sentindo inteligente. Ela chamou-me de assalto
ao sentido e sorriu. Ela era do Paraguai,
estava lendo Santo Inácio. A ingenuidade
a animou. Por isso me guiou a Chartres
y al Sacre Coeur, à escuros teatros
para peças de paixão. Ela foi minha exegeta.
Em Roma (porque Paris não havia sido suficiente)
Nós alugamos um quarto e amamos sobre o piso

velho.
Depois caminhamos correndo a Santo Inácio. Estranho dueto:
a peregrina e o pagão, olhando, como se através
da suavidade do teto, até algum epitome
da sonhada profundidade. Eu juro que eu vi uma cúpula.

Ilustração: Sortiraparis.com.

É Miguel Hernández

 


CANCION ÚLTIMA

Miguel Hernández

Pintada, no vacía:
Pintada está mi casa
Del color de las grandes
Pasiones y desgracias.
Regresará del llanto
Adonde fue llevada
Con su desierta mesa,
Con su ruinosa cama.
Florecerán los besos
Sobre las almohadas.
Y en torno de los cuerpos
Elevará la sábana
Su intensa enredadera
Nocturna, perfumada.
El odio se amortigua
Detrás de la ventana.
Será la garra suave.
Dejadme la esperanza.

ÚLTIMA CANÇÃO

Pintada, não vazia:

Pintada está minha casa

Da cor das grandes

Paixões e desgraças.

Regressará do pranto

Onde foi levada

Com sua mesa deserta,

Com sua arruinada cama.

Beijos florescerão

Sobre os travesseiros.

E em torno dos corpos

Se levantará a folha

Sua trepadeira intensa

Noturna, perfumada.

O ódio se atenuará

Atrás da janela.

Será a garra suave.

Deixa-me a esperança.

Ilustração: Viomundo.

Tuesday, June 10, 2025

Outra poesia de Inés Montes

 


LA PLAYA

Inés Montes

La luz del verano se derrama
sobre la realidad de las cosas.
Es tan nítida que puedes leer
en la boca de las piedras
sus palabras.
El mar incesante recibe los cuerpos
de unos bañistas que no dejan de celebrarlo.
Los observo sentada en la arena de la playa.
Mis ojos se detienen en una niña
frágil y oscura
que juega en la orilla
y pienso en ese instante
puro y eterno
en el que todos fuimos
incondicionalmente felices
como hoy lo es ella,
ignorante de las sombras
que poblarán su vida.
También yo fui como ella,
con esa avaricia por la alegría,
cuando todo era una ráfaga
de misterios por descubrir
y cada día guardaba en su interior
un nuevo prodigio.
Mantuve dentro de mí la luz
que emana ahora de ella
una luz que ya no reconozco
y que desde el olvido me ciega.

A PRAIA

A luz do verão se derrama

sobre a realidade das coisas.

É tão nítida que podes ler

na boca das pedras

as suas palavras.

O mar incessante recebe os corpos

dos banhistas que não deixam de celebrá-lo.

Observo-os sentados na areia da praia.

Meus olhos se detêm numa menina

frágil e sombria

a brincar na praia

e penso nesse momento

puro e eterno

que todos fomos

incondicionalmente felizes

como ela é hoje,

ignorando as sombras

que povoarão a sua vida.

Eu também fui como ela,

com essa avidez de alegria,

quando tudo era um turbilhão

de mistérios a descobrir

e cada dia guardava em seu interior

uma nova maravilha.

Mantive dentro de mim a luz

que agora emana dela

uma luz que já não reconheço

e que do esquecimento me cega.

Ilustração: Myloview.

Outra poesia de Deborah Hauser

 

 

 

THE WEIGHT OF ABSENCE

Deborah Hauser

A slender branch extends

An invitation to alight

 

A weightless bird descends

Trilling her evening song

 

Silently she lifts away

Leaving the branch to sway

 

Under blooming emptines

 

               O PESO DA AUSÊNCIA

              Um galho fino se estende

              Um convite para pousar

 

             Um pássaro delgado desce

             Cantando sua canção noturna

 

            Silenciosamente ela se afasta

            Deixando o galho balançar

 

            Sob o vazio brilhante

            Ilustração: Verena Smit.

 


Monday, June 09, 2025

Miguel Hernández sim


 

EL AMOR ASCENDIA

Miguel Hernández

El amor ascendía entre nosotros
Como la luna entre las dos palmeras
Que nunca se abrazaron.
El íntimo rumor de los dos cuerpos
Hacia el arrullo un oleaje trajo,
Pero la ronca voz fue atenazada.
Fueron pétreos los labios.
El ansia de ceñir movió la carne,
Esclareció los huesos inflamados,
Pero los brazos al querer tenderse
Murieron en los brazos.
Pasó el amor, la luna, entre nosotros
Y devoró los cuerpos solitarios.
Y somos dos fantasmas que se buscan
Y se encuentran lejanos.

O AMOR CRESCIA  

O amor cresceu entre nós

Como a lua entre as duas palmeiras

Que nunca se abraçaram.

O boato íntimo dos dois corpos

Até uma onda ecoar uma canção de ninar,

Porém a voz rouca foi contida.

Foram de pedra os lábios.

O desejo de apertar moveu a carne,

Limpando os ossos inflamados,

Porém os abraços ao quererem se estender

morreram nos braços.

Passou o amor, a lua, entre nós

E devorou ​​os corpos solitários.

E somos dois fantasmas que se buscam

E se encontram distantes.

