Wednesday, February 26, 2025

Louis Calaferte adptado à Londrina

 


C'EST VRAI QUI’L PLEUT A LONDRES
Louis Calaferte
C'est vrai qu'il pleut à Londres
et que les ponts s'ennuient

Le ciel mourant et hypocondre
aux nuages noués de suie

A Londres il pleut à Londres
paillettes de la pluie

On voyait la ville se fondre
comme irréelle comme enfuie

Un peuple indécis correspondre
sous les dômes des parapluies

Nos ombres allaient se confondre
dans l'ombre grise de la pluie

C'est vrai qu'il pleut à Londres
et que je t'ai suivie

É CERTO QUE CHOVE EM LONDRINA

É certo que chove em Londrina

e as pontes estão aborrecidas

 

O céu moribundo e hipocondríaco

com suas nuvens cheias de fuligem

 

Em Londrina cai a chuva em Londrina

chuva de lantejoulas

 

Vemos a cidade derreter

tão irreal quanto fugidia

 

Um povo impreciso se comunicar  

sob as cúpulas dos guarda-chuvas

 

Nossas sombras irão se confundir

na sombra cinzenta da chuva

 

É certo que chove em Londrina

e que eu te segui

Ilustração: Pinterest.

Tuesday, February 25, 2025

Um poema de Wislawa Szymborska

 


CONSOLATION

Wislawa Szymborska

Darwin.

They say he read novels to relax,

But only certain kinds:

nothing that ended unhappily.

If anything like that turned up,

enraged, he flung the book into the fire.

 

True or not,

I’m ready to believe it.

CONSOLAÇÃO

Darwin.

Dizem que ele lia romances para relaxar,

Porém somente de certas espécies:

nada que tivesse final infeliz.

Se algo como tal aparecesse,

enfurecido, ele jogava o livro no fogo.

 

Verdade ou não,

Eu estou pronto para acreditar.

Ilustração: Fundação Telefônica Vivo.

Um poema de Luis Mateo Diez

 


ADAGIO

Luis Mateo Díez

No es tierra roturada
sino trincheras
sepulturas comunes
campos de guerra

Una vieja costumbre para abonar los siglos
y hacer la turbia música

Este legado de odio que recogen
nuestros hijos desnudos
quemándose la piel en tantas viejas glorias

Esta herencia de honores militares
haciendo un mar de sargazos
en la devastación

Nuestra historia sin pan y con metralla

ADÁGIO

Não é terra arada

sim trincheiras

sepulturas comuns

campos de guerra

 

Um velho costume de pagar pelos séculos

e fazer a turva a música

 

Este legado de ódio que eles recolhem

nossas crianças nuas

queimando a pele em tantas velhas glórias

 

Esta herança de honras militares

fazendo um mar de sargaços

na devastação

 

Nossa história sem pão e com estilhaços

Ilustração: Steam.

Os Fantasmas Dançam



Porque não fui à praia
o mundo desabou.
Sou sim, Jonathan, o teu carrasco
E te ofereço meus mais
lindos pensamentos:
És uma mula sem cabeça,
És uma oradora pra repolhos,
És uma assassina mental,
És uma monja
Cuja maior santidade
É ficar produzindo imagens eróticas
nas horas mais frias.

Amélia me diz: “Deus é um vinho,
está aqui no copo em que bebo.
Eu sou um bêbado puro”.
E, imediatamente, passa a beber água
Com inesperada incerteza decreta:
“Nós não temos salvação
porque estamos sóbrios”.
Não tenho o coração de Amélia
E estou sempre perto do álcool
E, por conseqüência, das mulheres
Que se enganam com minha luz,
Pois o brilho que aparento
é o da embriaguez....

O amor é como a ressaca.
O travo de quem vive
Na santidade mais rigorosa,
Por isto o ridículo do que sou
me absolve
E meu desejo,
Como uma estrela cadente,
fugaz.
Só os erros suportam meu mundo.
E quando se amontoam
Chegou a um tempo onde viver
Significa juntar os pedaços
de mim mesmo
E não inventaram uma boa cola
Para os cacos de alma.

Não tente explicar
(Até porque intelectuais de gelatina
não tem cérebros)
O que não tem explicação:
Aqui tudo está claro
E nada se entende.
Pode me fitar que uso
óculos escuros-
E no escuro gozo-
Só para esconder
Os buracos do coração,
Enormes e vazios,
Onde a menina caiu.
Sou teu vazio
Ou teu buraco negro?
Que importa o enredo?
O que importa é a emoção.
Calma que se chega lá.
Ainda não é a hora

É com o choro

Que o prazer se paga

E a vida, minha linda,

Até os pobres sabem

Que é cara.

Ilustração: Revivendo os Anos 80s.

