Saturday, May 31, 2025

Outra poesia de Homero Pumato

 


WORDS

Homero Pumato

Cuando ellos leen mis poemas
Siento pedacitos de hielo en la sien,
Como cuando uno bebe frío-frío rápido.
Cuando ellos leen mis poemas
Las palabras me paralizan,
Como cuando quieres algo
Y dices lo primero que piensas:
Cenicero al encendedor,
Fósforos a los cigarrillos,
Como si pidieras un café o un Vodka
Y te trajeran un ataúd o una linterna.
Al final aceptas lo que sea,
-Algo obtuviste a cambio
Y no eres tan imbécil de rechazarlo-
Un grupo de palabras que alguien repite
Y que ya no significan nada para ti.

PALAVRAS

Quando eles leem meus poemas

Sinto pedaços de gelo na testa

Como um bebê gelado, gelado rápido.

Quando eles leem meus poemas

As palavras me paralisam,

Como quando queres algo

E dizes a primeira coisa que pensas:

Cinzeiro ao acendedor,

Fósforos aos cigarros,

Como se pedisses um café ou uma vodca

E te trouxeram um caixão ou uma lanterna.

No final aceitas o que seja

-Algo obtiveste em troca

E não és tão imbecil de rechaçá-lo-

Um grupo de palavras que alguém repete

E que já nada significam para ti.

Ilustração: Toda Matéria.

Friday, May 30, 2025

Mamãe me Avisou


 

Ai!Ai! Mamãe!!! Ai! Mamãe! 

Bem que a senhora me falou

que eu ainda não havia visto nada.

O mundo mãe tá uma enorme salada

misturando auto-casamento,

com bebê Reborn e drag queen.

Tá sim! Tá sim!

A coisa tá difícil para mim.

Ai!Ai! Mamãe!!! Ai! Mamãe! 

Umas pessoas dizem ser furry fandom

andando de quatro e latindo como um cão

tá impossível ser um homem são.

Só vejo nerds, geeks, avatares

e góticos escondidos pelos cantos

e um bocado de bandido fazendo pose de santo.

Tá sim! Tá sim!

A coisa tá difícil para mim

Ai!Ai! Mamãe!! Ai!Ai! Mamãe!

Existem agora os vikings modernos

enquanto os homens usam saias,

as mulheres vestem ternos.

Os personagens são as pessoas reais.

A exceção virou ser um ser normal.

Inteligência há somente artificial

no mundo que agora é digital.

Ai!Ai! Mamãe! Ai! Ai! Mamãe!

Com todo respeito

Se eu pudesse voltava a beber leite.

No seu peito

para saber se o mundo ainda tem jeito.

Tá sim! Tá sim!

A coisa tá difícil para mim.

 


Wednesday, May 28, 2025

Uma poesia de Homero Pumato

 


COSTA BRAVA REVISITED

Homero Pumato

Para Eddy Bobea

Tu sombra se hace cada vez más delgada,
la luz de los faroles me cierra los ojos.

Las casas del barrio son pura fachada,
un mundo plano, sin misterio.

Pensar que tú jugabas debajo de esos faroles.
¿No es como que te escupan en la cara?

Cangrejos retroceden por la calle.
El ruido de sus patas contra el pavimento
hace pequeña mi tristeza.

COSTA BRAVA REVISITADA

Tua sombra se faz cada vez mais fina

a luz dos faróis me fecha os olhos.

 

As casas do bairro são pura fachada,

um mundo plano, sem mistérios.

 

Pensar que tu jogavas debaixo desses faróis.

Não é como te cospem na cara?

 

Caranguejos retrocedem pela rua.

O ruído de suas patas contra o pavimento

faz pequena minha tristeza.

Ilustração: Aventuras na História.

 


Tuesday, May 27, 2025

Uma poesia de Mahtem Shiferraw

 


NOMENCLATURES OF INVISIBILITY

Mahtem Shiferraw

My ancestors are made with water-
blue on the sides, and green down the spine;

when we travel, we lose brothers at sea
and do not stop to grieve.