 

Sunday, June 08, 2025

Uma poesia de Inès Montes

 


I

Inés Montes

Miro caer la tarde desde lo mas alto, observo los últimos rayos del sol devorándose a sí mismos e impregnando la ciudad con su luz rojiza. He atravesado el resplandor del desierto, la opaca densidad de la noche, la jauría de los tiempos. Quiero cerrar los ojos igual que la esfinge de Naxos para sonreír a la muerte y comprender la errática belleza de lo desconocido. Todos los signos me acercaron a ese lugar que está en otra parte, pero eran solo brasas desvanecidas en la memoria. El día se pierde en la oscuridad. Vuelo sobre los tejados de bronce y las columnas de humo. A lo lejos están las palabras que se niegan a ser borradas de la nada y escriben el último abrazo que pueda detener la incomprensible maquinaria del mundo.

I

Olho a tarde desde seu ponto mais alto, observo os últimos raios de sol devorando-se a si mesmos e impregnando a cidade com a sua luz avermelhada. Atravessei o resplendor do deserto, a densidade opaca da noite, a embalagem dos tempos. Quero fechar os olhos igual à esfinge de Naxos para sorrir da morte e compreender a beleza errática do desconhecido. Todos os sinais me acercaram desse lugar que está em outra parte, porém eram só brasas desvanecidas na memória. O dia se perde na escuridão. Voo sobre os telhados de bronze e as colunas de fumo. Ao longe estão as palavras que se negam a ser apagadas do nada e escrevem o último abraço que pode parar a máquina incompreensível do mundo.

Ilustração: Pinterest.

Uma poesia de Deborah Hauser

 


    NEVER ADMIT YOUR MISTAKES

    Deborah Hauser

I text my yoga teacher: I think I need
to start medication. I meant

 

meditation, but the subconscious
knows best. I once wrote a whole poem

 

about the angel of penetration
rather than admit in my haste

 

I meant angle of penetration.
Either way, a virgin ascends.

 

I return a can of paint to the store
because I can’t manage any more

 

pain, I meant paint. I mean pain.
I keep going back for pain samples

 

I don’t need. I have gallons of different
shades stored in the basement. Enough

 

for a fresh coat every year. I don’t take
the medication. There’s nothing worse

 

than a dull coat of pain. I prefer it
bright and sharp.

NUNCA ADMITA SEUS ERROS

Escrevi para minha professora de ioga: eu penso que necessito

começar a tomar medicamento. Eu queria dizer

 

meditação, porém o subconsciente

sabe mais. Certa vez, escrevi um poema inteiro

 

sobre o anjo da penetração

antes de admitir na minha pressa

 

Que queria dizer ângulo de penetração.

De qualquer forma, uma virgem ascende.

 

Eu devolvo uma lata de tinta à loja

porque não aguento mais

 

a dor, eu queria dizer a tinta. Quero dizer a dor.

Eu costumo voltar para buscar amostras de dor

 

das quais não preciso. Eu tenho galões de diferentes

tons guardados no porão. O suficiente

 

para uma camada nova todo ano. Eu não tomo

o remédio. Não há nada pior

 

do que uma camada opaca de dor. Eu prefiro

brilhante e nítida.

Ilustração: Psicologia Clínica e Psicoterapia.

Saturday, June 07, 2025

Inquietações Nº 2

 


Há, certamente, sensações que nunca terei...
Viajar por uma estrela cadente
Sempre me passou pela mente
Ou acordar mais jovem de repente
Ou recuperar o amor que não amei.

 

Os sonhos me parecem mais reais
Quando me conscientizo agora
Que o tempo que já foi embora
Me exige ter prazer com a hora,
O minuto, o segundo e até mais,
Com coisas como a fé.

 

É preciso não me inquietar.
Surge como um raio o pensamento
De que a vida, como um breve vento,
Passa. Viva-se ou não, e tento
Olhando teu retrato não chorar
E voltar a respirar o mesmo ar.

  •  

Inútil. Inquietações ou desejos.
Mesmo que voltes, os beijos
Nem nós somos mais os mesmos
E não há mais razões nem ensejos
Para que exista a mesma paixão
E o mesmo amor que criou a ilusão
De que tivemos o mundo nas mãos.

Ilustração: Tribuna Popular. 

Uma poesia de José Antonio Ramos Sucre

 

 


PRELUDIO

José Antonio Ramos Sucre

Yo quisiera estar entre vacías tinieblas, porque el mundo lastima cruelmente mis sentidos y la vida me aflige, impertinente amada que me cuenta amarguras.

Entonces me habrán abandonado los recuerdos: ahora huyen y vuelven con el ritmo de infatigables olas y son lobos aullantes en la noche que cubre el desierto de nieve.

El movimiento, signo molesto de la realidad, respeta mi fantástico asilo; mas yo lo habré escalado de brazo con la muerte. Ellas es una blanca Beatriz, y, de pies sobre el creciente de la luna, visitará la mar de mis dolores. Bajo su hechizo reposaré eternamente y no lamentaré más la ofendida belleza ni el imposible amor.  

PRELÚDIO

Eu quisera estar entre as trevas vazias, porque o mundo lastima cruelmente os meus sentidos e a vida me aflige, impertinente amada que me conta amarguras.

Então me terão abandonado as recordações: agora fogem e voltam ao ritmo de infatigáveis ondas ​​e são lobos uivantes na noite que cobre o deserto de neve.

O movimento, sinal molesto da realidade, respeita meu asilo fantástico; mas eu o havia escalado de braço com a morte. Ela é uma branca Beatriz e, de pé, no crescente da lua, visitará o mar das minhas dores. Sob seu encanto repousarei eternamente e não lamentarei mais a ofendida beleza ou o impossível amor.

Ilustração: Blog Cenat.