 


Monday, February 24, 2025

Uma poesia de Anne Carson

 


GOD'S HANDIWORK 

Anne Carson 

The best way to insult God
is to damage your uniqueness,
which God has worked on.

O TRABALHO MANUAL DE DEUS

O melhor caminho para insultar Deus

é prejudicar sua singularidade,

sobre a qual Deus tem trabalhado.

Ilustração: Mundo Curiosidade.

Sunday, February 23, 2025

Amor Musical

 


A delicadeza do teu querer

Vibra em cada fibra de minha alma

Com o suave toque de tuas mãos

Que uma partitura invisível segue

Despertando em nossos corpos

Harmonias insuspeitas de prazer

Para tornar o nosso amor

Uma sinfonia inacabada,

E sempre repetida,

Música inesquecível de gozo e vida

Que sempre acaba em suor e prazer

E em coisas que as palavras

Jamais podem dizer. 


Mais uma vez Paula Arbona

 


TODOS LOS IDIOMAS DEL MUNDO

Paula Arbona

Ojalá supiera
todos los idiomas del mundo,
no para hablarlos, sino para leerlos.
El espíritu de cada lengua.
El español es la lengua de la pasión.
Te amo no es lo mismo que Te quiero.
Creo que el español es el único idioma
que ve la diferencia.
Querer no es lo mismo que amar.
Amar a alguien es ver
el rostro de Dios sin querer.
No se busca. No hay necesidad de por medio.
Cuando Dios pensó en la poesía,
probablemente pensó en lo mucho que amaba
sus rosas. No necesitaba que florecieran,
simplemente las miraba y las veía
por lo que eran.
Una rosa en flor
es la forma que tiene Dios
de decirnos Te amo.

TODAS AS LÍNGUAS DO MUNDO

Eu queria saber

todas as línguas do mundo,

não para falá-las, mas para lê-las.

O espírito de cada idioma.

O espanhol é a língua da paixão.

Eu te amo não é a mesma coisa que eu te quero.

Acho que o espanhol é a única língua

quem vê a diferença.

Querer não é o mesmo que amar.

Amar alguém é ver

o rosto de Deus sem querer.

Não desejado. Não há necessidade de nada intermediário.

Quando Deus pensou em poesia,

Ele provavelmente pensou em quanto amava

suas rosas. Eu não precisava que elas florescessem,

Eu apenas olhei para eles e os vi

pelo que eles eram.

Uma rosa em flor

É assim que Deus é

para nos dizer que te amo.

Ilustração: Cobasi blog.

Alegoria de Charles Baudelaire

 


ALLÉGORIE
Charles Baudelaire
C'est une femme belle et de riche encolure,
Qui laisse dans son vin traîner sa chevelure.
Les griffes de l'amour, les poisons du tripot,
Tout glisse et tout s'émousse au granit de sa peau.
Elle rit à la Mort et nargue la Débauche,
Ces monstres dont la main, qui toujours gratte et fauche,
Dans ses jeux destructeurs a pourtant respecté
De ce corps ferme et droit la rude majesté.

Elle marche en déesse et repose en sultane;
Elle a dans le plaisir la foi mahométane,
Et dans ses bras ouverts, que remplissent ses seins,
Elle appelle des yeux la race des humains.
Elle croit, elle sait, cette vierge inféconde
Et pourtant nécessaire à la marche du monde,
Que la beauté du corps est un sublime don
Qui de toute infamie arrache le pardon.

Elle ignore l'Enfer comme le Purgatoire,
Et quand l'heure viendra d'entrer dans la Nuit noire
Elle regardera la face de la Mort,
Ainsi qu'un nouveau-né, - sans haine et sans remords.

ALEGORIA

Ela uma mulher linda de formosa figura,

Que arrasta o seu cabelo solto no vinho.

As garras do amor, os venenos do antro de jogo,

Tudo desliza e tudo fica opaco no granito de sua pele.

Ela ri da Morte e provoca a Devassidão,

Esses monstros cuja mão, que sempre arranha e corta,

Hão respeitado sempre, porém, em seus jogos destrutivos,

A majestade rude deste corpo firme e reto.

 

Ela anda como uma deusa e descansa como uma sultana;

Ela tem no prazer a fé muçulmana,

E em seus braços abertos, que enchem seus seios,

Ela atrai com seus olhos toda a raça humana.

Ela crê, ela sabe, esta virgem infecunda,

Não obstante, ser necessária a marcha do mundo,

Que a beleza do corpo é um dom sublime

Que de toda infâmia arranca o perdão.

 

Ela ignora o Inferno e também o Purgatório,

E quando chegar a hora de entrar na Noite escura

Ela olhará para a face da Morte,

Como um bebê recém-nascido, - sem ódio e sem remorso.

Ilustração: Reditt.com.

Saturday, February 22, 2025

Papel

 

Sei que é muito difícil ser ator.

