Friday, January 25, 2008

UM POETA CUBANO

Suite de la muerte
Raúl Rivero Castañeda

Acaban de avisarme que he muerto.
Lo anunció entre líneas la prensa oficial.
Yo no esperaba morir este verano hermoso
de fin de siglo
pero los periódicos de mi país no mienten nunca
y por lo tanto es falso este latido del corazón
las pulsaciones, el aire que respiro.
Los recuerdos que tengo son, deben ser
el delirio final porque el Estado
no puede equivocarse en forma tan flagrante.
He muerto.
Yo mismo, que tengo sed y estoy triste
lo empiezo a comprender.
Y, que amo todavía y que me asombro y tengo miedo
estoy aprendiendo a morir por decreto.
Lento, obediente, con discreción, sin un solo gesto de rabia
comienzo a parecerme a mi cadáver.
Para cumplir la orden con rigor
y no turbar el regocijo de mis verdugos
apago con espíritu de contingente
los signos vitales que persisten
porque quien ha seguido como un carnero
el monorritmo de la campana
y la voz del pastor
tiene que disponerse a morir
con sólo el relumbre del cuchillo.
II
Mamá ya lo sabe
y viene enseguida a cortarme las uñas
a ponerme un pañuelo con colonia
a convencer a Humberto para que me recorte el pelo
demasiado largo, demasiado blanco
demasiado tranquilo.
III
Es tan ciega la fe y tan sorda
es tan absoluta la credibilidad
que las personas que me ven no me saludan
los que me escuchan no vuelven la cabeza
porque ya saben la noticia
y a los que visitan mi familia
yo les brindo café
y no lo agradecen
ni una frase cortés, ni un elogio para el amargor
porque esta clase de fe
es, además, muy desabrida.
Como se hizo público mi funeral
y mis pecados, mis aberraciones, mis torvas alianzas
con el enemigo
mucha gente ha venido a mi casa para ver mis despojos
y llevarse, si hubiere, la virtud o el amor.
Los he visto llegar a dar el pésame
mirando de reojo los muebles y el teléfono
añorando el abrigo, el calor de mi cama
de mendigos sentimentales
ayudando al Estado a clavar la tapa de mi ataúd.
He visto llorar a Cristina
estremecer el amor
y a Mariakarla feliz
segura de que era otra trampa mía.
Soy testigo del entierro que me están haciendo.
Estuve alerta en el velorio
y anoté cada gesto y cada comentario
Lo he visto todo claro desde mi muerte.
Los estoy esperando.

Suíte da morte
Acabam de me avisar que estou morto.
O anúncio surgiu entre as linhas do Diário oficial.
Eu não esperava morrer neste verão formoso
de fim de século,
porém os jornais de meu país não mentem nunca
e, portanto, é falsa a batida de meu coração,
as pulsações, o ar que respiro.
As recordações que tenho são, devem ser
o delírio final porque o Estado
não pode equivocar-se de forma tão flagrante.
Estou morto.
Eu mesmo, que tenho sede e estou triste
já começo a compreender.
Eu, que amo todavía e que me assombro e tenho medo
estou aprendendo a morrer por decreto.
Lento, obediente, com discreção, sem um só gesto de raiva
começo a parecer com meu cadáver.
Para cumprir a ordem com rigor
e não turvar o regojizo de meus verdugos
apago com espírito resignado
os signos vitais que persistem
porque quem sempre seguiu como um carneiro
o monoritmo da campanha
e a voz do pastor
tem que se dispor a morrer
tão-somente com o brilho de uma colher.
II
Mamãe já sabe
e vem, em seguida, cortar minhas unhas
e me pôr um lenço com colônia
para convencer Humberto a me cortar os cabelos
demasiado longo, demasiado branco
demasiado tranqüilo.
III
È tão cega a fé
e tão surda
e tão absoluta a credibilidade
que as pessoas que me vêem não me saúdam
os que me escutam não voltam a cabeça
porque já sabem da notícia
e os que visitam minha família
eu os brindo com café
e não me agradecem
nem uma frase cortês, nem um elogio para o amargor
porque esta classe de fé
é, ademais, muito desabrida.
Como fosse público meu funeral
e meus pecados, minhas aberrações, minhas turvas alianças
com o inimigo
muita gente veio a minha casa para ver meus
despojos
e levar, se houvesse, a virtude ou o amor.
Eu os vejo chegar para dar-me os pêsames
olhando de soslaio os móveis e o telefone
investigando o abrigo, o calor da minha cama
mendigos sentimentais
ajudando o Estado a cravar a tampa de meu caixão.
Eu vi Cristina a chorar
estremecendo de amor
e a Maria Carla feliz
segura de que era outra brincadeira minha.
Sou testemunha do enterro que me estão fazendo
.Estive alerta no velório
e anotei cada gesto e cada comentário
Tenho visto tudo claro desde minha morte.
Os estou esperando.

1 comment:

Saramar said...

Spersivo, um dos mais belos e pungentes poemas que já li.
Maravilhoso!

beijos