Our mothers burn with a fire
that does not let them be;

they whisper our names
nomenclatures of invisibility
honey-dewed faces, eyes sewn shut,
how to tell them
the sorrow that splits us in half
the longing for a land not our own
the constant moving and shifting of things,
within, without-

which words describe
the clenching in our stomachs
the fear lodged deeply into our bones
churning us from within,

and the loss that follows us everywhere:
behind mountains, past oceans, into
the heads of trees, how to swallow
a tongue that speaks with too many accents-

when white faces sprout
we are told to set ourselves ablaze
and this smell of smoke we know-
water or fire, or both,

because we have drowned many at a time
and left our bodies burning, or swollen, or bleeding
and purple-this kind of language we know,
naming new things into our invisibility
and this, we too, call home.

NOMENCLATURAS DA INVISIBILIDADE

Meus ancestrais são feitos de água-

azul nos lados e verde abaixo da espinha;

 

quando nós viajamos, nós perdemos irmãos no mar

e não paramos para lamentar.

 

Nossas mães queimam com um fogo

que não as deixa em paz;

 

Eles sussurram nossos nomes

nomenclaturas da invisibilidade

rostos orvalhados de mel, olhos costurados,

como contar-lhes

a tristeza que nos parte ao meio

a saudade de uma terra que não é nossa

o constante movimento e mudança das coisas,

dentro, fora-

 

palavras que descrevem

o aperto em nossos estômagos

o medo alojado profundamente em nossos ossos

nos agitando por dentro,

 

e a perda que nos segue por toda parte:

atrás de montanhas, passando por oceanos, para dentro

das copas das árvores, como a engolir

uma língua que fala com sotaques demais-

 

quando rostos brancos brotam

nos dizem para nos incendiarmos

e este cheiro de fumaça nós conhecemos-

água ou fogo, ou ambos,

 

porque afogamos muitos de uma vez

e deixamos nossos corpos queimando, ou inchados, ou sangrando

e roxos- este tipo de linguagem que conhecemos,

nomeando coisas novas em nossa invisibilidade

e isto, nós também, chamamos de lar.

Ilustração: Projeto Alterama.

ANOTAÇÕES SOBRE A ETERNIDADE DO AMOR

 


Morrer de amor não é um caminho,

pois de amor nunca se morre.

Se morre de lembrar que o carinho

a paixão, o desejo e a lembrança

na nossa mente sempre dança

e pede para que o amor eterno seja

o que, infelizmente, nunca é.

Mas, o amor não morre

fica sempre a relembrar o ardor dos beijos

a refluir no eterno desejo

que de nós nunca se afasta.

O amor se distancia, às vezes,

o amor, porém, nunca se gasta

nem termina

como uma vocação, uma sina.

É sempre como os sonhos da menina

que vão mudando

quando deixa de ser pequenina

 e, no máximo, mudam de alvo

até que volte o gosto de amar

e o mundo seja salvo.

Afinal só o amor pode salvar!

Ilustração: 123RF.

Uma poesia de Nicolás Fernández de Moratín

 


SABER SIN ESTUDIAR

Nicolás Fernández de Moratín

Admiróse un portugués

de ver que en su tierna infancia

todos los niños en Francia

supiesen hablar francés.

«Arte diabólica es»,

dijo, torciendo el mostacho,

«que para hablar en gabacho

un fidalgo en Portugal

llega a viejo, y lo habla mal;

y aquí lo parla un muchacho».

SABER SEM ESTUDAR

Admirou-se um português

de ver que em sua tenra infância

todos os meninos na França

sabiam falar francês.

“A arte diabólica é”,

disse, torcendo o bigode,

"que para falar em francês

um fidalgo em Portugal

envelhece e fala mal;

e aqui fala bem um menino.

 

Sunday, May 25, 2025

Uma poesia de Pramila Venkateswaran

  


 

    BODY LANGUAGE

    Pramila Venkateswaran

On the fringes of conversations
surging around me in a different language,
my tongue is frozen in English.
Silence funnels into my body
I reach for words I recognize—
‘kitap’ book, ‘café,’ brand names.

 

I nod and smile trying not to look demure,
use abhinaya, throw open the nine gates of emotion,
let wonder, worry, fear, ire, envy, disgust,
piety, surprise, and love cavort on my face,
my hands aiding me, a language refugee,
roaming bazaars and sun-weathered ruins.

“Thank you,” I say to the waiter, touching my heart
as he places aromatic coffee on the table.
Beyond the courtyard, the peach dome of a mosque.
I expect the muezzin to sing at noon,
remember Haji Ali dargah, a moon on the bay
on my bus rides home from college.

In Kolkata when I was 9, I’d played silently,
my ear tuned to my classmates chattering in Bengali,
drinking their words until they became mine.