Claro que é fácil rir ou chorar,

Mas, interpretar está além

De ser o canastrão ou o zé ninguém

Que, na vida, sempre se é.

 

Ser ator

É coisa para Marlon Brando

Ou Meryl Streep.

É como tirar a roupa

Sem ficar nu

E continuar sendo quem se é

Quando se é outro.

 

Ser ator é como incorporar espíritos.

É ser outro no mesmo corpo

Fingindo o que não é

E, mesmo sendo branco, ser Pelé!

Ilustração: New York Theater. 

Thursday, February 20, 2025

Nem me fale Georges Bataille

 


TU ES L’HORREUR.....
Georges Bataille
Tu es l’horreur de la nuit
Je t’aime comme on râle
Tu es faible comme la mort

Je t’aime comme on délire
Tu sais que ma tête meurt
Tu es l’immensité la peur

Tu es belle comme on tue
Le cœur démesuré j’étouffe
Ton ventre est nu comme la nuit.

TU ÉS O HORROR

Tu és o horror da noite

Eu te amo como se agonizasse

Tu és fraco como a morte

 

Eu te amo loucamente

Tu sabes que minha cabeça está morrendo

Tu és a imensidão, o medo

 

Tu és linda como matar é belo

Com o coração desmesurado me afogo

Teu ventre está nu como a noite.

Wednesday, February 19, 2025

Eis Philip Larkin

  


TALKING IN BED

Philip Larkin

Talking in bed ought to be easiest,
Lying together there goes back so far,
An emblem of two people being honest.
Yet more and more time passes silently.
Outside, the wind's incomplete unrest
Builds and disperses clouds in the sky,
And dark towns heap up on the horizon.
None of this cares for us. Nothing shows why
At this unique distance from isolation
It becomes still more difficult to find
Words at once true and kind,
Or not untrue and not unkind.

CONVERSANDO NA CAMA

Conversar na cama deveria ser mais fácil,

Deitar juntos lá remonta a tanto tempo,

Um emblema de duas pessoas sendo honestas.

No entanto, mais e mais passa tempo mais silenciosamente.

Lá fora, a inquietação incompleta do vento

Cria e dispersa nuvens no céu,

E escuras cidades se amontoam no horizonte.

Nada disto nos importa. Nada mostra o porquê

Nesta distância única do isolamento

Torna-se ainda mais difícil encontrar

Palavras, ao mesmo tempo, verdadeiras e gentis,

Ou que não sejam falsas e não cruéis.

Ilustração: Texto do Dia.

Lembrança

 


Há mensagens que nunca chegam
ao destinatário

(Como os pensamentos meus que rodeiam

a tua imagem e voz quase esquecidas)

Qual garrafa lançada ao mar

Que afunda num banco de areia.

 

Nosso destino, talvez,

Esteja suspenso assim

Numa mensagem que não chegou ao fim

Na notícia de longe que não veio.

 

E tu, que serias o farol, a luz,

O guia do ser e do prazer

Permanece como uma estrela do passado

Que não voltou a brilhar.

 

E nesta noite

Com esta lua linda

Tua lembrança me faz chorar.

Ilustração: Filmelier.

Monday, February 17, 2025

O Vinho do Solitário de Charles Baudelaire

 


LE VIN DU SOLITAIRE
Charles Baudelaire

Le regard singulier d'une femme galante
Qui se glisse vers nous comme le rayon blanc
Que la lune onduleuse envoie au lac tremblant,
Quand elle y veut baigner sa beauté nonchalante;

Le dernier sac d'écus dans les doigts d'un joueur;
Un baiser libertin de la maigre Adeline;
Les sons d'une musique énervante et câline,
Semblable au cri lointain de l'humaine douleur,

Tout cela ne vaut pas, ô bouteille profonde,
Les baumes pénétrants que ta panse féconde
Garde au coeur altéré du poète pieux;

Tu lui verses l'espoir, la jeunesse et la vie,
- Et l'orgueil, ce trésor de toute gueuserie,
Qui nous rend triomphants et semblables aux Dieux!

O VINHO DO SOLITÁRIO

O olhar singular de uma mulher galante

Que desliza até nós como o raio branco

Que a lua ondulante envia ao trêmulo lago,

Quando ela quer banhar ali sua beleza indiferente;

 

O último saco de moedas nos dedos de um jogador;

Um beijo libertino da delgada Adeline;

Os sons de música enervante e cálida,

Semelhante ao grito de uma humana dor,

 

Tudo isso não vale a pena, ó garrafa profunda,

Os bálsamos penetrantes que teu ventre fecundo

Guarda o coração alterado do piedoso poeta;

 

Tu vertes a esperança, juventude e a vida,

- E o orgulho, este tesouro de toda mendicância,

Que nos faz triunfantes e semelhantes aos Deuses!

Ilustração: Edna Ramos.