A LINGUAGEM DO CORPO

Às margens das conversas

surgindo ao meu redor em uma língua diferente,

minha língua está congelada em inglês.

O silêncio se afunila em meu corpo

Procuro palavras que reconheço-

livro 'kitap', 'café', nomes de marcas.

 

Eu aceno e sorrio, tentando não parecer recatada,

uso abhinaya, abro os nove portões da emoção,

deixo a admiração, a preocupação, o medo, a ira, a inveja, o desgosto,

a piedade, a surpresa e o amor florescerem em meu rosto,

minhas mãos me ajudando, uma refugiada da língua,

vagando por bazares e ruínas ensolaradas.

 

"Obrigada", digo ao garçom, tocando meu coração

enquanto ele coloca o café aromático na mesa.

Além do pátio, a cúpula cor de pêssego de uma mesquita.

Eu espero que o muezim cante ao meio-dia,

lembro-me de Haji Ali dargah, uma lua na baía

nas minhas viagens de ônibus para casa depois da faculdade.

   

    Em Calcutá, quando eu tinha 9 anos, eu brincava em

    silêncio,

    com os ouvidos atentos aos meus colegas conversando      

    em bengali,

    bebendo suas palavras até que elas se tornassem

    minhas.

    Ilustração: SME.

Saturday, May 24, 2025

Outro poema de William Keith Sutherland

 


OLVIDO

 (Del poemario 'Chem No Rume'.

William Keith Sutherland)

No me llevó la muerte, no pudo. Mi lengua hermafrodita, desencajado útero, llora su ira en cada verso, grita una canción urgente desde un limbo trágico, vertiente en verso que corta por peso bastiones todos, como una caricia desnuda al borde del abismo de una palma nebular.

Ahora, recojo mi cuerpo entristecido, como carbón milenario, profanando lo sagrado en la casa del orate mayor con mi sangre eterna y consumida.

Mis pasos romperán aquel paño que cubre al mundo. Llegaré como un extranjero, como amor que no exige réplica, y mi frente será lápida, una vereda en llamas, y mi rostro, un sol renegrido, absorbido al otro lado de los labios, y mis ojos, excavación para los muertos.

Diez mil soles han pasado, y el ancla llevo a cuesta como una cruz. Mi santuario de mármol lumaquela reconoce tus voces en esta catacumba flotante del Estrecho, donde el pómulo empinado hizo a sus hijos.

Qué difícil es decir lo más evidente de esta tierra de espanto y desconsuelo.

Arde el vientre como mierda fresca, como un panteón sumergido en un tiempo que nos olvida, en una alegría que desenfundó sus sogas y erigió postes incólumes como árboles en esta selva austral, sembrando flores de un cementerio lejano, violando el útero en sus palacios, cortando la yugular del deseo amoroso y desposeído, asfixiando el cordón umbilical de la carne y los sueños del pobre.

Doy paso firme hacia el duelo suspendido por tu dios abyecto. Endilgo mis huestes de huesos ajenos, a recorrer las calles frías y enmohecidas, calles de tierra que abrió la mano cruda sintiendo la bóveda craneal de dios en la barriada, explosada en el corazón palpitante de un parto atemporal, lluvia y designio perpetuo del existir caído, sueño insomne en medio de imágenes cansadas y cuerpos atónitos, devorados por el temor, como mirada de niño proletario, con su pupila sincera y pura, aquella que sostiene más verdad que cien salmos y mil dioses.

Mi cuerpo arrastra tu podredumbre, como un metal guacho y oxidado, perdido en la columna vertebral de los bordes del austro.

El mundo quiso hacerme mundo, y en ello me quitó el andar. Ahora mi desierto se extiende sobre tu obscena y genocida aureola. Sembraste sordos de silencio, mudos de espanto e impotencia, de desconexión y apatía, como palabra que sujeta una realidad en un sueño ausente. Fuiste el martirio para el torturado, dejaste pena silente y escarnio, clavaste el hacha en el deja vu de la vida.

Ahora, que camino como un grito en medio de este silencio sepulcral, dejaré mi marca sobre el animal que ríe, colmaré de liquidez seminal el arrebol de las alturas, y los trópicos encenderé como embriaguez en un santuario, y abriré, la puerta oscura de esta casa de putas, y en la soledad y abandono de la vesania de este potrero circular, caminaré desnudo.

 

Tocaré tu puerta como un sepulturero. Seré el eslabón perdido que une tu sangre a esta tierra sedienta.

Reconocí el cuerpo en la arena, tendido como un cetáceo nocturno, anquilosado a la vertiente láctea universal. Escuché mi voz de vida en la caverna de los dioses, y vi frente a mí, las fauces de la muerte.

Soy el desaparecido, el verbo que borraron, la palabra sin decir, más allá de todo palimpsesto. Soy quien abrió el corazón como piernas al parir, con la mandíbula desencajada. Soy quien suda partos cuando me olvidan, y sangre en su labor. Soy el hierro negro, ardiente como bala. Soy quien muda las palabras recién nacidas, y soy, en definitiva, quien encalla como un planeta en ti, como un beso que deja salir al gemido más impronunciable, aquel que deambula tus noches.

En fin, soy quien dice al mundo desde esta tierra sumergida: “no me abandones”.

ESQUECIMENTO

Não me levou a morte, não. Minha língua hermafrodita, útero deslocado, grita sua raiva em cada verso, grita uma canção urgente de um limbo trágico, um verso que corta todos os bastiões com seu peso, como uma carícia nua à beira do abismo de uma palmeira nebulosa.

Agora, recolho meu corpo entristecido, como carvão antigo, profanando o sagrado na casa do maior louco com meu sangue eterno e consumido.

Meus passos romperão esse pano que cobre o mundo. Chegarei como um estranho, como um amor que não exige réplica, e minha testa será uma lápide, uma calçada em chamas, e meu rosto, um sol enegrecido, absorvido do outro lado dos meus lábios, e meus olhos, uma escavação para os mortos.

Dez mil sóis se passaram, e eu carrego a âncora nas costas como uma cruz. Meu santuário de mármore lumaquela reconhece suas vozes nesta catacumba flutuante do Estreito, onde a maçã do rosto íngreme fez seus filhos.

Como é difícil dizer o mais evidente sobre esta terra de espanto e desconsolo.

A barriga arde como merda fresca, como um panteão submerso num tempo que nos esquece, numa alegria que desenrolou as suas cordas e ergueu postes tão ilesos como árvores nesta selva austral, semeando flores de um cemitério distante, violando o útero nos seus palácios, cortando a jugular do desejo amoroso e despossuído, sufocando o cordão umbilical da carne e os sonhos dos pobres.

Dou um passo firme em direção ao duelo suspenso pelo teu deus abjeto. Sobrecarrego minhas hostes de ossos alheios para caminhar pelas ruas frias e mofadas, ruas de terra abertas pela mão crua que sente a abóbada craniana de deus na vizinhança, explodida no coração pulsante de um nascimento atemporal, chuva e desígnio perpétuo de existência decaída, sonho sem dormir em meio a imagens cansadas e corpos atônitos, devorado pelo medo, como o olhar de uma criança proletária, com sua pupila sincera e pura, aquela que contém mais verdade do que cem salmos e mil deuses.

Meu corpo arrasta tua podridão, como um metal enferrujado e podre, perdido na espinha dorsal das fronteiras do sul.

O mundo queria fazer de mim um mundo e, ao fazer isto, tirou minha capacidade de andar. Agora meu deserto se estende sobre seu halo obsceno e genocida. Semeaste surdez com silêncio, mudez com terror e desamparo, com desconexão e apatia, como uma palavra que contém uma realidade em um sonho ausente. Foste o martírio dos torturados, deixaste tristeza e desprezo silenciosos, cravaste o machado no déjà vu da vida.

Agora, enquanto caminho como um grito no meio deste silêncio sepulcral, deixarei minha marca no animal que ri, encherei o brilho das alturas com liquidez seminal, e os trópicos incendiarei como a embriaguez em um santuário, e abrirei a porta escura deste bordel, e na solidão e no abandono da loucura deste pasto circular, caminharei nu.

Tocarei na sua porta como um coveiro. Serei o elo perdido que une teu sangue a esta terra sedenta.

Reconheci o corpo na areia, estendido como um cetáceo noturno, ancorado na encosta leitosa universal. Escutei minha voz de vida na caverna dos deuses e vi diante de mim as faces da morte.