Uma poesia de Aldrin Regina Valdez

 


ARS POETÍCA

Aldrin Regina Valdez

                                                you think I’m kind on the daily
                                                -and my healing
                                                always soft
                   you don’t see me 
                                                beat to the ground 
                                                the Forehead Man 
                                                & his Mouse-God friend-how 
                                                I bonked the lights out 
           from their faces til one 
                          had no teeth 
                     and the other-
                                                only a mouth 
                                                stuffed full of them-
           across this white field
                                                I use my own Pointy thing
                                                Stabbing-after all is always 
                                                Personal
     you see-they did not see 
                my Rage coming-
                                                said they wanted me
                                                to go Home-Go back
                                                their jaws cajoled- 
                                   Go back 
                                                to where you’re from-from
                                         & so 
                      they saw me Go
                                                & Go
                                                -with each blue 
                                                wide-eyed Stab-
                               and Stab-
                           into the bone 
                    & mush of them-
                                                Gone-Home-
                   Home to my Rage
                                                and they-such slabs 
                                                of meat-
                                                                       Stayed

ARS POÉTICA

você pensa que eu sou gentil

diariamente

                                                 - e minha cura

                                                 sempre suave

você não me vê

                                                 -batendo no chão

                                                 o Homem Testa

                                                 & seu amigo Deus-Rato-                              como                                        eu apaguei as luzes

de seus rostos até que um

não tivesse dentes

e o outro-

                                                somente uma boca

                                                cheia deles-

em redor deste campo branco

                                          eu uso minha própria pontuda coisa Pontuda

                                          Esfaqueamento- afinal é sempre

                                          Pessoal

você vê - eles não veem

minha Raiva chegando-

                                         dizem que queriam que eu

                                         fosse para Casa- Volte

                                         com suas mandíbulas bajuladoras-

Volte

para onde você é de-de

& então

eles me viram ir

                       & ir

                      -com cada azul

                      dos olhos arregalados Esfaquear-

            e Esfaquear-

         no osso

      e mingau deles-

                              Partiu- Casa-

Casa para minha Raiva

e eles-como pedaços

de carne-

Ficaram

Ilustração: Discogs. 

Desespero

 


Como um deus sem dons

num mundo de ateus

chorei impotente o meu desespero.

Mil lenços molhei,

criei oceanos, rios, tempestades, raios e trovões.

No maior silêncio

bradei por teu amor

e, no menor papel, foi o maior ator.

Quase acreditei não sentir mais dor,

porém, foi tudo em vão

porque tanto sofri que, de repente, me vi

a maldizer o tempo, os sentimentos,

o mundo e a ilusão,

mas, nada estancou

tanto amor             

sangrando lenta e cruelmente

do meu coração!

Ilustração: Devaneios Pessoais.

Saturday, February 15, 2025

Os poemas perfurados de Richard Armour

 


PUNCTURED POEMS

by Richard Armour

Summer is icumeen in;
Mix the tonic and the gin

***

Water, water, everywhere;
The plumbing badly needs repair.

***

To err is human, to forgive divine.
Some errors I forgive, though, quickly. . . . Mine..

***

Jenny kissed me when we met
Not oft such quick results I get.

***

I celebrate myself, and sing myself.
My picture’s there, my bust’s upon the shelf.

POEMAS PERFURADOS

O verão está chegando;

Misture a tônica e o gim

***

Água, água, por todo lugar;

O encanamento precisa urgentemente de reparos.

***

Errar é humano, perdoar é divino.

Alguns erros eu perdoo, porém, rapidamente. . . . Os meus..

***

Jenny me beijou quando nos conhecemos

Não costumo obter resultados tão rápidos.

***

Eu me celebro e canto para mim mesma.

Minha foto está lá, meu busto está na prateleira.

Ilustração: Myloview.

Friday, February 14, 2025

NOTIFICAÇÃO


Meu ex-marido,

Venho te notificar

 Que, apesar do bandido que sei que és,

Não sei como conseguiu me enganar.

Sou de coração mole, até me fez gostar,

E com todas as asneiras que fez,

Ainda há em mim

Um resto de carinho, sim.

Sei que andas mal das pernas

( a sorte para quem tanto apronta não é eterna),

Mas se aguente para não morrer antes de mim.

Sinceramente, 

lágrimas não combinam com rímel

E vou perder todo o dinheiro do cabelo,

pois bem sabes que não sou de chorar

sem me descabelar.

Olhe lá, seu malvado, o que faz,

garanto que se morreres não terás paz.

Diz minha guia espiritual 

que posso te fazer o maior mal

indo ao seu enterro chorar.

Chorar morto de outra-diz ela- dá o maior azar;

a alma do defunto nunca mais acha lugar!

(De "Poemas Malcomportados", Rio, Courier Brasil, 2021).