Sou o desaparecido, o verbo que foi apagado, a palavra não dita, além de todo palimpsesto. Sou quem abriu o coração como pernas ao parir, com meu maxilar desarticulado. Sou o que sua nos partos se esquecem de mim, e sangue no seu labor. Sou o ferro negro, ardendo como uma bala. Sou quem muda as palavras recém-nascidas, e sou eu, em definitivo, quem encalha como um planeta em ti, como um beijo que deixa escapar o gemido mais impronunciável, aquele que vagueia pelas tuas noites.

Enfim, sou quem diz ao mundo desta terra submersa: “Não me abandone”.

Ilustração: Gifer.

Friday, May 23, 2025

Um poema de Vievee Francis

 


THE POEMS REPEAT AS DREAMS AS TRARS

Vievee Francis

How to begin the story without being obvious:
the wet face, eyes swollen dim, the swallowed
moan … Who cares and Who cares, you ask. We all have
our pain, and it is so bloody boring, so obvious. But 
that is the point: there is a sword, and we know
it is a sword, but despite our knowing we accept
the dual. What remains curious is our umbrage
when the tip of the blade enters. We are shocked. Why 
do we never believe it will go through the skin,
that the skin, ephemeral as a cloud, does nothing to protect
the heart? I dream of Pushkin,  
in my arms. Thrust through. I give him my breast.
A man who would never have loved me.
I kiss the tight curls on top of his head. It is the moment 
after his duel for another’s love, another’s honor.
Being me, I believe I can save him. I can’t. 
When I wake from this dream he is dead.
But the dream repeats itself.
Every dusk,
the longing. Every daybreak the loss.

OS POEMAS SE REPETEM COMO SONHOS E LÁGRIMAS

Como começar a história sem ser óbvio:

o rosto molhado, os olhos inchados e turvos, o gemido

engolido... Quem se importa e quem se importa, você pergunta. Todos nós temos

a nossa dor, e ela é tão terrivelmente chata, tão óbvia. Mas

este é o ponto: há uma espada, e nós sabemos

que é uma espada, mas apesar de sabermos, nós aceitamos

a dualidade. O que permanece curioso é a nossa ofensa

quando a ponta da lâmina penetra. Nós ficamos chocados. Por que nunca acreditamos que ela atravessará a pele,

que a pele, efêmera como uma nuvem, não faz nada para proteger

o coração? Eu sonho com Pushkin,

nos meus braços. Enfiado neles. Dou-lhe o meu peito.

Um homem que nunca me teria amado.

Beijo os cachos firmes no topo da sua cabeça. É o momento

após o seu duelo pelo amor de outro, pela honra de outro.

Sendo eu, acredito que posso salvá-lo. Não consigo.

Quando acordo deste sonho, ele está morto.

Mas o sonho se repete. A cada anoitecer,

a saudade. A cada amanhecer, a perda.

Ilustração: YourClassical.

E, de novo, vem Nicolás Guillén

 

 


A VECES

Nicolás Guillén

A veces tengo ganas de ser un cursi

para decir: La amo a usted con locura.

A veces tengo ganas de ser tonto

para gritar: ¡La quiero tanto!

A veces tengo ganas de ser un niño

para llorar acurrucado en su seno.

A veces tengo ganas de estar muerto

para sentir, bajo la tierra húmeda de mis jugos,

que me crece una flor rompiéndome el pecho,

una flor, y decir: Esta flor,

para usted.

ÀS VEZES

Às vezes tenho vontade de ser piegas

para dizer: te amo com loucura.

Às vezes tenho vontade de ser tonto

gritar: Te amo tanto!

Às vezes tenho vontade de ser uma criança

para chorar encolhida no seu seio.

Às vezes tenho vontade de estar morto.

para sentir, sob a terra úmida dos meus sucos,

que me cresce uma flor cresce rompendo-me o peito,

uma flor, e dizer: Esta flor,

para você.

Ilustração: Vou Tatuar. 

Thursday, May 22, 2025

ANA CANÃS

 


Ela canta como vive

sem nenhuma noção

do que a canção ou a vida

tem uma partitura.

Ninguém nem sonha

o que já passou esta criatura.  

Ela é uma artista,

não sei se uma atriz que canta

ou uma cantora que atua.

Há quem pense que não pensa.

Que seja apenas uma louca,

mas não dorme de touca

e seu olhar e beleza

é algo da natureza,

que todo exagero compensa.

Ela vive na sua:

com seus afetos e coração aberto

para quem estiver desperto

e, vez por outra,

faz qualquer música

parecer divina.

Qualquer hora se torna

uma dama ou uma diva,

mas, de oitiva,

parece que vai ser sempre menina-

travessa por sina!

Ilustração: Foto José de Holanda.

 


Um poema perdido de Julia de Burgos

 

POEMA PERDIDO EN POCOS VERSOS


Julia de Burgos

¡Y si dijeran que soy como devastado crepúsculo
donde ya las tristezas se durmieron!
Sencillo espejo donde recojo el mundo.
Donde enternezco soledades con mi mano feliz.

Han llegado mis puertos idos tras de los barcos
como queriendo huir de su nostalgia.
Han vuelto a mi destello las lunas apagadas
que dejé con mi nombre vociferando duelos
hasta que fueran mías todas las sombras mudas.

Han vuelto mis pupilas amarradas al sol de su amor alba.
¡Oh amor entretenido en astros y palomas,
cómo el rocío feliz cruzas mi alma!
¡Feliz! ¡Feliz! ¡Feliz!
Agigantada en cósmicas gravitaciones ágiles,
sin reflexión ni nada...

POEMA PERDIDO EM POUCOS VERSOS

E se disseram que sou como um devastado crepúsculo

onde as tristezas já dormiam!

Sensível espelho onde recolho o mundo.

Onde suavizo a solidão com minha mão feliz.

 

Hão chegado meus portos que foram atrás dos navios

como querendo fugir de sua nostalgia.

Voltaram para mim o clarão das luas apagadas

que deixei com meu nome vociferando duelos

até que fossem minhas todas as sombras mudas.

 

Minhas pupilas voltaram alunos amarradas ao sol do seu amor pelo amanhecer.

Oh! Amor entretido por estrelas e pombas,

Como o orvalho feliz cruzas minha alma!

Feliz! Feliz! Feliz!

Agigantado em gravitações cósmicas ágeis,

sem reflexão nem nada...

Ilustração: Choro das Rosas.

Uma poesia de Erik Campbell

 


NAVIGATING IN THE DARK

Erik Campbell

Papua, Indonesia

In this mining town in Papua the electricity
Has a habit of giving up at night, and this

Is a miracle of modern stasis, a secular Shabbat,
Reminding us of what is expendable, of how so few

Of us ever truly experience the dark. We are amazed,
My wife and I, with the heavy darkness

Of the no moon jungle, insect sounds lacerating
All illusions of silent places. “It’s so absolute,”

My wife says, and I like to think she means
More than the darkness; the naked places

Of ourselves we dress in sunlight, lamps,
And recorded music like antithetical

Blanche DeBois’s fearing a different sort
Of scrutiny. “We could pretend it’s 1940,”

I say, “put a Jack Benny tape on the short wave
And drink coffee, light candles.” She suggests

A walk outside instead, where there are dozens
Of others already out on paths bounded by jungle,

Stepping small and laughing loudly through various
Uncertainties; flashlights as eyes, ears like animals’.

Soon we are trying only to remember not to disappear
Altogether; everything is so absolutely, so darkly possible.

 

NAVEGANDO NO ESCURO

Papua, Indonésia

Nesta cidade mineira em Papua, a eletricidade

Tem o hábito de falhar à noite, e isto

 

É um milagre da estase moderna, um Shabat secular,

Lembrando-nos do que é dispensável, de como tão poucos

 

de nós verdadeiramente experimentamos a escuridão. Ficamos maravilhados,

Minha esposa e eu, com a escuridão pesada

 

Da selva sem lua, sons de insetos dilacerantes

Todas as ilusões de lugares silenciosos. "É tão absoluto",

 

Minha esposa diz, e eu gosto de pensar que ela quer dizer

Mais do que a escuridão; os lugares nus

 

De nós mesmos, nos vestimos de luz do sol, lâmpadas,

E música gravada como antitética

 

Blanche DeBois teme um tipo diferente

De escrutínio. "Poderíamos fingir que é 1940",

 

eu digo, "colocar uma fita do Jack Benny nas ondas curtas

E tomar café, acender velas." Ela sugere

 

Em vez disso, uma caminhada ao ar livre, onde há dezenas

De outros já em trilhas delimitadas pela selva,

 

Passando devagar e rindo alto em meio a várias

Incertezas; lanternas como olhos, ouvidos como animais.

 

Logo, estamos apenas experimentando nos lembrar de não desaparecer

De vez; todas as coisas são absolutamente, tão escuramente possíveis.

Ilustração: Informação a Bordo. Wordpress.com.